sábado, 31 de dezembro de 2011

Ano novo vida velha

Ano novo vida velha. Tal como no ano passado, este ano ficou-me uma SMR por fazer (The Baader-Meinhof Complex, que em breve estará aqui analisadinho). É a única que me falta fazer aos 114 filmes que vi pela primeira vez este ano.

Como é sempre difícil escolher o filme do ano (e relembro que aqui refiro-me ao filme que vi este ano, que não tem necessariamente de ser deste ano) resolvi destacar 4 longas e uma curta, cada um deles na sua categoria e cada um deles passível de ser a minha escolha, se tivesse de fazer só uma.

Filme que mais recomendei a outras pessoas: Panique au Village
Filme que mais me surpreendeu (pela positiva, claro): Gravity Was Everywhere Back Then
Filme que mais me marcou: Les Petits Mouchoirs
Curta-metragem do ano: Golden Dawn
Longa-metragem do ano: Melancholia


E agora digam-me de vossa justiça. Qual é ou quais foram os vossos filmes do ano?
Em 2012 quero-vos a participar mais!

Bom ano para todos.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Dogtown and Z-boys



Dogtown and Z-boys é o chamado companion piece de um filme de ficção de 2005 chamado Lords of Dogtown. Foi porque vi esse filme (ainda antes deste estaminé existir), gostei dele e achar piada à cultura de surf/skate californiana que este documentário entrou no meu radar e, uma data de anos depois, finalmente o apanhei e o vi.

Baseado sobretudo em filmagens da época (anos 70, feitas maioritariamente por Craig Stecyk, jornalista que mostrou o novo skate ao mundo) e realizado por um dos jovens que retrata (Stacy Peralta), este documentário conta-nos a história de como um grupo de putos resolveu adaptar os seus conhecimentos de surf ao skate e, em consequência, mudou aquele desporto para sempre.

Sim, sabiam que antes da Zephyr Competition Team (nome oficial da equipa que originou esta revolução no skate) o skate era visto como uma moda tipo o yo-yo e que as competições se dividiam em duas modalidades: corridas slalom e acrobacias tipo ginástica rítmica mas em cima de um skate? Pois era assim mesmo e foi este grupo de jovens que mudou tudo quando participou nos Del Mar Skateboarding Nationals, em 1975. Foi a partir daí que se começaram a desenvolver as manobras que hoje se fazem no skate e, pouco depois, surgiriam as paredes das piscinas como local de eleição para fazer manobras.

Quanto ao público alvo deste filme é fácil circunscrevê-lo: quem achou que o último parágrafo está cheio de informação interessante devia ver este filme e é quase certinho que vai gostar (foi o meu caso) mas quem acha que a história do skate é tão interessante como ver a tinta a secar se calhar fará melhor em optar por gastar dinheiro (ou banda larga) noutro filme, que este tem baixa nota artística (parafraseando Jorge Jesus) e nem a quase-narração do Sean Penn (que chegou a conhecer alguns daqueles miúdos na época a que o filme se refere) ou as brevíssimas e largamente injustificadas aparições do Ian McKaye e do Henry Rollins vos vão salvar da epilepsia induzida pela edição no mínimo trepidante. A estes últimos sugiro, por exemplo, ver o tal Lords of Dogtown, é mais certinho e pode ser que vos incuta o gosto pelo skate.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Luftslottet som sprängdes



aqui e aqui fiz SMR à primeira e segunda adaptações cinemáticas ao primeiro e segundo livros da saga Millenium, respectivamente. Se repararem bem em 2009 gostei muito do filme, em 2010 não e em 2011 ainda menos. Numa trilogia em que nos livros a qualidade se mantém, o segundo e terceiro filmes estragam o bom trabalho feito no primeiro.

Um bom advogado de defesa diria logo "têm de ver as coisas no seu contexto: enquanto que no primeiro e segundo filmes se adaptam livros com bastante acção neste terceiro a história anda à roda de uma pessoa acamada no hospital, em conversas entre idosos e nos bancos do Tribunal". Seria um bom argumento? Sem dúvida, e eu enquanto advogado apelidaria a opinião desse fictício colega como sendo "mui douta", no entanto o argumento acaba por não colher, na medida em que o problema deste filme não é a falta de acção, é o tentar enfiar tudo em 100 cenas de 30 segundos, em vez de apostar em 30 cenas de 100 segundos.

Não sei se seria caso para seguir a nova moda de transformar o último livro de uma saga em dois filmes, mas este problema que já tinha notado nos outros dois filmes (os livros estão pejados de informação e compreendo que seja difícil passar tudo para a tela) aqui então chega aos limites do desesperante, pois a sucessão de cenas e mais cenas faz com que não se tenha ligação com nenhum personagem (nem mesmo com a Lisbeth Salander, único ponto que se salva deste terceiro filme - parabéns Noomi Rapace), não se explicam as razões para nada, se ignoram totalmente personagens que não são assim tão secundários e se altera o procedimento criminal sueco de forma a permitir despachar a coisa o mais depressa possível. O ritmo do livro (que, na minha opinião, é o seu ponto mais forte) aqui é totalmente inexistente.

É certo que, como costumo dizer, não seria capaz de fazer melhor, mas é por causa desta tristeza de adaptação (leitores que leram o livro: vejam o que fizeram ao Niedermann e depois mandem-me um mail) que acabei de ver o filme com um sorriso na cara...há uma luz ao fundo do túnel.

A boa notícia é que daqui a poucos dias hei de ver o primeiro livro adaptado pelo David Fincher e cheira-me que neste caso a trilogia-remake americana vai acabar por ser melhor que esta.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

The Devil's Double

The Devil's Double:


Do realizador de xXx: State of the Union (Lee Tamahori) temos hoje um filme que nos conta a história - provavelmente baseada em factos reais - de Latif Yahia, um homem que teve o azar de nascer no Iraque e ser extremamente parecido com Uday, o filho mais velho do ditador Saddam Hussein. E digo que a história é provavelmente baseada em factos reais porque depois de o livro em que este filme é baseado ter sido publicado têm surgido dúvidas sobre a veracidade de muitas das coisas relatadas.

A história inicia-se quando Uday que está na altura de ter um duplo, que apareça por ele em locais públicos e que - caso necessário - leve os tiros que lhe eram destinados. Ora, no Iraque de Saddam Hussein o que Uday quer Uday tem e, não é tarde nem é cedo, Latif cai-lhe nos pés. Após ter sido aprovado pelo verdadeiro Uday Latif é informado que morreu, a partir de então será Uday, com tudo o que de bom e de mau isso tem.

De bom Latif recebeu o acesso aos melhores carros, palácios, mulheres, comida e bebida do Iraque, mesmo quando o resto do país estava na miséria. De mau, teve de testemunhar a loucura do homem que o forçou a sofrer várias cirurgias para tornar os rostos mais parecidos.

Quando digo loucura não uso a palavra livremente. Uday Hussein era a criança mimada dos infernos e até o seu pai o achava perigoso por ser demasiado descontrolado. Estamos a falar de uma pessoa que, segundo consta, raptava adolescentes de 13 ou 14 anos nas ruas de Bagdade, violava-as e matava-as, uma pessoa que matou um dos amigos do pai degolando-o com uma faca eléctrica num jantar de recepção ao Presidente egípcio, uma pessoa que enquanto presidente da federação iraquiana de futebol puniu os jogadores que perderam o playoff de qualificação para o Mundial forçando-os a pontapear bolas de cimento.

