sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

The King's Speech

The King’s Speech:


A partir do momento em que deixa de ver exclusivamente cinema de animação todo e qualquer espectador de cinema frequentemente assiste a um tipo de história que ultrapassa as barreiras de género (cinemático), tempo ou nacionalidade. Falo, claro da história (normalmente baseada em eventos reais) da criança/jovem/adulto com um problema qualquer (que não interessa agora para esta análise) e que com muita perseverança (e depois de desistir pelo menos uma vez) consegue superar-se a si mesmo e suplantar até as mais optimistas expectativas. É este o caso do mais recente filme a abordar a família real britânica: The King’s Speech.

Vamos analisar isto por tópicos? Vamos!

A pessoa: Rei Jorge VI (pai da actual Rainha Isabel II), também conhecido por Príncipe Alberto, Duque de York.

O problema: O senhor é g-g-g-ga-gago desde criança, uma situação nada simpática para alguém que, como qualquer outro na posição dele, tem o falar em público como uma das suas funções profissionais. A coisa agrava-se ainda mais a partir do momento em que ele se torna a voz que a Inglaterra precisa de ouvir para se unir durante a 2ª Guerra Mundial.

A preserverança: depois de anos e anos de tentativas frustradas e de muita humilhação provocada pelas insistências do pai (o Rei Jorge V) e gozo de todos os irmãos, Jorge aproveita segue o ímpeto da mulher (a popular Rainha Mãe) e transforma um momento extremamente embaraçoso (o seu discurso falhado na cerimónia de encerramento da Exposição do Império Britânico) na base para uma busca de novos terapeutas da fala. Nada funciona até encontrar Lionel Logue, um australiano com métodos sui generis (sobretudo quando o paciente é o Rei) que praticamente resolve o seu problema, tornando-se no seu único verdadeiro amigo pelo caminho.

O resultado: o nosso Jorge VI lá consegue fazer um discurso de 9 minutos em que explica aos seus povos que estão em guerra com a Alemanha e que os tempos futuros serão difíceis. Isto tudo sem se engasgar.

Como é fácil perceber, este tipo de filmes precisa de uma de duas coisas: ou um problema grave (gaguejar deve ser terrível mas não é daquelas desgraças universais com que todos se identificam) ou uma suplantação realmente espetacular, tipo criança perneta que se torna jogador de futebol (não me lembro de nenhum filme com esta temática, mas já deve existir)...sendo também aqui este filme peca por defeito...ficamos contentes que ele faça o seu discurso sem gaguejar, sobretudo pela importância histórica que este teve, mas ficamos ainda mais contentes quando vemos o tal perneta a marcar o golo decisivo na final do Mundial. Ou seja, apesar do pano de fundo ser muito do agrado das bilheteiras – a malta gosta sempre de cuscar a família real – não é pela história que o filme lá vai.

O que realmente faz com que este filme sobressaia é o altíssimo nível das duas interpretações masculinas principais. Que o Colin Firth é simplesmente genial (ainda mais do que costuma ser?) ao evitar que a gaguez de Jorge VI seja dramática sem que seja exagerada ao ponto do ridículo já se sabia, tanto que não há dúvidas que finalmente vai ganhar o seu merecido Óscar; a maior surpresa – que também não é assim tão surpreendente – é a interpretação de Geoffrey Rush enquanto Lionel Logue, que trás níveis de empatia tão grandes que é difícil não acreditar que a pessoa real fosse assim mesmo, a única forma de ganhar a confiança de um Rei.

Para além destas duas interpretações, e da excelente relação que transparece entre ambos os actores, não há muito mais a realçar de um filme que aposta pouco na originalidade. Vale por eles e pelos curiosos ângulos escolhidos em algumas cenas pelo realizador Tom Hooper.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

True Grit

True Grit:



Os Westerns são provavelmente o género de filmes que viu um maior decréscimo nos últimos 50 anos: pode dizer-se que eram um dos mais populares nos “loucos anos sixtes” e desde então entraram numa espiral descendente sendo que agora só se vê um a cada dois ou três anos.

