O último filme do Woody Allen que tinha visto antes deste Midnight in Paris tinha sido o You Will Meet a Tall Dark Stranger. Como podem ver pela SMR que lhe fiz, não gostei do que vi na altura e, por isso mesmo, acabei por não me interessar neste seu mais recente filme. Já estreou há uns tempos e eu ignorei-o, mas acontece que obteve tantos elogios que não pude continuar a fazê-lo.
E agora é a altura de fazer o mea culpa. Midnight in Paris é um excelente filme, trata Paris com a mesma paixão que o Woody Allen dedicou a Nova Iorque e, parece que funcionou bem, deixou-me com uma vontade imensa de voltar à cidade das luzes.
A história base não faz grande sentido: Gil (Owen Wilson, actor que normalmente detesto mas que aqui foi bem escolhido) está de férias em Paris com a noiva e a sua família. Gil é um argumentista de Hollywood que deseja passar para a mais nobre (?) arte de escrever romances e sofre da mesma condição que o protagonista do livro que está a tentar escrever. Essa condição, não médica mas muito frequente, é a nostalgia: Gil vê o passado como os anos dourados e sonha viver naquela que considera ser a época de ouro da cultura mundial, os anos 20 do século XX, uma época que teve o seu epicentro precisamente na cidade de Paris.
Inexplicavelmente, Gil é transportado todas as noites até à sua época de sonhos e começa a privar com todos os seus ídolos (T.S. Eliot, Hemingway, Dalí, Picasso, etc.) enquanto que de dia vive no Paris moderno. A cada noite que passa Gil tem as suas ideias mais claras: talvez Inez (Rachel McAdams) não seja a pessoa mais indicada para ele e, também talvez, a nostalgia seja parte da condição humana...as pessoas que conhece nos anos vim confessam a Gil que se aborrecem no "presente" e gostariam antes de viver na Belle Époque do final do século XIX.
Muitas têm sido as críticas que dizem que Midnight in Paris é, também ele, um olhar nostálgico ao tempo dos ídolos do realizador (que nasceu em 1935) mas eu tenho as minhas reticências. Na minha interpretação, Midnight in Paris não é só um Paris je t'aime (o argumento reitera o quão bonita é a cidade e as imagens confirmam-no constantemente) mas sobretudo uma mensagem positiva sobre o presente. Quando Gil conversa com Adriana (Marion Cotillard) quase no final, a conclusão a que ambos poderiam ter chegado era de que o nosso presente, por muito chato que nos pareça, será um dia a idade de ouro de uma geração futura. Não é por acaso que a moda é cíclica e que o 9gag está cheio de posts tipo "no meu tempo é que era bom".
Para além da má experiência com o You Will Meet a Tall Dark Stranger as viagens no tempo foram a razão que me deixou de pé atrás. A ideia de Woody Allen e viagens no tempo assustava-me um bocado, por muito que o Sleeper tenha mais ou menos a ver com isso e eu o tenha adorado. Em mãos menos competentes esta aposta poderia ter corrido mal, mas o Woody mostrou que já anda há muitos anos a virar frangos (adoro esta expressão!) e conseguiu tratá-la muito bem: a transição temporal porque Gil passa é totalmente irrelevante - ao ponto de não ser debatida - e isso permite que nos foquemos apenas nos personagens. É uma pequena suspension of disbelief mas vale muito a pena.
Com todo o seu charme, a cidade que o acolhe e com um conjunto de grandes interpretações (sobretudo de Corey Stoll como Hemingway e o regressado Adrien Brody como um Salvador Dalí obcecado com rinocerontes) Midnight in Paris fez-me ter prazer em dizer que estava errado - devia tê-lo visto antes - e abriu novamente a porta aos filmes do nova-iorquino mais famoso do cinema. Volta, Woody Allen, estás perdoado.