Sejam os dados contados por Latif verdade ou não (e mesmo que só metade seja verdade, já é mau o suficiente), o que interessa para este blog de cinema é o cinema e nesse aspecto a coisa não está tão má assim. Trata-se de um filme médio, com altos e baixos (por vezes é demasiado longo e perde-se, como tantos outros, numa história amorosa que deveria ser totalmente secundária) com um ponto muito positivo, a interpretação de Dominic Cooper

Não só faz um duplo papel, enquanto Latif e Uday, como é perturbadoramente brilhante sobretudo na forma como interpreta este último. É um trabalho excelente que mereceria um reconhecimento que ou muito me engano ou não virá, perdido que ficará na torrente de filmes para a época dos prémios e por duas outras razões:  já estreou há demasiado tempo e, mais importante ainda, o filme não ser mau mas também não ser bom. Noutras mãos seria uma desilusão, mas tendo em conta o passado do realizador até se torna uma surpresa positiva.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Paul



Paul é o novo filme do realizador de Superbad e Adventureland (Greg Mottola), um filme de que não gostei. Paul é o novo filme da dupla Simon Pegg/Nick Frost (responsáveis por duas das melhores comédias da presente década, Shaun of the Dead e Hot Fuzz). Paul é um extraterrestre em CGI cuja voz é emprestada pelo Seth Rogen. Paul é um filme fraco (a menos que o conceito de um extraterrestre constantemente a peidar-se e a dizer palavrões vos faça rir às gargalhadas). Paul é um filme que me foi recomendado pelo homem que fez obras na minha cozinha (e que tanto me falou da economia mundial como da estrutura gramatical da língua húngara). João é um crítico de cinema amador que devia ter percebido que isto ia ser mau, Paul é um filme muito fraco.

Feliz Natal para todos!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Humpday

Humpday:


Imaginem que estão muito bem a dormir na casa que dividem com a vossa mulher e que às três da manhã de uma noite qualquer vos bate à porta, sem qualquer aviso, um amigo dos tempos da Universidade. Imaginem que esse amigo parece o Zach Galifianakis (mas não é, chama-se Joshua Leonard e foi uma das vítimas do Blair Witch Project). Imaginem também que no dia seguinte vão a uma festa com esse amigo (e sem a vossa mulher, que não fica muito contente com a história) e que, já bem bebidos e fumados, começam a desenvolver uma ideia para um projecto artístico: dois amigos heterosexuais terem sexo um com o outro, enquanto forma de expressar a sua amizade. Finalmente, imaginem que no dia seguinte, já sóbrios, debatem com o dito amigo o raio de ideia que tiveram na noite anterior. O que diriam?

Ora, os protagonistas de Humpday continuam a dizer que sim, não se sabe se devido a uma atracção homoerótica latente ou se por não quererem dar parte fraca numa espécie de chickie run de sexo gay. Eu, pela minha parte, sei que não só rejeitaria esse projecto artístico logo à partida como acho estranho que, nas circunstâncias concretas do filme (um dos amigos demonstra ser bastante averso a experimentações sexuais), estas duas pessoas seguissem em frente com o projecto.

Acima de tudo foi essa impressão de falta de razoabilidade de toda a situação que me afastou um pouco do filme. A sua estética indie funciona bem (em certos momentos deu-me a sensação de que este filme inspirou o This Movie is Broken) e não há nada particular que possa apontar como falha, mas realmente estes dois amigos poderiam ter sido dotados de maior inteligência...tal como nos filmes de terror de baixa qualidade em que todos fazem o que não devem fazer ("Ora deixa-me lá ir passear sozinha para a floresta, a meio da noite") também aqui me parece demasiado óbvio que numa situação real um deles diria que não e não havia mais conversa, mas também já não havia filme.

A Separation

A Separation:


A cena inicial deste filme iraniano que este ano venceu o Urso de Ouro (maior prémio da Berlinale) é, em conjunto com a sua cena final, uma visualização perfeita do estado da relação entre Nader e Simin. Enquanto que no início este casal discute a possibilidade de divórcio sentados um ao lado do outro no final ambos estão calados, mais calmos mas afastados e separados por uma porta de vidro partida.

Numa tentativa de buscar metáforas para essa pujante imagem final poderia dizer que o vidro partido simboliza o que se passa durante as duas horas de filme. Algo se quebrou naquela relação e, tal como o vidro partido não pode ser reposto, também a decisão final será - de acordo com as leis iranianas - irredutível.

No início parece haver ainda uma ligação entre os dois. Simin (Leila Hatami) deseja sair do Irão e finalmente tem a hipótese de o fazer, só que no Irão uma mulher não pode sair sozinha e um filho menor não pode sair sem autorização do pai. O consentimento de Nader (Peyman Maadi) é fulcral e este mostra-se irredutível, não sairá do Irão mas também não vai obrigar a mulher a continuar a viver consigo.

A principal razão pela qual Nader não sai é o seu pai, doente de Alzheimer e completamente dependente. Tanto que, quando Simin sai de casa, Nader se vê forçado a contratar alguém que tome conta dele enquanto está trabalhar e aí é que vai começar todo o efeito bola de neve que só acabará, literalmente, quando os últimos créditos rolam e as luzes se acendem.

A pessoa escolhida para tomar conta do pai é Razieh (Sareh Bayat), uma mulher profundamente devota que está grávida e que esconde ao marido o facto de estar a trabalhar a dias por medo da sua reacção. Os pormenores da gravidez e das reacções do marido virão a ser extremamente importantes para a história, mas não vou por aí agora.

O grande mérito deste filme é ter uma das histórias mais interessantes que vi neste último ano. Conseguindo balancear perfeitamente o quase surreal da situação com a possibilidade dela poder mesmo acontecer (particularmente num país como o Irão), o realizador Ashgar Farhadi - mais um exemplar da vitalidade do cinema iraniano - consegue transmitir-nos realisticamente uma história que contrapõe a irredutibilidade de uns às dúvidas e temores de outros, num país cujas leis fazem com que cada acção ou palavra, por mínima que seja, pode ter consequências muito sérias.

Quando me ponho a pensar o que faria no lugar de Nader penso se não agiria precisamente da mesma forma. Se é verdade que não olhou a meios para atingir o seu fim, o facto de (muito provavelmente) ter razão faz-me pensar se não terá feito o que devia fazer. Por exemplo, se calhar estão a achar que esta SMR está especialmente críptica e que ficaram sem perceber sobre o que é o filme mas eu digo-vos que o meu intuito era precisamente esse: este é um filme cuja magia deriva do desenrolar da sua história e não vos quero privar da magia do cinema. É um grande filme que no final pode separar os seus protagonistas por um vidro partido, mas que a nós nos recebe sem um mínimo véu.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Terri

Terri:



O poster deste filme apresenta-o como sendo dos mesmos produtores de Half Nelson e essa é, realmente, uma boa associação a fazer. Se repararem até a nível de cores são parecidos e ambos têm como pano de fundo uma escola. No entanto, aqui trata-se mais do aluno do que do professor.

Terri (Jacob Wysocki) é um jovem mal inserido no tecido social de um liceu que poderia ter como aluno Napoleon Dynamite. Pelo seu tamanho fora do normal, pela sua vida caseira fora da norma suburbana americana e por não se preocupar com as suas aparências Terri está fora do mundo dos seus colegas de escola: os seus dias são passados em solidão até que há alguém que se preocupa, o director da sua escola Mr. Fitzgerald (John C. Reilly).

