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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Death Row

Antes de mais um momento fan-boy. Quem diria que eu, pequeno e amador crítico de cinema, iria alguma vez estar presente na estreia mundial do mais recente filme do meu realizador favorito? E, ainda para mais, ter a oportunidade de falar com ele após a exibição? Adoro a Berlinale!
E agora passemos à SMR propriamente dita.

Death Row:


Antes de dizer seja o que for sobre o filme quero fazer um aviso à navegação: sou um veemente opositor da pena de morte e já tive contacto profissional com alguns casos deste tipo. Por esse motivo, é normal que a minha interpretação deste filme seja especialmente afectada pela minha experiência.
Não quer isto dizer, porém, que seja a favor dos criminosos. Como o realizador, Werner Herzog, diz a um dos seus entrevistados "o facto de ser contra a pena de morte não quer dizer que tenha de simpatizar consigo". Herzog é contra a pena de morte mas este não é um filme militante, optando antes por dar voz aos condenados e não às opiniões do cineasta.

Apresentado como um conjunto de 4 episódios completamente autónomos, Death Row aborda as histórias de 4 homens e uma mulher, tendo como característica em comum o facto de estarem no corredor da morte de um dos 34 estados dos EUA que ainda têm a pena capital como uma pena possivel para certos crimes. Três dos entrevistados confessam os seus crimes, dois lutam até hoje por ver provada a sua inocência, nenhum quer morrer às mãos do Estado.

Dos quatro episódios aquele que mais me tocou foi o de Hank Skinner, o homem que podem ver na foto acima e um dos dois que continuam a clamar a sua inocência. Este homem foi condenado à morte pelo homicídio da sua namorada e dos dois filhos desta, esteve a 20 minutos da hora da sua execução e conseguiu uma extensão dos seus recursos por lhe ter sido recusada a entrega de provas que poderiam estabelecer a sua inocência e qual é a sua atitude perante a vida? Diz apenas que ou passa a vida a chorar ou a rir e já chorou demais. A sua personalidade, a sua crença na inocência e numa eventual libertação, bem como a sua vitória perante o Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América lançarão, de certeza, muitos conflitos morais na mente dos espectadores pró-pena de morte.

Os restantes três episódios (James Barnes, George Rivas & Joseph Garcia e Linda Carty) apresentam histórias mais difíceis de abraçar: Barnes confessa os seus hediondos crimes, Rivas & Garcia pensam que a sua condenação é exagerada e Linda Carty clama inocência mas a sua história é mais macabra. Herzog consegue ainda assim mostrar um lado mais humano daquelas pessoas, dirigindo com mestria as perguntas (espontâneas) que foi fazendo naquelas conversas de 50 minutos que foi autorizado a ter com os cinco condenados.

Se há mérito neste filme é esse. O formato prejudica-o um pouco já que parece ser uma espécie de material-bónus para a edição em DVD do seu anterior filme sobre o tema, Into the Abyss (de 2011) mas ao colocar estas pessoas perante as câmaras, bem como aqueles que os acusam e os defendem, Herzog consegue manter-se numa linha da qual seria muito fácil resvalar. A opinião dos espectadores sobre o assunto não vai mudar depois de ver Death Row, mas todos nós ficaremos com uma melhor impressão do que passa pela cabeça de quem sabe a data em que vai morrer.

Ao longo do filme Herzog pergunta frequentemente com que sonham dos condenados e esses  sonhos passam-se, infalivelmente, fora das prisões que os detêm. Porquê?, acaba por perguntar a Joseph Garcia. A resposta é tocante de tão simples que é: sonham com o mundo lá fora porque acordados vivem um pesadelo constante, um pesadelo do qual não sairão vivos.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Cave of Forgotten Dreams

Cave of Forgotten Dreams:


Meninas e meninos, senhoras e senhores, a divisão de filmes do Canal História apresenta Cave of Forgotten Dreams, o primeiro filme em 3D de um dos últimos realizadores que provavelmente imaginariam a aderir à moda reacendida pelo Avatar.  Verdade seja dita que o uso do 3D é feito ao contrário do normal...
Isto porque este seu novo documentário se passa em grande parte em espaços apertadíssimos e o 3D serve apenas para nos mostrar texturas de paredes, nunca (ou quase) para espetar objectos ecrã fora. Os espaços fechados em questão pertencem à gruta de Chauvet, em França, e neste os meus leitores portugueses estarão a pensar "Grutas? Fogo, granda treta, já fui às grutas de Santo António quando era puto e aquilo até é fixe, mas não vale a pena pagar o bilhete do cinema para ir ver essa m*rda".