O Western de 2010 (que só chegou a Portugal em 2011) é um remake de um Western de 1969 que não sendo um dos grandes clássicos do género é conhecido como sendo o único que deu um Óscar ao John Wayne, rei do género. Normalmente os remakes são algo de muito duvidoso, mas neste caso há que ter em conta um dado muito importante: quem está ao leme desta produção são nada mais nada menos que os irmãos Coen, dupla de realizadores já vencedores de Óscar pelo No Country for Old Men.

Antes que perguntem respondo já que não vi o filme original nem li o livro em que ambos se baseiam, por isso não posso fazer comparações e como tal vou analisar o filme por si mesmo.

True Grit é acima de tudo a história de Mattie Ross (Hailee Steinfeld, que faz aqui o seu primeiro filme e que no próximo Domingo deveria sair do Kodak Theatre com uma estátua na mão). Esta miúda de 14 anos perdeu o seu pai, morto por um dos seus empregados, e – como era de bom tom no velho Oeste – quer que o assassino pague com a vida. Para isso contrata um U.S. Marshall, Rooster Cogburn (Jeff Bridges), apenas e só porque lhe foi descrito como sendo o mais duro daquela região.

Juntos vão em perseguição do assassino para territórios índios, juntando-se a eles LaBoeuf (Matt Damon) um Ranger do Texas (como o Walker) que também persegue Tom Chaney, o tal empregado assassino, e juntos passam por diversos elementos típicos deste tipo de filmes: noites passadas ao relento junto à lareira, animais perigosos, tiroteios brutais e dentes que precisavam de umas boas horas no dentista. O único elemento que sobressai é mesmo Mattie, aparentemente uma rapariga indefesa mas cujo comportamento é o de um adulto implacável (aquela negociação inicial dá bem o mote para o que vem mais à frente).

Outra coisa que distingue este filme (para melhor) é a grande qualidade das interpretações. Já falei aqui da estreante Hailee Steinfeld mas para além dela também merecem destaque o sempre grande Jeff Bridges (que só vai ficar atrás do Colin Firth, digo eu), o Matt Damon (num excelente papel) e o Barry Pepper, actor pouco conhecido mas que aqui se excede. O único que não gostei assim tanto foi o Josh Brolin, que dá ao seu Tom Chaney um ar demasiado tótó.

Um elemento também ele essencial nos Westerns é – sempre foi – o cenário e neste aspecto esta versão de True Grit não desilude...as paisagens dividem-se entre lunares e de grande beleza e todo o detalhe de época está bastante bem recriado.

Eu gosto deste tipo de filmes, têm sempre um grande sentido de aventura e aqui não há excepção (se bem que podiam ter dedicado menos tempo à introdução e um pouquinho mais à acção). Nos dias que correm se querem sentir o que era viver naquela época, com aquelas regras (olho por olho, dente por dente) e com aquelas dificuldades, esta é das melhores opções. Melhor que isto só mesmo serem vocês próprios a explorar este mundo no Red Dead Redemption (um dos melhores jogos de sempre)...talvez aí possam ter uma aventura maior que a de Mattie.



P.S.: Presumo que não viesse a acontecer convosco, mas fica o aviso: ao contrário do que aparentemente os pais das 3 crianças (todas com cerca de 5 anos) acharam, este filme não é para miúdos, a menos que os queiram deixar traumatizados, claro.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Biutiful

Biutiful:


Ao contrário do que se costuma passar em Hollywood, onde existe muito a tendência de se favorecer a forma sobre o conteúdo (style over substance), o cinema das restantes zonas do globo costuma ser precisamente o oposto, talvez por saber que não conseguem competir a nível de pirotecnia.

Biutiful é um filme de uma das “restantes zonas do globo” (está nomeado para o Óscar de melhor filme estrangeiro pelo México e passa-se inteiramente em Barcelona) mas num certo sentido tem muito de hollywoodesco: é muito mais forma que conteúdo.

Uxbal é o homem que vamos seguir ao longo da história (e o actor que o interpreta, Javier Bardem, vai bem mas já fez melhor). Com ele vêm duas características, uma que me parece praticamente irrelevante e outra que é fulcral. A irrelevante prende-se com uma capacidade que Uxbal tem de falar com os mortos, capacidade que ele explorar para receber algum dinheiro extra e que o realizador explora para nos meter alguns mortos em sítios estranhos. Para além disso, não adianta muito mais à história.