O Mr. Fitzgerald é um daqueles directores bonacheirões (como eu não tive) que, segundo conta a Terri, não tem memória suficiente para conhecer todos os seus alunos, pelo que se preocupa apenas com os muito maus e com os muito bons (a nível de personalidade, não de notas) e Terri é um dos muito bons.

Para acompanhar melhor o que se está a passar na vida do seu aluno Mr. Fitzgerald decide organizar uma reunião semanal, igual àquelas que já tinha com outros dos seus alunos "especiais" e é dessas reuniões que vão surgir as primeiras amizades de Terri naquela escola, com o Mr. Fitzgerald e com Chad (Bridger Zadina, um jovem actor desconhecido mas com uma interpretação de bastante qualidade), um colega com claros problemas psicológicos. Posteriormente surgirá ainda Heather, uma menina popular caída em desgraça a quem Terri acode.

Toda a história de Terri é marcada pela melancolia e pela crueza (mais um paralelismo com Half Nelson e com Blue Valentine, outro filme citado no poster) e não são poucas as vezes em que nos sentimos desconfortáveis com a vida que aquele(s) jovem(ns) vive(m) e no final da história Terri parece estar pior do que no início. Talvez esteja mais próximo dos demais colegas de escola, mas pior e, nesse sentido, não vejam este filme como uma história de salvação, Terri parece estar no seu mundo e tal como não parece ligar ao que se passa na sua vida também o filme não parece ligar muito ao que aqueles que o veem pensam.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

One Day



One Day é baseado num romance de um autor inglês chamado David Nicholls, um romance que conta a história da amizade entre um homem e uma mulher ao longo de 20 anos usando como estratégia o relatar-nos o que se passou no dia 15 de Julho de cada um dos anos. É um daqueles livros que alcançou o estatuto de best-seller permanente e, se viajaram de avião desde 2009 é bem provável que tenham visto a sua capa numa qualquer livraria de aeroporto.

Com este estatuto era mais que óbvio que de livro iria passar a ser filme, e heis que cá está ele. Convida-se a Anne Hathaway para fazer de amiga, o Jim Sturgess para fazer de amigo, uma realizadora dinamarquesa (Lone Scherfig, que em tempos fez parte da "escola" do Lars von Trier) e siga para bingo. O que se esqueceram foi de fazer do filme algo de interessante.

Não li o livro, apesar de confessar que numa das minhas viagens também eu o comprei numa livraria de aeroporto, mas depois de ter visto o filme confirmo aquela sensação que sempre tive desde que o comprei: não deve valer muito a pena. É verdade que normalmente os livros são melhores que os filmes que os adaptam e que é bem possível que tenha sido o filme a estragar a história (por muito bom que seja o marketing o livro há de ter alguma coisa de bom) mas mesmo assim não obrigado.

Não é que o filme seja péssimo...acredito que até seja uma escolha ideal para uma ida romântica ao cinema, mas existem demasiadas falhas que me irritaram.

A primeira delas (lembrem-se do nome deste blog e que por isso embirro com o que bem me apetecer) são os óculos de Emma, personagem da Anne Hathaway, uma mistura de Harry Potter com hipster via anos 80. Mas pior que isso (até eu admito que os óculos só por si não estragam o filme por completo) são as interpretações...é que ao contrário do que se passa no último filme que analisei aqui as personagens principais são mal interpretadas (e olhem que eu sou dos que gosta muito da Anne Hathaway) e têm uma pronúncia inglesa tão estranha que ou eu perdi toda a minha capacidade de entender aquela língua ou algo correu muito muito mal.

Ora, é um facto que não percebi para aí 50% dos diálogos (só vos posso aconselhar que vejam o filme com legendas, se o quiserem entender) mas também é facto que a nossa amiga Anne ganhou o prémio de pior sotaque do ano pela revista Empire (o Jim Sturgess é inglês, por isso provavelmente não se qualificou para esse prémio) pelo que vou apostar na segunda.

Este grande problema (maior ainda que os óculos de Emma) fez-me perder toda a ligação com uma história que, vista noutro contexto, poderia ser interessante. Já tenho idade suficiente para ter alguns amigos há mais de 20 anos e imagino como seria a história das nossas amizades contada dessa forma.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Carnage



Quando estive em Nova Iorque o ano passado fui várias vezes a uma agência de bilhetes tentar comprar lugares para a peça que na altura estava mais bem cotada. Chamava-se God of Carnage e era baseada num texto (em francês, no original) da autora Yasmina Reza. Quase dois anos depois a peça aparece-me à frente em forma de filme, agora chamando-se só Carnage, realizada pelo Roman Polanski e com o melhor conjunto (ensemble) de actores deste ano.

É uma peça fácil de adaptar e por isso mesmo senti que vi o que havia perdido em Nova Iorque. Toda a história passa-se dentro de quatro paredes, no apartamento do casal Longstreet, algures em Brooklyn. A esse apartamento desloca-se o casal Cowan, para debater como lidar com o facto de o filho Cowan ter agredido o filho Longstreet. O filme, tal como a peça, é apenas o desenrolar da conversa entre aquelas quatro pessoas e não funcionaria se não tivesse um excelente conjunto de actores dirigidos por um excelente realizador.

Felizmente tudo isso existe neste filme, já que ao Roman Polanski juntaram-se a Jodie Foster e o John C. Rilley para fazer de casal Longstreet e a Kate Winslet e o Christoph Waltz para fazer de casal Cowan. E estão todos ao seu melhor nível, tenho de vos dizer. 

Um erro que vinha a fazer desde que ouvi falar da peça até ter visto o filme era que se tratava de um texto dramático quando na verdade pelo menos o filme é uma comédia. A harmonia inicial, em que os casais se tratam com a devida cortesia e boas maneiras, rapidamente desaparece e, com algum álcool à mistura, começam a surgir aqueles momentos em que decerto os personagens pensariam "eu não devia dizer isto" mas dizem à mesma. No final, saímos do apartamento dos Longstreet e da sala de cinema com a ideia de que aquela conversa não correu de todo como deveria ter corrido.

Felizmente este não é um daqueles casos em que a comédia é involuntária. Tal como se calhar aconteceria se filmassem uma discussão nossa com os nossos pais/namorados/marido ou mulher a discussão que se desenrola naquele apartamento é dramática para aqueles que nela participam mas, vista de fora e com o devido distanciamento, é deveras divertida. Carnage consegue manter esse delicado equilíbrio por força das seis personalidades a ele ligadas (os quatro actores, o realizador e a Yasmina Reza, que adaptou a sua peça para o cinema) e será com certeza um dos títulos mais repetidos nas noites de entrega de prémios.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Hiroshima mon amour

Hiroshima mon amour:


Hiroshima mon amour é um filme de 1959 que ficou na história do cinema. Tem dois personagens, um homem e uma mulher (que, por não terem nomes, vou chamar de Ele e Ela) e uma cidade que todos conhecemos pelos piores motivos: Hiroshima, Japão.

Ela (Emmanuelle Riva) é uma actriz francesa que está em Hiroshima cerca de 10 anos depois da sua destruição para filmar um filme. "Sobre o quê?" pergunta Ele. "Sobre a paz. Sobre que mais se pode filmar em Hiroshima senão sobre paz?" A resposta foi dada por Alain Resnais, realizador de Hiroshima mon amour, ao deixar a paz de fora e filmar antes a convulsão interior de se estar preso ao passado.