Acontece que as grutas de Chauvet não são umas grutas quaisquer. Não são as maiores, nem as mais bonitas, mas dentro delas encontram-se as pinturas rupestres mais antigas jamais encontradas, pinturas essas que se encontram extremamente bem cuidadas por causa de uma derrocada que tapou totalmente a sua entrada e a isolou do resto do mundo. E, lanço-vos a pergunta, quantos anos acham que as pinturas rupestres mais antigas têm? 10.000 anos? Nem pensar! Isso são as segundas mais antigas, estas têm mais do dobro...estima-se que cerca de 32.000 anos.

É verdade, há 32.000 anos atrás um dos nossos antepassados resolveu entrar naquela gruta e pintar umas coisinhas, crê-se que enquanto parte de um local de culto religioso...Jesus Cristo ainda estava longe por isso desenhou uma espécie de minotauros, bem como uma série de animais que na altura viviam por aqueles lados, animais tão estranhos para nós como os ursos das cavernas e Mastodontes mas que - provavelmente - eram tão normais como para nós são os ursos "normais" e os elefantes "normais".

Esta gruta foi descoberta apenas em 1994 quando, quase por acaso, um grupo de espeleologistas sentiu uma corrente de ar a sair da montanha. Conseguiram entrar, exploraram e quando sairam comunicaram a descoberta às autoridades, que rapidamente decidiram fechá-la permanentemente ao público. O que ali está dentro é demasiado importante para ser destruído pelo exalar de milhares de pessoas. É por isso que este documentário é importante, é provavelmente a única vez que irão ver estas imagens de uma forma tão detalhada, em grande escala e num dos melhores usos jamais dados às câmaras e aos óculos 3D.

Para além dessa utilidade didática confesso que não vos posso recomendar muito o filme (a menos que sejam fãs de espeleologia/arqueologia/(pré-)história de arte. Abstraindo-nos do tema, trata-se de um dos piores documentários deste que é um dos meus documentaristas favoritos e que faz lembrar alguns dos seus primeiros projectos: pega-se num tema relativamente limitado e explora-se durante demasiado tempo. Este é o caso, já que não seria muito difícil passa-lo para uma curta metragem, bastava para isso encurtar as entrevistas e, sobretudo, eliminar os monólogos esotéricos sobre coisas como "o que é que o urso das cavernas pensaria ao olhar para estas pinturas?".

Bastaria uma série de planos da gruta, outros das pinturas e uma ou outra entrevista (incluindo aos seus descobridores, vergonhosamente fora do filme), mas aí a coisa era capaz de se aproximar demais de um documentário a passar exclusivamente no canal História, sem óculos 3D. Era capaz de ter sido melhor opção.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Julianes Sturz in den Dschungel

Julianes Sturz in den Dschungel:



Juliane Koepcke tem uma história de vida que mais ninguém tem, e ninguém deseja ter. Existem no mundo uns quantos sobreviventes únicos de quedas de avião, como ela, mas não deve haver mais nenhum que depois da queda no meio da Amazónia passou 10 dias a caminhar sozinha pela selva até encontrar mais gente, isto porque as buscas foram canceladas por nem sequer conseguirem encontrar os destroços do avião no meio do mato.

A história de Juliane foi contada de uma forma dramatizada num filme série B dos anos 70 mas aqui é contada pela própria, que aos 29 anos voltou ao lugar do acidente e reviveu o que ali se passou. Quem lhe propôs esta viagem foi o Werner Herzog, que tinha bilhete para o mesmo avião e só não embarcou no fatídico voo por causa de um atraso numa ligação.

A 24 de Dezembro de 1971 Juliane embarcou em Lima e sentou-se no lugar 19F no voo com rumo a Pucallpa, de onde partiria para passar o Natal com a família na reserva biológica gerida pelos pais na floresta amazónica. Fora lá que Juliane viveu durante grande parte da sua vida e, quando o avião se despenhou, foi isso que a salvou.