A segunda característica é que Uxbal está doente. A vida já não lhe é propriamente fácil (tem uma ex-mulher/actual pseudo-namorada – Maricel Álvarez - com problemas psicológicos e dois filhos, de ambos, para cuidar) e agora ainda tem de lidar com um cancro. Esta informação é importante porque vai servir de base a todas as movimentações do filme: Uxbal sabe que vai morrer mas – já que tem a tal capacidade que referi antes – sabe que precisa de partir em paz com todos para que possa, espiritualmente, partir.

O facto de este filme lidar com a necessidade de “partir em paz” poderia indiciar algo muito branco e limpinho, e a capacidade do seu protagonista comunicar com espíritos poderia levar-vos a pensar que estavamos perante um novo The Sixth Sense. Nada mais errado, Biutiful é um filme sujo e feio, onde a única beleza provém dos filhos de Uxbal e da neve que estes tanto desejam ir visitar. Tudo o resto é miséria.

Miséria daqueles que não têm dinheiro para alimentar condignamente os filhos, miséria daqueles que vêm de África ou da China em busca de dinheiro e que acabam bem pior do que estavam, miséria que advém de se ter uma doença a qual nos corrói todos os dias um pouco mais, miséria de uma Barcelona que é muito menos Todo sobre mi madre do que é Chungking Express.

Cito esse último filme porque o estilo de Alejandro Gonzáles Iñarritu de certa forma se assemelha à obra-prima de Wong Kar-Wai...o estilo como a cidade nos é apresentada mostranos que a cidade serve apenas e só como fundo – um fundo urbano e degradado – a uma história pessoal. Quem já viu o Alice, obra máxima do cinema português, também poderá encontrar, tal como eu, algumas semelhanças. São aliás filmes parecidos (um homem tenta salvar-se, quase tudo o resto é pano de fundo), só que um é bem melhor que o outro e no final é o outro que tem distribuição mundial e é nomeado para Óscares.

Desde que vi o filme (já há algum tempo...ando atrasado, eu sei!) várias pessoas me perguntaram se gostei ou não do filme. A todas tenho dito que nem por isso, dos 4 filmes do realizador este foi o que gostei menos. Voltando ao parágrafo inicial: esta é uma história complexa mas que, por Uxbal ser pouco expressivo ao ponto de nos alienar (como podem ver no poster ali de cima) e se dar demasiada atenção ao que deveria ser acessório acaba por se focar demasiado na forma em detrimento de uma substância que poderia ser interessante mas é desperdiçada.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Swans

Olá olá, amiguinhos.

Pois é, hoje venho dar-vos notícia da primeira grande internacionalização deste blog. É verdade! Pela primeira vez estive presente na Berlinale – Festival Internacional de Cinema de Berlim, aquele que está no terceiro lugar da minha lista de festivais de cinema mais importantes do mundo. Ficam a faltar-me Sundance e Cannes.



Infelizmente não posso estar em Berlim a duração do festival todo e mesmo neste fim de semana que lá estive só consegui ver um filme (aquilo esgota mais depressa que garrafas de água no deserto). Ainda assim, tenho o orgulho de vos apresentar a primeira SMR que é ao mesmo tempo provavelmente a primeira crítica publicada sobre o filme analisado. Ou então não é, mas se não for é só mesmo porque sou preguiçoso e tendo visto a ante-estreia mundial no Sábado só hoje é que o estou a analisar.


Leitores, apresento-vos o filme.


Swans:



Uma co-produção luso-germânica não podia ser mais apropriada para a ocasião e foi por isso mesmo que a fui ver. Este é a segundo longa-metragem do realizador português Hugo Vieira da Silva (realizador de Body Rice, que tenho na minha pilha de DVD ainda por ver) e tem muito mais de alemão que de português.

A história é uma de (des)encontros: Manuel e o seu pai, residentes em Portugal, chegam-se a Berlim para visitar a mãe do jovem, que se encontra em coma em consequência de uma quimioterapia altamente agressiva. Manuel nunca tinha antes conhecido a sua mãe e, por isso mesmo, mantém-se distante de toda aquela situação. Mantém-se também distante do pai, com quem – presume-se – tem mais contacto, mas com quem não tem propriamente mais afectividade.

O quotidiano berlinense de ambos passa pelo hospital e por se encontrarem a si mesmos. O coma da mãe serve de catalisador para que ambos se apercebam do seu lugar naquela família.