Antes deste filme Resnais era sobretudo conhecido pelo seu documentário Nuit et Brouillard, sobre os campos de concentração nazis. Na altura em que foi convidado para filmar em Hiroshima a ideia era fazer um documentário sobre o pós-bomba atómica. Na altura o realizador achou que não conseguiria distanciá-lo suficientemente do seu anterior trabalho e a opção narrativa começou a ser explorada.

Os dez a quinze minutos iniciais são o mais parecido com um documentário que acabamos por ter; Ele e Ela abraçam-se (ainda sem nos terem sido apresentados) e, enquanto imagens da cidade nos vão sendo mostradas, debatem em voz-off as experiências dela na cidade: ela garante conhecer a sua verdadeira alma, ele diz-lhe que não, que não viu nada em Hiroshima

Passados esses minutos iniciais a narrativa avança e o estilo documentarial fica para trás, mas não as conversas entre Ele e Ela. A sua relação é fugaz mas intensa, Ela revê n'Ele o amor que perdeu em Nevers e nos sentimentos que Ele lhe desperta a loucura com que foi apossada quando esse amor cessou a sua existência. Ela, falando, liberta-se dos seus demónios ("tu me tues, tu me fais du bien") enquanto que Ele (Eiji Okada), maioritariamente ouvindo, alimenta uma paixão que o seu casamento já perdeu. A paixão face à impossibilidade do futuro.

Hiroshima mon amour ficou na história do cinema por vários motivos, desde o (até então inexistente) uso de rápidos flashbacks como forma de retratar a memória dos personagens até ao fabuloso e constante diálogo escrito pela Marguerite Duras. É um filme que não apelará à maioria dos espectadores actuais (é vagaroso e usa o paralelismo e a repetição como figuras de estilo preferenciais) mas que recompensa quem tenha paciência, vontade e/ou desejo de o ver com 89 minutos de grande, e histórico, cinema.

Nota curiosa: Foi precisa ir à cinemateca de Berlim para ver um filme francês filmado no Japão que estive para comprar em dvd quando vivia nos EUA. Adoro a globalização!

terça-feira, 29 de novembro de 2011

The Kite Runner

The Kite Runner:



Um filme facilmente esquecível de um realizador (Marc Forster) que tem no currículo dois filmes que me marcaram bastante, Monster's Ball e Stranger Than Fiction. Trata da relação entre Amir, filho da elite do Afeganistão pré-invasão soviética, e Hassan, filho do seu "mordomo".

É um filme com uma ou duas cenas interessantes (nomeadamente a forma como são filmadas as batalhas de papagaios) mas que se perde em histórias que não interessam nada (toda a parte da vida de Amir na Califórnia) enquanto deveria focar-se apenas e só na dualidade cobardia/lealdade entre os dois. Quando o que retive na memória foram os créditos iniciais o filme que se lhes seguiu só pode ser classificado como fraquinho.

Sempre é melhor que mau, certo?

domingo, 27 de novembro de 2011

And Again

And Again:



Esta é a história de Playas, New Mexico. Antigo posto de repouso dos cowboys americanos, Playas cresceu e muito nos anos 70, quando foi decidido desenvolvê-la enquanto dormitório dos trabalhadores de uma mina existente nas proximidades...chegou a ter 1000 habitantes.

Entretanto os tempos mudaram, em 1999 a mina foi fechada e a cidade foi morrendo aos bocadinhos. Os resistentes tiveram de encontrar outros empregos e quatro anos depois (em 2003, portanto) a salvação chegou sob a forma de uma das coisas mais estranhas de sempre: a cidade foi comprada pela universidade New Mexico Tech que, em colaboração com o EMRTC*, por lá criou um centro de treinos para resposta a ataques terroristas. A função dos que lá vivem? Fingir que são os terroristas/vítimas e não ligar ao facto de um belo dia poderem estar a jantar e entrar uma equipa da SWAT pela casa adentro.
Sim, leram bem, os habitantes de Playas, New Mexico são pagos para, dia após dia servirem de figurantes em simulações de combate para o exército ou polícia locais. Um deles, de aparência a dar para o Médio Oriente, foi escolhido para ser o terrorista e basicamente é preso todos os dias para ser solto uns minutos depois.

"Que coisa mais bizarra, vai dar um grande documentário", pensou a realizadora. Pena é que não tenha tido engenho ou audácia para fazer melhor, se a história de fundo é interessante tudo o resto deixa muito a desejar. Em primeiro lugar nunca são ouvidos os militares/polícias que lá treinam (uma perspectiva que, pelo menos para mim, seria importante), depois as imagens usadas são permanentemente fracas (desde as filmagens dos treinos, que parecem um filme tipo Ninja das Caldas, às ridículas interpretações da história da cidade, que só ocupam tempo) e tudo isto é unido por uma montagem muito, muito, mas muito fraca.

O trabalho de um documentarista é descobrir uma história para contar e contá-la, e muitos dirão que o que interessa é o que se conta, não como é contado, mas neste caso posso dizer-vos que se tivessem tido mais cuidado com o "como" este filme teria mais exposição e a bizarra história de Playas, New Mexico seria conhecida por mais gente. Assim não vai passar de um daqueles pedaços de informação que podem vir a ser usados em conversa por aqueles (creio que poucos) que acabem por a conhecer.


*Energetic Materials Research and Testing Center

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

30 Minutes or Less

30 Minutes or Less:


30 Minutes or Less é a história de Nick, um loser que entrega pizzas muito para além da adolescência e que um dia vê colete bomba colocado em si por dois homens que o obrigam a assaltar um banco por eles. Se fizer asneira explode, se não assaltar o banco num determinado número de horas explode, se chamar a polícia explode. É realizado por Ruben Fleischer, realizador do Zombieland, um filme com o mesmo protagonista que este (Jesse Eisenberg, que devia ter ficado pelos lados do Social Network) e que é uma excelente comédia baseada num tema normalmente não cómico: zombies. Aqui a ideia era fazer do drama da situação de Nick e do assalto ao banco uma comédia.

Dito isto, apresento-vos a história de Brian Douglas Wells, um entregador de pizzas em Erie Pennsylvania. Brian tinha 46 anos no dia em que morreu (continuou a entregar pizzas bem para além da sua adolescência, diria eu). E como é que morreu, perguntam vocês? Explodiu com uma bomba presa ao pescoço, bomba essa que foi colocada por dois homens que o forçaram a assaltar um banco por eles, sob pena de morte.

Segundo sei a Columbia (distribuidora do filme) mantém que os argumentistas não basearam o argumento deste filme nessa história e no final dos créditos até aparece o famoso disclaimer "This is a work of fiction (...) any similarity to the history of any person is entirely coincidental and unintentional". Existem algumas diferenças entre as duas histórias, sim, mas essa afirmação é falsa, este filme é de um mau gosto tão grande e só o posso desaconselhar a qualquer pessoa que saiba da história verdadeira, nomeadamente àqueles que acabaram de a ler através deste blog.