Como é natural Juliane não se lembra de (quase) nada entre o raio que acertou num dos depósitos de combustível do avião e o fez cair a pique e o ter acordado no chão, ainda presa ao seu lugar com o cinto de segurança. Estava ferida mas conseguia andar, pelo que se levantou, procurou (em vão) outros sobreviventes (incluindo a mãe) e, quando percebeu que tinha de ser ela a salvar-se, seguiu os seus conhecimentos de sobrevivência na natureza e fez a coisa mais lógica mas que se calhar nenhum de nós faria: procurar um curso de água, por mais pequeno que fosse, e segui-lo até encontrar civilização.

Na minha opinião o aspecto visual este documentário podia ser melhor. É impressionante ver a vegetação amazónica mas verdade seja dita que grande parte do filme é passado a ver Juliane remexer nos destroços do avião (que entretanto foram encontrados mas que demoraram cerca de 3 meses a ser relocalizados pela equipa do Herzog) enquanto conta a sua história. Felizmente essa história é espantosa e os seus relatos estão cheios de informação que espero nunca ter de usar (Juliane não tinha medo das piranhas por saber que elas são inofensívas em águas corridas; os animais mais perigosos que encontrou naquela viagem eram as raias venenosas; um determinado tipo de pássaros (não me lembro como se chamam) significa que há um curso de água navegável por perto).

Foi sobretudo por esses pedaços de informação que mantive o interesse no filme, se tivesse de dar uma nota ao filme estaria perto do Satisfaz. É capaz de ter sido o documentário dele que menos me puxou mas apesar de tudo tem um tema interessante. Acho que não há nenhum filme do Herzog com um tema desinteressante.



P.S: Eu sei que o título em alemão torna o post menos apelativo, mas como gosto de usar o título original sempre que posso e acho que o inglês (Wings of Hope) é muito enganador lá terão de aprender a dizer Julianes Sturz in den Dschungel.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Gasherbrum - Der leuchtende Berg


(eu sei, é um "poster" estranhíssimo, mas tenham em conta que é uma produção para a TV alemã dos anos 80, assim tudo se torna mais claro)  

Era uma vez estes dois senhores, Reinhold Messner e Hans Kammerlander, dois alpinistas que em 1984 decidiram escalar os montes Gasherbrum I e Gasherbrum II (ambos com mais de 8.000m) de uma assentada só, sendo a primeira vez que tal foi feito. Era também uma vez um realizador que gosta de documentar histórias reais mas fora do normal, o Werner Herzog.

Da relação entre os dois alpinistas e o realizador alemão surgiu este filme, que em inglês se chama The Dark Glow of the Mountains, e que tendo por pano de fundo o alpinismo não é, conforme declara abertamente, um filme sobre alpinismo. O foco da história é na análise psicológica daqueles que sabem que estão a arriscar a vida ao subir a uma montanha apenas para dizer que já lá estiveram e é curioso que quando Messner e Kammerlander sobem aos cumes a câmara não os acompanha, prefere esperar cá em baixo para depois falar com eles.

Creio que foi o Sir Edmund Hillary (o primeiro homem a chegar ao cume do Everest) que, quando lhe perguntaram porque é que escalava montanhas, respondeu "Porque elas estão lá". Parece-me uma justificação tão boa como qualquer outra, mas não é partilhada pelos dois montanhistas deste documentário: Messner, muito mais falador e claramente o líder da expedição, fala antes em derradeiro teste de resistência e de um vício tão obsessivo e mórbido (palavras dele) como as drogas.

Messner viu o irmão morrer numa expedição aos montes Dolomitas, uns anos antes da realização deste documentário, e mesmo assim continuou a escalar. Tornou-se o primeiro homem a subir ao Evereste sem auxílio de oxigénio e foi o primeiro homem a subir a todos as 14 montanhas com mais de 8.000 metros de altitude (e subiu-as a todas sem oxigénio, como o nosso João Garcia) e depois deste filme já subiu mais montanhas do que eu vãos de escada. Na última entrevista que dá ao Herzog antes de começar a subida dos dois Gasherbrum esconde o (inevitável) nervosismo com um sorriso e friamente, como se fosse a coisa mais normal do mundo, diz-lhe "Se não estivermos de volta daqui a uma semana volta para trás, não vale a pena procurar ajuda porque ou morremos numa avalanche ou de hipotermia".