A Berlim que se vê no filme é tão ou mais distante do que Manuel; vi o filme com berlinenses que me disseram que tirando o aeroporto da cena inicial não reconheceram nada da sua cidade. O filme é propositadamente assim, julgo eu, mantendo-se tão afastado do seu público como afastados estão os seus personagens.

E é aqui que devo fazer uma ressalva: por uma razão qualquer que ainda não consegui racionalizar, gostei deste filme. Gostei dos silêncios prolongados e percebi a intenção do realizador ao forçar um ambiente frio, distante e desconfortável...se é assim que os personagens se sentem é assim que nós enquanto espectadores nos devemos sentir.

Mas por outro lado é com isto mesmo que não consigo concordar. Quis colocar esta questão durante o Q&A que se seguiu à projecção mas achei que não devia estar a ser tão “chatinho” em público, mas fica a pergunta para o Hugo, caso me venha a ler daqui a uns tempos (e para quem me quiser responder, claro, quero lançar o debate): o filme foi feito para o realizador ou para o público? É que este é um fenómeno recorrente no cinema português e confesso que me chateia um pouco. Não sou defensor de filmes popularuchos só porque sim, há espaço para tudo...mas o cinema português parece teimar em não ser acessível. Não estará na altura de mudar esse paradigma? Alterar as metodologias na “escola do cinema português”? Penso que as muitas pessoas que saíram da sala a meio da sessão concordariam comigo.

Eu, que não sendo de todo perito (sou só um gajo que diz para aqui uns disparates) já tenho alguma experiência em ver e analisar filmes, consegui responder às minhas próprias perguntas iniciais: porque é que isto é português? Será que se em vez de ser o Ministério da Cultura e o ICA a financiar isto as origens dos personagens seriam de outro país, provavelmente o país financiador? É que é complicado perceber, por exemplo, que não haja um único actor nacional a fazer quanto mais não fosse de Manuel: o jovem que vive em Portugal desde os 3 anos e que não deveria - como faz - falar única e exclusivamente em Alemão super fluente com o pai, também residente em Portugal desde essa altura.

Apercebi-me da resposta a essas perguntas ao pensar: este é um filme português em que o único interveniente nacional é o realizador (e talvez algum guionista ou director de fotografia, não sei, confesso que não prestei muita atenção aos créditos finais) mas que é – por isso mesmo – um resultado puro e duro da escola portuguesa de cinema: um filme desesperantemente lento em que tinha necessariamente de haver uma cena ofensiva...neste caso (e lá vem o aviso de spoiler para aqueles mais sensíveis) o nosso Manelito que decide apalpar as mamas e fazer outras coisas ainda mais erradas, à falta de melhor expressão, à sua mãe comatosa.

Repito, para que não julguem que se enganaram a ler: eu apesar de tudo gostei do filme. Mas acho que é altura de se dar um salto em frente e mostrar que o cinema português pode ser acessível ao mundo. São obras como esta e atitudes censuráveis como a do realizador, que se recusou a dar algum tipo de resposta a um espectador que lhe perguntou se a sensação de incompleitude que o filme provoca era propositada, que fazem com que os nossos realizadores, com a notável excepção do Manoel de Oliveira - actualmente mais reconhecido pela sua idade que pela sua qualidade enquanto realizador – continuem a não sair de um nicho que ou muito me engano ou é composto maioritariamente por eles mesmos.

A arte deve ser vista como uma interpretação da realidade e uma coisa vos garanto: Portugal e os portugueses não têm nada a ver com o que se vê na maioria do nosso cinema, somos mais espontâneos, sorridentes e afectivos. Custará assim tanto mostrar como realmente somos? O Portugal cinemático não é uma interpretação da realidade, é uma abstracção

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Black Swan

Black Swan:



Pode dizer-se que este é um filme a preto e branco? Sim, mas se calhar seria mais acertado dizer-se que as duas cores do mais recente filme de Darren Aronofsky são o cor de rosa e o preto.

Isto porque , pegando no facto de no ballet O Lago dos Cisnes ser a mesma dançarina a representar ambos os cisnes: branco e negro, Aronovsky conta-nos a história de Nina, bailarina perfeccionista que corporiza o cisne branco de uma forma ideal mas que de acordo com Thomas (Vincent Kassel), o seu encenador, precisa de se soltar para conseguir dançar a outra metade do bailado. De menina (ultra) protegida pela mamã, com quem ainda vive num quarto que seria mais adequado a uma miúda de nove anos, cheio de peluches e muito – muito – cor de rosa.