Não sou nada de censuras e até me considero um grande fã de humor negro, mas acho que a história de Brian Douglas Wells deveria ter tratada doutra forma e a sua memória merecia mais respeito. Para além disso, uma comédia supostamente tem piada e esta não tem nenhuma.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Drive

Drive:



Li na Empire deste mês que uma mulher americana processou os produtores deste filme por, aparentemente, o trailer parecer que se trata de um filme tipo The Fast and The Furious. Para eu próprio não ser processado deixo já o aviso: apesar do título e do que eventualmente possam achar do trailer, este não é um filme sobre condução de carros a alta velocidade.

Exemplo disso é a cena inicial, talvez a segunda melhor perseguição automóvel mostrada no cinema (a seguir ao Bullit, claro) mas que se caracteriza por ser metódica e não pela testosterona. Quem conduz o carro nessa altura é o Ryan Gosling, na pele de um duplo de cinema que faz uns biscates enquanto condutor de fugas após actividades, digamos, menos legais. Como ele diz aos potenciais clientes: ele não faz nada e não pega em armas, mas dêm-lhe uma janela de cinco minutos e podem contar com ele para o que quer que aconteça durante esses cinco minutos.

Este personagem interpretado pelo Ryan Gosling (um dos melhores actores desta nova geração? Assino por baixo!) não tem nome e é de muito poucas falas. A ideia do realizador (Nicolas Winding Refn) e do argumentista (Hossein Amini, baseado num livro de James Sallis) é deixar-nos sem saber quem ele é verdadeiramente pois ele próprio não sabe bem quem ou o que é.

Algo que fica bem definido, porém, é a sua ligação a Irene (Carey Mulligan) e ao filho, seus vizinhos e o mais próximo que parece ter tido de uma relação humana. Uma ligação tão forte que quando o marido de Irene volta para casa depois de ter passado uns tempos na prisão o nosso protagonista acabar por o ajudar, para que indirectamente Irene e o filho possam ser mais felizes.

Mas, como diz a tagline do filme "there are no clean getaways" (não há fugas fáceis). As coisas correm mal e muito vai ter de ser feito para proteger aquela mulher e aquela criança inocentes.

Desde a banda sonora (excelente) à fotografia, passando pelo guarda-roupa e pela forma como os silêncios são geridos, este filme é acima de tudo cool e impressionista. É por isso que estou com aqueles que o interpretam como tendo bastante mais para além da superfície. Para além de um filme de gangsters (que por vezes consegue ser bem violento, fica o aviso) Drive tem uma outra dimensão mais profunda mas que não é necessária para que saíamos satisfeitos da sala de cinema. Numa comparação meio simplista, pensem no Pulp Fiction.

Não é que Driver seja tão bom ou venha a ser tão influente como a obra-prima do Tarantino, mas enquanto filme desse género (que não consigo bem definir) é mesmo capaz de ser o melhor desde 1994 e não posso deixar de o recomendar a quem gosta de filmes nesta onda.

sábado, 19 de novembro de 2011

Bridesmaids

Bridesmaids:


Aqui há coisa de dois anos e meio estava no Porto com uma amiga e fomos ver o The Hangover. Eu gostei imenso (achei-o uma das melhores comédias dos tempos mais recentes) e ela não lhe achou piada nenhuma...daí, e de outras conversas com amigos e leitores aqui do estaminé, concluí - simplisticamente - que se tratava de um filme sobre gajos, para gajos. Esta minha conclusão vem agora abaixo com Bridesmaids, uma comédia ao estilo do The Hangover (não é por acaso que a Empire lhe chama The Hangovaries), com gajas (por contraposição a gajos) mas que não é só para gajas.

Aliás, se tivesse de optar por um único género, diria que esta é uma comédia para gajos. Felizmente não tenho e posso dizer-vos que se trata de uma comédia para todas as pessoas (independentemente do género) que gostam de rir. É uma comédia inteligente que mostra às senhoras do Sex and the City que se pode basear um filme cómico num grupo de mulheres com cabeça e aversão à futilidade.
A história é já nossa conhecida: duas amigas de infância; uma delas casa-se, a outra é madrinha; peripécias para organizar o casamento e a despedida de solteira. Sim, também tem uma sub-história amorosa e uma ou outras piadas que falham, mas esta é uma comédia que, ao contrário de tantas outras, distribuí piadas em quantidade e qualidade suficiente para nunca perder o interesse.

A diferença entre esta e outras comédias é que esta resulta, não vos sei dizer bem porquê mas muito por força da excelente interpretação da protagonista, Kristen Wiig. A ideia que passa é que não está a interpretar uma personagem mas sim que está a ser ela própria, e não é por acaso que depois aprendemos que tambén foi ela a argumentista do filme. Ora, se há algo importante na comédia é a espontaneidade (ou a impressão de que ela existe) e - provavelmente - é mesmo isso que faz com que filmes como este ou o Hangover sejam tão bem sucedidos: quando os vemos vemos um grupo de actores (ou actrizes) a divertir-se verdadeiramente, não a interpretar os seus papéis.

Pena é, portanto, que algumas cenas tenham sido forçadas pela produtora...não vos digo quais mas se virem o filme conseguem logo perceber, pois são as únicas que se destacam pela artificialidade. Sabem quando estão num grupo de amigos, a rir sabe-se lá do quê, até que alguém diz algo tão forçado que deixa de ter piada? Nessas situações, tal como deveria ter acontecido neste filme, o melhor seria deixar a conversa fluir e tentar não interferir com o fluir natural da conversa.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Beginners

Beginners:


Se analisarmos qualquer tipo de arte vemos que muitas vezes esta se rege por ciclos ou, noutra palavra, por modas. No cinema actual existem algumas modas também, sendo que uma delas foi (re)iniciada por filmes como o (500) days of Summer: histórias de amor com personagens a dar para o artístico/alternativo e com uma ou outra cena que parece fora de contexto mas que está ali apenas para mostrar o quão fixe/alternativo o filme é.

Se no caso do (500) days of Summer a coisa resultou (ao ponto de iniciar a tal moda) em Beginners a tentativa demasiado forçada de seguir esse estilo acaba por prejudicar a avaliação final que lhe posso fazer. Neste filme o total é inferior à soma das partes, diria um crítico de cinema com especial propensão para analogias matemáticas.

Se descontarmos esse esforço estilístico ficamos com uma história de amor entre uma rapariga daquelas que só são possíveis de conhecer nos filmes e um rapaz mais normal e profundamente pessimista no que toca a relações pessoas. Talvez por influência da falta de amor no casamento entre os seus pais, Oliver (Ewan McGregor) tem por hábito achar que tudo vai correr mal e, em consequência, sabotar o que estava bem até que passe a estar mal. Já Anna (Amélie Laurent, que conhecem do Inglourious Basterds) parece estar mais disponível para assentar e partilhar a vida com alguém, mesmo apesar de ter um pai também ele desiquilibrado emocionalmente.

Falo muito de pais porque um deles é uma peça central neste filme. Hal, pai de Oliver, esteve casado quase 50 anos com Georgia, mesmo sabendo que era gay, e é só depois da morte da sua mulher que - aos 75 anos - decide curtir a vida e experimentar a sua sexualidade em pleno. 

Assim dito, poderia parecer que Hal (o grande Christopher Plummer) serve apenas de escape cómico à história, mais amarga, do seu filho, mas felizmente o filme não é assim tão simplista. Depois de receber as piores notícias que se pode receber (c-a-n-c-r-o) Hal e o filho aproximam-se mais e, como que numa nova infância, Oliver acaba por aprender bastante com a forma como o pai lida com as dificuldades da vida.