Este documentário foi a primeira vez que realmente me apercebi do constante perigo mortal desta actividade e, nem que fosse por isso, valeu a pena tê-lo visto. Recomendo-o a todos os leitores que, como eu, gostam de viajar ou gostavam de subir às árvores quando eram pequenos, só para ver o que estava "lá em cima".

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans

Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans:


Quem está atento a este blog e - ao mesmo tempo - esteve atento à programação do Indie Lisboa deve a dada altura ter feito esta pergunta: então o gajo lá daquele blog do cinema está sempre a dizer que adora o Werner Herzog e não me vai ver um dos dois filmes dele que passam no Indie? É verdade, não fui mas foi por um bom motivo: ver o FCP ganhar 5-2 ao Vitória de Setúbal.

Foi um leap of faith arriscado, na verdade, porque presumi que o filme fosse estrear comercialmente mas podia ter-me lixado à grande. Felizmente não me lixei. Vamos por isso à crítica do primeiro dos dois filmes do Werner Herzog que passou no Indie Lisboa 2010.

Antes de mais digo que gostei mais deste que do My Son, My Son, What Have Ye Done?. É uma história mais profunda, com lugar a mais sensações que a constante estranheza que se vai sentindo neste (mas, claro, não deixa de haver estranheza!). Aqui há espaço para relações familiares, relações amorosas e até (mais) humor, nem que seja por estarmos perante uma das melhores representações do que eu imagino deva ser estar-se high on crack. Digamos que, fazendo paralelos com o David Lynch, se o My Son... era um Lost Highway este é mais um Blue Velvet.

Falo em Lynch porque, apesar deste filme ser anterior à colaboração entre os dois realizadores mais marcantes da minha adolescência cinematográfica, já se notam aqui vários traços do senhor que nos trouxe o Twin Peaks. O primeiro deles é, claro, a surrealidade de algumas cenas (como é que é possível ver-se o acidente provocado pelo crocodilo sem se lembrar do Straight Story?), surgindo aqui maioritariamente através das visões do protagonista, Terrence McDonagh.

O protagonista é outro desses pontos de ligação, já que é interpretado por um actor de quem já falei recentemente, e que aqui consegue superar outra das suas grandes interpretações, no Wild at Heart, do Lynch. Falo do Nicolas Cage e não é difícil dizer-se que é ele que faz o filme. Qualquer outro actor (ou ele mesmo, num dia mau) poderia levar este personagem a excessos que fariam do filme uma parvoíce pegada, enquanto que aqui conseguiu um equilíbrio perfeito entre demência e humanidade.

A história não é original. Não só porque este é um remake de um filme de 1992 (que não vi, mas se tivesse visto diria - como tantos os outros críticos - que só mesmo o título é que é partilhado pelas duas obras), mas também porque estamos perante uma história bastante frequente: um polícia que era bom (or was he?) passa por uma tragédia, torna-se viciado para a superar, faz merda (muita merda!) para manter o vício, mas acaba por se safar através do amor e da sorte (ou será que aquilo era planeado?).

A diferença é que esta história aparentemente normal é realizada por um realizador extraordinário (e que, mais uma vez partilho a opinião com grande parte dos críticos, voltou a fazer ficção ao nível da sua obra dos anos 70/80) e com uma interpretação que também não é menos que extraordinária. Diz-se que o Nicolas Cage poderá ser o novo Klaus Kinsky (imagem estranha, no link) na carreira do Herzog e se assim for só vos digo uma coisa, queridos leitores, preparem-se para uma avalanche de filmes geniais!

Estes dois, juntos, podem ir muito longe.

domingo, 2 de maio de 2010

Indie Lisboa dia 10: 2 minuten stilte, a.u.b. + City of Life and Death + My Son, My Son, What Have Ye Done?

2 minuten stilte, a.u.b.:
Pode um bom final salvar um filme do naufrágio? Já tinha dito em relação ao Play the Game que não. Aqui a história repete-se.

Resolvi ir ver este documentário por dois motivos: pelo facto da realizadora - Heddy Honigman - ser um dos destaques da secção Herói Independente do festival, onde está a ser passada a sua retrospectiva quase integral, e pela temática ser relacionada com a 2ª Guerra Mundial, assunto pelo qual nutro grande interesse.