Penso que qualquer pessoa que já viu o filme terá de concordar com Thomas e com Lily, a antagonista do filme sobre quem já vou falar mais aprofundadamente...Nina precisa mesmo de relaxar. A interpretação actriz (e ex-bailarina) Natalie Portman para além de lhe ir dar o Óscar (cheira-me) consegue mesmo pôr-nos do lado daqueles que à partida lhe estão a fazer mal, abusando (psicologicamente) dela ou tentando roubar-lhe o papel.

Nina sabe que precisa mesmo de relaxar e para isso terá de se ver livre da influência da mãe (Barbara Hershey, num papel de que quase ninguém fala mas que a meu ver é tão importante para o filme como os três de que já falei), uma ex-bailarina que abdicou de tudo para cuidar da filha, acabando antes por a abafar. A cena em que Nina tenta relaxar masturbando-se (“trabalho de casa” passado por Thomas) é claríssima quanto a isso: Nina fá-lo ao acordar e quando está a meio da coisa apercebe-se que a mãe está no quarto ... adormeceu no sofá a olhar por/para ela.

A viagem de Nina não é geográfica, todo o filme está localizado em Nova Iorque. A viagem dela é pessoal, uma luta contra a sua própria rigidez (decerto formada pelo perfeccionismo da tal mãe dos infernos) e contra os seus demónios. A mãe é um deles, como já disse...o outro é Lily, interpretada por uma Mila Kunis propositada e extremamente sexy.

Lily é tudo o que Nina não é: espontânea, sensual, lânguida e basicamente o cisne negro ideal. O problema é que tal como no bailado, os dois cisnes terão forçosamente de ser a mesma pessoa...Nina quer mudar e – típico do diabo – será a própria Lily a ajudá-la nesse caminho, numa ida a uma discoteca que contrasta com o restante filme. Depois dessa cena a transformação de Nina chega ao que eu diria que é o ponto sem retorno...o cisne negro está a tomar conta dela e, mais uma vez como no bailado (spoiler se não o viram) as consequências são muito graves.

A dada altura confesso que já não sabia se Lily existiria ou se seria apenas uma projecção da mente de Nina. Isto porque ao longo de todo o filme são mostradas várias alucinações e muito do que vemos não é realmente o mundo real, mas sim a projecção mental feita pela protagonista. Agora já sei a resposta (não a vou dizer, para não me acusarem de ser chato) e apenas adianto uma coisa: as cenas finais fazem lembrar o final do segundo filme do Aronofsky, Requiem for a Dream, com toda a sua confusão e o tripitico churcilliano: sangue suor e lágrimas.

Nina acaba a fazer o que mais gosta, dançar. Mas tal como para Randy the Ram em The Wrestler (o anterior filme do realizador, com algumas parecenças em termos de história e estilo) e Beth MacIntyre (Winona Ryder, uma decisão de casting perfeita), a bailarina que antecedeu Nina nas peças de Thomas, não é garantido que o final seja feliz.




P.S.: Não tendo muito a ver com o estilo realista do filme, algum o trabalho gráfico em promoção do filme é excelente e merece ser elogiado. Vejam o poster acima, que não é o oficial mas é oficial, como um bom exemplo.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Vincent will Meer

Vincent will Meer:



Quando na última SMR falei nas pessoas que sofrem de síndrome de Tourette fi-lo propositadamente, como ligação a este filme, o primeiro (e infelizmente único) que vi este ano na Kino – Mostra de Cinema de Expressão Alemã. Um festival e um cinema que, deve dizer-se, mereciam mais destaque em Portugal.

Vincent é o jovem protagonista desta história e “will Meer” não quer dizer “quer mais” mas sim “quer o mar”, ou como a tradução inglesa do título explica: Vincent wants to sea. E porque é que ele quer o mar? Porque é lá que a sua falecida mãe queria as suas cinzas depositadas. Esta ideia é a menos original de uma comédia que consegue ser um pouco diferente do comum.