E é essa a alegre mensagem que este filme triste me passou. Por muito má que vida seja, podemos sempre fazê-la melhor e por muito boa que seja há sempre quem a sabote e a torne pior. Mais do que os desenvolvimentos amorosos entre Oliver e Anna, interessou-me a relação entre pai e filho e é dela que retiro a sensação positiva com que fiquei quando a luz se acendeu.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

La Piel Que Habito

La Piel Que Habito:


Apesar de ter um dos posters mais feios dos últimos tempos lá fui eu ver o último filme do Almodóvar. Nem poderia deixar de ser, aliás, já que o Almodóvar é um daqueles realizadores dos quais faço questão de ver todos os novos filmes.

Curiosamente, este "film de Almodóvar" (como costuma apresentar sempre os seus filmes) é o menos Almodovariano até agora. Muitos fazem conexões aos thrillers do Hitchcock, com alguma razão, mas a história em que mais pensei foi na do Dr. Frankenstein. Aqui o Dr. Frankenstein chama-se Robert Ledgard, um cirurgião plástico residente em Toledo e que esconde um segredo dentro das paredes da casa em que vive.

Robert (António Banderas, que ao fim de quase 2 décadas volta a trabalhar com o realizador que o fez famoso) tem um projecto: criar uma super-pele artificial, resistente a queimaduras, picadas de insecto e sei lá mais quantas coisas. Quando apresenta o seu projecto à comunidade científica recebe tantos elogios como dúvidas em relação ao facto de fazer experimentação animal e, passado pouco tempo, é a própria academia espanhola de ciências que o proíbe de continuar. Acho que é escusado dizer-vos que continua...

Toda a atmosfera do filme é de tensão (daí as referências aos filmes do Hitchcock, presumo) enquanto voltamos atrás no tempo e conhecemos os motivos para que Robert tenha iniciado a sua experiência, o vemos a desenvolver a tal pele sintética e, finalmente, a pôr os conhecimentos que obteve em prática. No final, quando todas as peças do puzzle estão no sítio certo e a situação se resolve (o melhor possível, dadas as circunstâncias) os créditos começam a rolar e os espectadores ficam com uma de duas sensações: ou alívio e satisfação por Vera Cruz (Elena Anaya) ter conseguido o que tanto desejava e merecia ou enjoos por causa de algumas cenas anteriores.

Sim, porque aqui as famosas cores quentes do Almodóvar incluem o vermelho sangue e a sua excelente forma de transmitir sentimentos é bem aproveitada para explorar o medo e, mais tarde, a dependência dos personagens. Este não é um filme de terror daqueles que nos fazem saltar da cadeira mas - a meu ver - não deixa de ser um filme de terror. As provações porque Vicente (não vos digo quem é de propósito) passa são menos imediatas que as de personagens perseguidos por um louco com uma moto-serra mas, talvez por isso, mais intensas.

Em conclusão, este é um filme atípico: um Almodóvar que não é "um Almodóvar"; um filme de terror que ainda assim recomendaria à minha mãe e um bom filme que não cabe no meu top 3 Almodóvariano. Mais um exemplo de como as diferentes facetas se equilibram no meio caminho entre o brilhantismo e o esquecimento? Tem uma interpretação verdadeiramente fantástica (Bianca Suárez) mas também tem actores não portugueses/brasileiros a falar o português mais atroz da história do cinema. E aquele poster, aquele poster que parece ser feito para que as pessoas não queiram ver o filme!

sábado, 12 de novembro de 2011

The Adventures of Tintin

The Adventures of Tintin:


Era uma vez um pirralho chamado João Moreira. Esse pirralho tinha uns 11 anos quando alguém lhe deu o seu primeiro livro do Tintim (O Segredo do Licorne, curiosamente o livro em que este filme mais se inspira) e com esse livro ficou viciado. 22 dos 23 livros depois e cerca de 18 anos depois, esse pirralho já é adulto e vai ver a mais recente adaptação do mais famoso repórter (animado) belga. O que é que o ex-pirralho achou?

Achou que o ter lido tantas e tantas vezes as aventuras de Tintim fez com que o filme não fosse perfeito. É um problema recorrente na adaptação de livros: cada fã tem a sua ideia sobre os cenários ou sobre as vozes dos personagens, por exemplo. Neste caso a questão dos cenários não é relevante, uma vez que todos os vemos nos livros originais, mas a questão das vozes fez-me um bocado confusão.

Nem sequer é uma crítica, mas ouvir o Tintim a falar com pronúncia inglesa é um pouco estranho quando se sabe que o personagem é belga e sempre o ouvimos falar português com a nossa própria voz. Percebem o que quero dizer? Na mesma onda, faz-me confusão ouvir chamar a Milu de Snowy...Talvez este seja um filme no qual seria melhor ver a versão dobrada em português do que o original em inglês, não porque o original esteja mal - repito - mas para ser mais parecido com o Tintim que conheço há tantos anos.

"E para alguém que nunca teve ligação nenhuma ao Tintim, o filme vale a pena ou não?" perguntam vocês e muito bem. A minha companhia nesta sessão conhecia o Tintim mas nunca ligou minimamente aos livros e, perguntando-lhe o que achou, disse-me que era uma boa história de aventuras, ao mesmo tempo mais infantil e mais violenta do que estava à espera. Acho que é uma boa forma de definir o filme: aventuras pipoca (este é, sem dúvida, um chamado filme-pipoca) para miúdos já meio crescidos e graúdos não demasiado sério.

Em tempos Hergé disse que o único realizador capaz de fazer justiça aos seus livros era o Steven Spielberg. Entretanto já morreu e não pode opinar se tinha ou não razão quando disse isso: eu acho que sim. Muitos dos filmes do Spielberg são apontados precisamente para o público alvo destas aventuras e não são poucos os que vêm paralelismos entre a saga Indiana Jones e o Tintim. Spielberg é sem dúvida a escolha acertada para nos contar estas histórias no grande ecrã e a animação (ou, mais precisamente, o motion capture, que eu sou daqueles que percebe a diferença) o meio mais apropriado. Neste filme o mundo criado por Hergé está perfeitamente recriado e os seus personagens icónicos inteiramente respeitados, mesmo não tendo muito tempo de antena - tirando o Tintim (Jamie Bell, "o" Billy Elliot) e o Capitão Haddock (o meu favorito, intepretado por um brilhante Andy Serkis).

Dado o sucesso que este filme está a ter nas bilheteiras (sendo que ainda não estreou em muitos sítios) já foi anunciado que existirão sequelas. A primeira delas vai ser realizada pelo Peter Jackson (que produz este filme) mas contará com a participação do Spielberg enquanto produtor. Não sei qual será o ou os livros que adaptará, eu vou estar lá para a ver. A minha relação com o Tintim vai continuar.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Férias (ou algo parecido)

Olá olá!

Venho pelo presente avisar os meus queridos leitores de que continuo vivo e de boa saúde. Estou a gozar de umas férias (ou algo parecido) e conto publicar as cinco SMR que tenho atrasadas algures durante a próxima semana.