Mais especificamente, o tema do filme são os dois minutos de silêncio que toda a Holanda faz a cada dia 4 de Maio às 20h. O que a realizadora procurou explorar e o que a mim me interessava saber é o que se vai passando na cabeça das pessoas durante esses 2 minutos, quer seja um sobrevivente da guerra, quer seja alguém que vive com a vergonha de ser filha de pais colaboracionistas.

O grande problema do filme, na minha modestíssima opinião, é que é uma longa de 80 e tal minutos quando poderia (e deveria) ser uma curta de 15 ou 20.

Como já disse, o final é arrepiante, com a Holanda verdadeiramente em silêncio durante aqueles 2 minutos (filmados em tempo real), passando depois para uma poderosíssima interpretação do Requiem, de Mozart.

O mal está é no que vem antes, uma série de entrevistas demasiado longas e aborrecidas, onde a realizadora constantemente interrompe os entrevistados, mudando o rumo às conversas sem os deixar terminar o seu raciocínio.

Normalmente os Director's Cuts são mais longos que a versão original do filme, mas aqui impunha-se uma nova edição que o tornasse muito mais curto. Talvez assim não houvesse gente a sair a meio e outros a dormir quando finalmente chega o momento que realmente interessa.



City of Life and Death:


Em 1938 a Alemanha nazi já existia, mas ainda não tinha iniciado a sua política expansionista que viria a culminar no início da Segunda Guerra Mundial. Precisamente ao mesmo tempo, já o Japão Imperial tinha iniciado a sua política expansionista que só acabou com após o uso das bombas atómicas em Hiroshima e Nagasaki, bem depois da rendição da Alemanha Nazi, no final da Segunda Guerra Mundial.

Diz-se que o mundo é pequeno, mas aqui dou-vos dois exemplos do contrário.

Se o mundo fosse assim tão pequeno o mundo condenaria de forma mais intensa as verdadeiras selvajarias cometidas pelos japoneses, tanto em Nanjing (episódio que o filme retrata), como em qualquer outro território que ocuparam na altura. Selvajarias que não são menos hediondas que as cometidas pelos nazis, mas são menos conhecidas. Aliás, basta pegar numa imagem simbólica deste filme para defender o que estou a dizer: aqui, tal como nos factos reais em que o filme é baseado, o representante nazi na cidade é visto como um porto de abrigo e, a dada altura, não consegue conter as lágrimas pelas atrocidades que os japoneses vão cometendo.

Por outro lado, se o mundo fosse realmente pequeno, ou pelo menos o mundo cinéfilo fosse mais atento a filmes que vêm de outros lados que não Hollywood, esta verdadeira obra-prima realizada por Lu Chuan (que não conhecia mas que passei a ver como um realizador de topo) seria vista por muito mais gente e seria justamente considerada como um dos melhores filmes de guerra de sempre.

O que Lu Chuan aqui consegue é um filme numa escala monumental, onde ao longo das suas mais de duas horas nos faz um relato bastante completo de tudo o que por lá aconteceu. Para isso tanto nos apresenta batalhas ferozes como momentos íntimos de tragédia familiar, todos eles realizados com verdadeira mestria.

Excelente em todos estes aspectos e ajudado por uma fotografia a preto e branco que intensifica ainda mais o que vemos no ecrã, City of Life and Death conseguiu convencer-me que é o melhor filme que vi no Indie Lisboa 2010 e é um grande candidato ao melhor filme que vi em 2010.

É um filme obrigatório, que se estrear em sala deve ser visto no cinema, dada a grandeza de tudo o que acontece no ecrã.



My Son, My Son, What Have Ye Done?:


Já há quase um ano que andava a antecipar este filme. Mais precisamente, desde que li um mini-artigo na Empire sobre uma colaboração entre o Werner Herzog e o David Lynch. Ora, estes dois senhores são - apenas e só - dois dos meus três ou quatro realizadores favoritos. A expectativa era muita e apesar do filme ser bom, não conseguiu ser totalmente atingida.