Diferente porque Vincent (Florian David Fitz) não é um jovem normal. Vincent sofre precisamente de Tourette e quando a mãe morre o pai, mais preocupado com a carreira que com a família, coloca-o numa espécie de centro de reabilitação. Por lá, Vincent – que até é um rapaz calminho – conhece Marie (Karoline Herfurth, a mulher ideal em Perfume: Story of a Murderer), uma anoréxica (magra a um nível Balesco) com vontade de conhecer o mundo e que o consegue convencer a sair dali e levar a sua mãe à morada final que havia escolhido.

A descrição até aqui faz lembrar um Road Trip politicamente incorrecto mas não é isso que acontece. Vincent will Meer está longe de ser um filme de Hollywood e isso nota-se sobretudo na forma realista como trata as doenças dos seus protagonistas. O Tourette não é usado como gag recorrente e forma de dizer palavrões, tal como a anorexia não serve só para tentar forçar uma lição de moral. Aqui as doenças são duras, os personagens choram de frustração, sofrem por não serem normais (sendo que o conceito de normal é bastante subjectivo) e chegam mesmo a sangrar...Isto num filme em que o terceiro dos fugitivos é um obsessivo-compulsivo com problemas em tocar no que quer que seja. É um tratamento realista mas felizmente nada dramático...por cada cena mais pesada o filme mostra-nos duas ou três em que eles estão bem e evita tornar-se deprimente.

Da comédia passa-se para o inevitável romance, e daí para algo muito importante: os personagens crescem. Naquela semana (se calhar até menos) em que estão sem supervisão todos eles são confrontados com os efeitos das suas escolhas e – também nada hollywoodesco – têm de reagir a isso, mantendo-se numa estrada cujo destino é desconhecido ou pedindo para parar, sair e voltar atrás para tentar de novo. Este passeio vai da Alemanha ao Adriático, passando pelos Alpes (a paisagem alpina neste filme é, sem sobra de dúvida, das mais espectaculares que já vi em cinema...de sempre!), mas a principal viagem é interior, às diferenças e semelhanças daquele grupo de desajustados que, no final do filme, estão cada vez mais desejosos de se misturar com o mundo.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Love and Other Drugs

Love and Other Drugs:



Deixem-me começar pela SMR propriamente dita: este filme é uma comédia romântica para adultos (tem nudez!) que, sendo melhor que o costume neste tipo de filmes, sofre do problema de não se decidir sobre o que quer ser: ou comédia, ou drama sobre doenças, ou romance lamechas ou promoção da carreira de delegado de propaganda médica...ninguém diria que a sua protagonista, Maggie (Anne Hathaway), sofre de Parkinson’s mas antes de ADD – Attention Deficit Disorder.

Dito isto.

O facto da protagonista do filme ter 26 anos e uma doença degenerativa como é a Parkinson’s impressionou-me bastante.

Antes que venham daí as piadas sobre o Michael J. Fox (que descobriu que tinha a doença aos 30) devo dizer que por muito que se goze a verdade é que se ter uma doença destas já é – no mínimo – lixado, imagino como não deve ser ser-se diagnosticado tão novo.

Estas pessoas são puros exemplos de perseverança despite the odds e só o facto de sobreviverem deveria ser de louvar, mas quando as vemos a seguir os seus sonhos e as suas carreiras sem nunca desistir ou a enfrentar a doença com um sorriso em vez de uma depressão devemos (pelo menos eu faço-o) sentir-nos inspirados e pensar que se calhar deveríamos queixar-nos menos das nossas pequeninas desgraças.

Na parte final do filme Maggie diz a Jamie (Jake Gyllenhaal) que no futuro será dependente dele e segue-se este diálogo, que me ficou no ouvido:

Maggie: I don't need you...
Jamie: Yes you do... someone to take care of you. Everybody does.
Maggie: I'm going to need you more than you need me.
Jamie: ...That's okay.
Maggie: No, it's not!! It isn't fair. I have places to go.
Jamie: You'll go there. I just may have to carry you.

Que todos os doentes de Parkinson’s, Tourette, Fibrose Quística, entre tantas outras doenças que infelizmente não são curadas pela indústria medico-farmacêutica porque não daria lucro, tenham – ao menos – alguém que as carregue. Não é um trabalho fácil, mas quem o faz só tem a ganhar com a experiência.