Até lá!

sábado, 29 de outubro de 2011

There Once Was An Island

There Once Was An Island:
 

Antes de escrever outras coisas tenho de fazer um aviso: sou apaixonado por ilhas remotas e este filme é sobre uma. A minha opinião pode ter sido influenciada por isso, até porque - não duvidem - passei o filme todo a pensar que um dia queria ir ali. Dito isto, venha a SMR propriamente dita:

Houve em tempos uma ilha, diz-nos o título deste filme. Mas na verdade essa ilha ainda existe, pelo que têm de perceber o verdadeiro sentido do título... Era uma vez uma ilha, chamada Nukutoa, situada no atol de Takuu, território da Papua Nova Guiné mas tão isolada que os seus habitantes têm a sua própria língua e praticam uma religião descrita como a última religão polinésia dos tempos pré-contacto com os exploradores ocidentais ainda intacta.


Essa ilha tem cerca de 400 habitantes e todos eles se debatem com uma questão que pode, a médio prazo, ser de vida ou de morte: a ilha tem uma altitude média baixíssima e por isso tem vindo a sofrer e muito com o aquecimento global. Muitos temem que em breve deixe de existir, por força das cada vez mais frequentes cheias provocadas pelo aumento do nível médio do mar. A tal questão de vida ou de morte é saber se devem ficar ou partir para outra ilha, para uma reserva designada para eles pelo Governo da Papua Nova Guiné.


Para os ajudar a resolver este dilema, uma ilhoa (SMR, a ensinar-vos novas palavras desde 2009)  que vive "na civilização" decide pedir ajuda a dois cientistas neozelandeses. Estes acabam por passar uma temporada na ilha a investigar as causas do problema e as possibilidades de o resolver. As conclusões a que chegam não são conclusivas (passe o pleonasmo): são dois e cada um tem uma ideia diferente, pelo que a comunidade continuou tão dividida como estava.


O realizador (Briar March) não caem no erro de nos apontar numa direcção. Mostram-nos o problema (e há imagens das cheias que são verdadeiramente angustiantes), apresentam-nos as soluções e apresentam-nos o ponto de vista de muitos daqueles para os quais a decisão é inevitável. O espectador logo decide se quer ou não ter uma opinião.


Aquelas 400 pessoas têm de escolher em breve. As cheias são cada vez maiores e mais frequentes, mas por outro lado o mudarem-se para outro lado implica acabar com o modo de vida que sempre conheceram e que os seus antepassados lhes ensinaram. Entretanto vão ficando, com o coração nas mãos, numa ilha de uma beleza incrível e que - como disse ali acima - me deu imensa vontade de visitar. É nestas alturas que penso que deveria ter seguido uma profissão ligada à natureza.



Filme no âmbito do DocLisboa 2011. Passou hoje e no dia 26, o que quer dizer que já não o vêem nesta edição do festival. Com sorte apanham-no noutra altura.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Golden Dawn

Golden Dawn:


Que grande filme! A sério, que grande grande filme! Dura só 16 minutos mas esses 16 minutos foram suficientes para me encher de vontade de fazer o meu próprio documentário. Haverá melhor elogio que se possa dar?

Golden Dawn apresenta-nos o quotidiano de um grupo de pescadores holandeses algures no Mar do Norte, enquanto tentam ganhar a sua vida naquela que é uma das mais antigas profissões do mundo. O tema em si não difere muito de alguns programas que passam no Discovery Channel, agora que a pesca de alto mar virou moda, mas aqui - ao contrário do que costumo fazer - vou dar mais valor à forma que ao conteúdo.

É que este filme é de uma beleza imensa. Ao mesmo que é frio e maquinal (a pesca e os pescadores não são os temas mais charmosos de sempre) consegue ser, palavras do resumo do Doc, poético na forma como retrata esta actividade. Vê-se que não foi uma obra de realização complexa (diria que foi filmado com uma câmara daquelas que se podem comprar nas lojas) mas a atenção dada à composição de todas as cenas/todos os frames é tanta e a banda sonora, de Filipe Felizardo, é tão boa que conseguem transformar o despejar de duas redes de arrasto numa dança. Repito, o filme acabou e eu só pensava em que temas poderia mostrar num documentário de estilo semelhante.

Maaaaaaaaaaaaaaaas, apesar de todos os elogios que já lhe dei tenho de dar um valente puxão de orelhas à realizadora (Salomé Lamas) por ter deixado que os quadros explicativos finais (não sei que outro nome lhes dar) viessem público com tantos erros de inglês: "Mi" em vez de "My" ou "To" em vez de "Too" e, ainda pior, "No mi son" em vez de sei lá o quê são falhas imperdoáveis para alguém que submete um filme a uma competição.


Filme no âmbito do DocLisboa 2011. Passou hoje e volta a passar no dia 29, às 18h30, no Pequeno Auditório da Culturgest.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Guañape Sur

Guañape Sur:


O dicionário Priberam da língua portuguesa define guano como sendo "adubo de substâncias orgânicas e, particularmente, do excremento das aves". Trata-se de uma substância tão importante para a economia do Perú que o próprio termo deriva da língua dos seus povos indígenas, o quechua. Hoje já não tão importante como outrora foi mas ainda é explorado comercialmente pelo governo local.

Neste documentário seguimos uma expedição comercial organizada pelo Ministério da Agricultura peruano. A cada onze anos são contratadas várias dezenas de trabalhadores que terão como missão separar o precioso guano da restante porcaria deixada por centenas de milhares de pássaros durante os dez anos anteriores. Como diz o capataz no pep talk inicial, guano não deixa de ser caca e como tal pode trazer doenças àqueles que o aspirem; usem máscaras, é o conselho, mas nem uma única se vê a ser usada durante o filme. Os trabalhadores simplesmente não as usam.

O realizador (alemão, János Richter de seu nome) decide não se focar nesse problema. Aliás, a questão das máscaras e das eventuais consequências para a saúde daqueles homens nem sequer é abordada (eu é que tenho a tendência para pensar nesses assuntos). O foco do filme é a actividade em si, não aqueles que a exercem.

"É uma escolha acertada?" perguntam-se vocês (ou pelo menos perguntei eu). Acho que sim, dados os constrangimentos de tempo a opção por abordar o passado, o presente e o futuro daqueles homens seria demasiado. Assim, deixou-se a prospeção de guano falar por si mesma, acompanhada do constante piar das aves que habitam aquele rochedo e de uma composição visual muito interessante e prometedora para alguém que tem aqui a sua primeira obra.




Filme no âmbito do DocLisboa 2011. Passou dias 21 e 24 mas só hoje é que tive oportunidade de escrever a SMR.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

The Redemption of General Butt Naked

The Redemption of General Butt Naked:


The Redemption of General Butt Naked é um documentário que tem nome de filme porno mas que, em dados momentos, podia transformar-se em filme de terror. Fala-nos da história de Joshua Milton Blahyi, guerrilheiro liberiano que ganhou a alcunha de General Butt Naked por liderar um grupo de combatentes que enfrentavam os seus inimigos completamente nus, crentes numa protecção divina que os tornaria invencíveis.

Quando ouvi esta última parte tive de me lembrar de um outro documentário, Invisible Children: Rough Cut. Nesse filme é-nos explicado que também no Uganda o exército de Joseph Kony por vezes combate nu, crente na mesma protecção divina. Isso é, claro, o menos relevante nestes dois importantes filmes, mas não deixa de ser curiosa a ligação, por nos permitir prescrutar a mente de dois monstros que espalham o caos e a dor e mesmo assim se sentem protegidos pelas suas divindades, o diabo na Libéria, deus no Uganda.

Mas neste filme sobre o General Butt Naked o título apresenta uma outra palavra, ainda mais importante para a história que se quer contar: redenção.