Resumindo muito a coisa, a história do filme é inspirada num caso real de um habitante de San Diego que assassinou a mãe dada a sua depressão e a obsessão pelo mito de Orestes. Esta é a versão reduzida, mas em qualquer filme que tenha o David Lynch envolvido há muito mais para interpretar. Neste caso temos de ter em conta uma viagem ao Perú que mudou a vida do protagonista (iniciando a sua obsessão com um deus que vive numa lata de papas de aveia!...don't ask), um tio que cria galinhas gigantes e - presença quase obrigatória num filme destes dois loucos realizadores (no bom sentido) - um anão.

Costumo dizer que enquanto o David Lynch aborda mais o sobrenatural (não extra-terrestres, mas realidades paralelas e coisas assim) o Werner Herzog prefere histórias surreais de pessoas reais. Aqui, a história central é um bom misto dos interesses de ambos os realizadores, mas no geral os traços do filme são muito mais de Lynch que de Herzog; aliás, se não soubesse diria que tinha sido o primeiro a realizar e o segundo a produzir e não o contrário.

As expectativas eram realmente altíssimas e por isso praticamente impossíveis de atingir, mas o facto de eu não ter ficado 100% satisfeito não quer dizer que não recomende o filme. É uma história estranha, como não poderia deixar de ser, mas suportada por excelentes interpretações (sobretudo o protagonista, Michael Shannon, que já tinha sido o ponto alto do Revolutionary Road, e a sua mãe, Grace Zabriskie, que permanece tão assustadora como no seu papel em Inland Empire) e tem um bom equilíbrio entre realidade e surrealidade.

É que, como eu interpretei uma das últimas cenas, o que para uns é insanidade, para outros é arte.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Indie mega-post

Com que então os meus amiguinhos pensavam que nunca mais tinha visto filmes..Nem por isso, vi muitos, no Indie Lisboa.



E sabem que mais, foram todos à borla. Venham daí essas SMR's!

Águas mil
:



Um filme sobre a necessidade da minha geração perceber o que se passou no pós-25 de Abril. Peca por ser um bocado "português" demais, é demasiado teatral, pouco emotivo e com um ritmo bastante lento, mas apesar de tudo saí da sala um do São Jorge (só a melhor sala de cinema em Lisboa, e provavelmente em todó Portugal) bem contentinho com o que vi.

A nossa necessidade de consolo:



Esta curta metragem foi realizada por dois amigos da minha amiga Daniela e basicamente ela obrigou-me a ir ver. Gostei do que vi, gostei especialmente da fotografia, mas achei-o demasiado parado para o meu gosto.

Arena:



Melhor curta portuguesa. Uma história engraçada sobre a relação (não muito cordial) entre um gajo do ghetto que está em prisão domiciliária e outro gajo (do ghetto, pois claro) que decide roubar-lhe o dinheiro e acaba na mala de um BMW.

Ballast:



Foi o grande vencedor do festival e só o fui ver na sessão de “consagração”. É uma história complicada contada de uma forma simples e hiper-realista, o que na minha opinião prejudica bastante o filme. Não desgostei do que vi, mas podia ser bastante melhor, podiam pô-los a falar um bocadinho mais.

DIX:



Quando era puto (e quase todos vocês também faziam isso, aposto) curtia bué andar na rua “só pelas pedras pretas” ou “só pelas pedras brancas”. Esta curta é sobre um adulto que tem uma paranoia tipo essa, não consegue pisar os espaços entre as pedras da calçada porque acredita que elas se vão mexer e cortá-lo em bocados. Tem altos efeitos especiais e tem a duração certa, enquanto longa seria demasiado estranho.

Herakles:



Uma curta de 1961 que mistura imagens de culturistas com imagens de Guerra. Pormenor que muda tudo: é o primeiro filme do Werner Herzog. Não me mudou a vida mas gostei de ver, pelo interesse histórico.

JCVD:



As iniciais do famoso actor (sim, o Jean Claude Van Damme) era algo que jamais pensei ver no Indie, mas este filme não é um filme do Van Damme, é um filme sobre ele. E até tem uma premissa engraçada, o senhor faz dele próprio durante um assalto a um banco, e por isso vemos um gajo já a dar para o velhote, com medo dos assaltantes e a imaginar como poderia resolver as cenas à pancada, como nos filmes. Nunca pensei ver isto: o van Damme chora! E também curti as cenas com o "povão".

L'argent du charbon:



Vi este no Museu do Oriente e acho que estou a criar anticorpos…mais um documentário chinês extremamente aborrecido. É que nem o tema - o negócio do carvão na fronteira entre a China e a Mongólia - é especialmente interessante!

L'exil et le royaume:



Mau mau mau mau mau mau mau mau mau mau mau mau mau mau. Chato chato chato chato chato chato chato chato chato chato chato. Está tudo dito!

Last Words:



Herzog! Uma história simples contada sob vários pontos de vista. E é esta a minha última palavra ;)

Medicine for Melancholy:



Este foi o filme que mais gostei de ver durante todo o festival, uma história à “Depois do Amanhecer” em que um casal que teve um one night stand decide passar o dia junto, para se irem conhecendo melhor. A juntar às excelentes interpretações uma optima banda sonora, uma fotografia bastante original e a cidade: San Francisco.

Muitos dias tem o mês:



Um documentário sobre o sobre-endividamento na sociedade portuguesa. Parece animador, não? Consegue ser mas só porque ficamos a pensar “não estou assim tão mal”, mais nada. Não recomendo que o vejam antes de uma ida às compras, noutras ocasiões sim…é um abrir de olhos para a realidade de muitos portugueses.

Nuit de Chine:



Mais um documentário chinês, mais um documentário aborrecido, outra vez no Museu do Oriente. Mas pronto, ao menos conheci a história de uma senhora que vive num apartamento com 140 gatos (e sim, escrevi cento e quarenta, não me enganei). Era a mais interessante das 6 ou 7 que mostram.

Precautions Against Fanatics:



Outro filme do Herzog que vi neste festival e o que mais gostei (dos dele). É uma curta verdadeiramente hilariante sobre um grupo de pessoas demasiado preocupadas em proteger cavalos de corrida (e, eventualmente, flamingos) dos “fanáticos”. Não explicam quem são os fanáticos nem porque é que o fazem, apenas olham para a câmara e explicam as suas funções, entre as quais se incluem "andar com o cavalo à volta da árvore" ou "garantir que os fanáticos não saltam a rede". Herzogianamente bom!

Ricky:



O François Ozon é um bom realizador, gostei muito de outros dois filmes dele (Swimming Pool e 8 mulheres), mas este não me convenceu. A história é tipo “realismo mágico”, com um casal de classe media baixa a dar à luz um bebé com asas de anjinho que mais parecem asas de frango…o conceito poderia ser interessante, mas torna-se tão realista que não pode ser mágico e tão mágico que não pode ser realista. Ponto alto: o bebé a voar contra as paredes com um capacete de mota, muito me ri eu.

Signalis
:



Uma curta de animação muito divertida sobre uma toupeira que vive dentro de um semáforo e tem de ir carregando num interruptor para mudar a côr do sinal. Um dia fica sem papel higiénico, atrasa-se, há um acidente e acaba o filme. Muito bom!

Signs of Life:



A melhor descrição para este filme do Herzog (quem mais!) é que é um filme aborrecido sobre estar aborrecido. E nesse sentido é excelente. Na altura não gostei muito, mas como disse a minha companhia, com o passar do tempo “it grows on you”.

Singularidades de uma rapariga loura:



O novo filme do Manoel de Oliveira. À partida o nome deste realizador – o mais velho realizador vivo – é suficiente para assustar (detestei o ultimo filme dele que tinha visto, o Porto da minha infância) mas este até é tolerável. O texto é do Eça de Queiróz (o que ajuda MUITO) e é passado para um contexto actual sem grande preocupação de adaptação…fica estranho mas vê-se bem. E não posso deixar de dizer que o Manoel de Oliveira é o maior...o gajo tem 100 anos e desceu as escadas do São Jorge aos saltinhos!

Styri:



Esta curta não me agradou lá muito, mas acho que o Vasco Granja (RIP) iria gostar, já que é da Eslováquia. A animação (sim, é de animação - daí o Vasco Granja) é bastante simples (propositadamente, e não deixa de ser bonita, admito), e a história não é muito desenvolvida.