Ao contrário do que se passa no Invisible Children aqui o "monstro" é filmado pelos realizadores...Joseph Kony aparece só em alguns frames mas o General Butt Naked é o protagonista do filme, estando em cena na grande maioria do tempo enquanto conta a sua história, espalha a sua nova mensagem e pede desculpa aos que magoou ou aos seus familiar. Os tempos são de redenção para Joshua Milton Blahyi.

Isto porque ao fim de uma série de anos a cometer as maiores barbaridades da guerra civil liberiana Joshua teve uma visão: Jesus apareceu-lhe, fê-lo ver o quão errado estava ao comportar-se assim e mudou-lhe a vida para sempre.

Por vezes a conversão de Joshua parece ser honesta, vê-se que ele acredita nas palavras que diz, faz o que pode para ajudar aqueles que prejudicou (embora mantenha uma série de gadgets e roupas caras num país paupérrimo) e, segundo o filme, foi um dos poucos (senão o único) dos guerrilheiros dessa altura que se apresentou publicamente perante a Comissão de Verdade e Reconciliação (CVR) criada em 2005 e confessou as atrocidades cometidas. Mas, apesar disso, devo confessar que não consigo acreditar totalmente nele: quando vemos os seus sermões na igreja (Joshua é agora um "ministro" religioso) ou quando o vemos a apresentar as suas desculpas àqueles que magoou podemos testemunhar que sua agressividade continua lá por inteiro...Joshua parece ser um barril de pólvora que por agora está controlado, mas que a dada altura poderá voltar a explodir.

Se assim é ou não não sou eu que posso confirmar, deixo-o para quem convive com ele mais de perto, mas não deixa de ser interessante ver que a grande maioria daqueles a quem Joshua pede desculpa ("Sorry", diz ele, uma palavra demasiado fraca para os horrores que motivou) deseja que ele ainda venha a ser punido pelo que fez. O ter-se apresentado na CVR fez com que fosse indultado pelo que pode andar livremente na Libéria, sem vir a ser perseguido judicialmente mas ainda há muitos que querem que pague pelos males que fez. No final do filme também vocês terão o vosso veredicto.


Este é mais um documentário no âmbito do DocLisboa 2011. Passou hoje e volta a passar dia 28, às 21h45 no cinema Londres.

Koniec Lata

Koniec Lata:


Koniec Lata (O fim do Verão, em polaco) é uma curta metragem de 32 minutos que nos apresenta a realidade de uma escola militar russa. Nele ouvimos os testemunhos de jovens de 7, 11 e 16 anos e - em geral - vemos como a escola funciona.

Em Portugal existem também algumas escolas militares e apesar de conhecer algumas pessoas que lá estudaram confesso que nunca abordei com elas o assunto. É por isso que aproveito agora para perguntar a algum leitor que tenha essa experiência: é normal haver tanta desumanização dos alunos destas escolas? Em nenhum momento deste filme se testemunha qualquer cena de violência ou de antipatia dos mais velhos para com os mais novos (antes pelo contrário), mas fiquei com a impressão de que as crianças que ali entram saem mais autómatos que adultos. Talvez seja essa a ideia fundamental da instrução militar, mas quando o testemunho incomoda-me.

Tomemos como exemplo o jovem de 7 anos que apresenta o seu testemunho: é comandante da "1.ª tropa" (na escola observada os anos dividem-se por tropas) e tem como funções observar e garantir a organização, respeito e disciplina dos seus camaradas. Até aqui tudo bem, nós também temos delegados de turma (existem na escola primária? Não me lembro), mas um dos corolários dessa sua função é ter de avaliar quinzenalmente os seus colegas, em público (perante a turma e os professores) dizendo-lhes o que fizeram de mal e como deveriam corrigir. Parece-me um pouco demais para sete anos, mas - verdade seja dita - o nosso "comandante" parece gostar.

Por nos mostrar esta realidade tão distante (geografica e mentalmente) este documentário merece ser reconhecido. Está bem filmado, bem estruturado e mostra aquilo que parece querer mostrar desde o início, que as escolas militares (pelo menos as russas) podem ser uma boa solução para educar crianças num país tão grande que faz com que o exército seja a única instituição verdadeiramente nacional, mas essa educação traz como consequência o retirar da juventude aos jovens que recebe.


Filme no âmbito do DocLisboa 2011. Foi hoje a última das duas sessões.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Marxism Today (prologue)

Marxism Today (prologue):


Com a queda do muro de Berlim, a 9 de Novembro de 1989 muita coisa mudou na que até então era a República Popular da Alemanha. Uma dessas coisas foi o fim da carreira para todos os professores de "Teoria Marxista-Leninista" que existiam nas universidades do país. São essas pessoas que ouvimos nesta curta-metragem documental.

Ao ouvirmos alguns dos seus testemunhos vemos que alguns desses antigos professores de Marxismo-Leninismo sentem o que em alemão chamam de Ostalgie, nostalgia do Leste e, tendo em conta que a maioria de nós sabe agora o quão controlada e difícil era a vida nesse extinto país, podemos ser tentados a pensar que eles devem ser mas é parvos, ao preferirem uma sociedade em que tinham de pedir autorização para casar a uma outra que os acolheu, pagou a sua integração e modernização. Mas será que tudo é assim tão linear? Creio que não, temos de pensar que se tratam de pessoas que passaram uns 40 anos da sua vida a pensar (mesmo que à força) de uma forma que agora é vista como errada...como um dos entrevistados diz "a dada altura disseram-nos que a nossa vida até então foi um erro". Imaginem como se sentiriam se vos dissessem isso agora.

Em termos de qualidade do filme, propriamente dita, tenho que deixar uma nota: o tema interessa-me bastante, dada a minha ligação com Berlin e o meu interesse por história, mas para quem não esteja muito para aí virado se calhar não será o filme mais atraente. Tem algumas imagens interessantes (nomeadamente as das actuações de ginástica a la Coreia do Norte) mas a opção do realizador (que se chama Phil Collins mas não é O Phil Collins) em basear o documentário em entrevistas filmadas e o escopo muito reduzido mesmo afastam-no um pouco do interesse geral.


Filme no âmbito do DocLisboa 2011, passou hoje e volta a passar já amanhã, às 19h15, no cinema Londres.

Susya

Susya:


A história deste filme é simples de contar: um homem palestiniano de 60 anos decide voltar, com o filho de 25, à terra da sua família. Anos antes havia sido expulso pelos militares israelitas e para voltar a ver o que era seu teve de pagar bilhete, pois a sua terra natal foi transformada em espaço arqueológico.

As causas e consequências do que aqui se passa são muito mais profundas: pai, filho e restante família foram expulsos da sua terra por força da política de colonatos israelita e para além do triste que é terem de pagar bilhete para ver a sua antiga casa, ainda acabam expulsos dessa sua visita turística por um grupo de soldados israelitas que os vê como uma ameaça. Trata-se de apenas mais uma pequena peça no enorme (e irresolúvel) puzzle que é a questão israelo-palestiniana.

Esta curta não é nada de especial a nível técnico (dá-nos aquela sensação de "até eu podia fazer isto") mas não deixa de ter o seu interesse por pôr em foco mais um aspecto da ocupação israelita do território palestiniano e do drama que deve ser ser-se expulso do nosso país/da nossa aldeia sem que ninguém possa fazer nada por nós.

Filme no âmbito do DocLisboa 2011. Passou hoje e volta a passar dia 26 às 18h, na Culturgest.