The Ballad of Marie Nord and Her Clients:



Se fosse só pelo tema este era o filme que mais tinha a ver comigo: é a história de uma assistente social que trabalha com imigrantes…e é amiga de imigrantes…e tem sexo com (pelo menos) um imigrante…e esse imigrante tem 14 anos…ok, se calhar o filme não tem assim tanto a ver comigo. Mas é bom e isso é que conta. A actriz principal é excelente.

The Girl With Yellow Stockings:



Adorei esta curta. A história é engraçada (vemos um casal de namorados sempre na cama, ele pede-a em casamento e ela não aceita, várias vezes) mas a relação entre os actores (que não sei se não serão namorados na vida real) era tão natural que nos sentiamos como amigos intimos deles. Simples, eficaz, simpático.

The Happiest Girl in the World:



Vencedor do Segundo prémio mais importante do Indie…é bom? Nem por isso! Não é péssimo, mas confesso que consigo imaginar melhores coisas que fazer com 100 minutos que ver uma miuda fazer um sem fim de takes do mesmo anúncio publicitário. É claro que há mais coisas no filme, mas não são assim tão relevantes.

The Unprecedented Defence of the Fortress Deutschkreuz:


Mais um filme do Herzog, mais uma história à Herzog: um grupo de rapazitos de mentalidade alternativa, digamos, resolvem ocupar e defender um antigo palácio (abandonado) de um inimigo que nunca chega (será porque não estavam em guerra? Não sei...).

Visionary Iraq:




Outra curta metragem, vencedora do Prémio Revelação do festival. Eu cá fiquei sem saber o que achar…é tão marada que não sei curti ou achei parvo demais: imaginem dois gajos a fazerem oito personagens (incluindo uma miuda angolana, chamada Ginja!), sendo que os principais são dois irmãos adoptivos/amantes que vão para o Iraque fazer de escudos humanos e por lá descobrem que o pai de ambos ganha dinheiro com a guerra. Acho que me decidi, gostei do filme.




Conclusão: Eu avisei que era um mega-post. Vi tanto filme (em 11 dias) que esta semana estou de férias, não há cá filmes para o menino.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Encounters at the End of the World

Enconters at the End of the World:



Nunca soube bem porquê, mas a pergunta "o que queres fazer quando fores grande?" sempre me fez pensar em duas respostas bem divergentes, ou juíz ou biólogo. A realidade é mais próxima da primeira opção.

Mas quando vi este filme fiquei com um grande amargo de boca por não ter optado pela primeira. O fim do mundo deste filme é a Antártida, o último continente e a derradeira fronteira do nosso planeta. Ao ver imagens daqueles cientistas a mergulhar por debaixo dos icebergs só pensava "porque é que estou num escritório em vez de estar na Antártida?".

O que se estuda aqui, porém, não são os animais que por lá vivem, nem os seus vulcões, embora ambos sejam tema indirecto. O verdadeiro centro deste projecto também não é o Pólo Sul...são as pessoas, os exploradores, os cientistas ou mesmo os filósofos que fazem a sua vida neste continente sem países...a conduzir camiões e retroescavadoras!

Como é seu apanágio, Werner Herzog não se fica pelo expectável, pelo normal (vejam este vídeo dele a ser entrevistado e vejam bem a natureza do homem). Explora um tema mundano num ambiente extremo, e os resultados são muitissimo interessantes (destaque para a entrevista ao investigador de pinguins e as imagens subsequentes), só ele para tornar assuntos como a falta de gelado na "capital" da Antártida ou testes de sobrevivência no gelo interessantes e engraçados.

Mas quem gosta de documentários da National Geographic também ficará contente...os entrevistados falam das suas paixões e os seus depoimentos são ilustrados com imagens belíssimas...imagens e sons: quem vê o filme não pode deixar de ficar maravilhado com o chamamento das focas de Weddell.

Gosto MUITO do Werner Herzog, e este filme (tal como o Grizzly Man, também dele) deixa-me na dúvida...será que gosto mais do Herzog realizador de ficção ou do Herzog documentarista? Por agora está mais ou menos equilibrado...deixarei que ele me vá apresentando argumentos.

E antes que digam "Ah, é hora de expediente e este gajo está a fazer updates ao blog" eu respondo...é Carnaval, e ninguém (nem a chefe) leva a mal. Não, na verdade já o tinha escrito (vi o filme a semana passada), ainda não tinha era arranjado a imagem.