terça-feira, 10 de maio de 2011

Indie Lisboa dia 6: Memory Lane + All Good Children

Memory Lane:



No Q&A que se seguiu a esta sessão o realizador partilhou que uma das questões que mais costuma ouvir é "qual a idade dos protagonistas?"; confesso que eu também tive essa dúvida e fiquei satisfeito quando o ouvi dizer que escreveu o guião imaginando-os com 25 anos, "uma idade em que já têm responsabilidades e a vida deles já mudou, mas em que o passado ainda está muito presente".

Acho que todos nós que já passámos por essa idade (ou que, mesmo mais novos, já deixámos de estudar) sabemos que a dada altura temos um momento em que nos apercebemos que as coisas já não são as mesmas. Alguns adaptam-se melhor a isso, outros nem tanto, muitas vezes dependendo do quanto temos para fazer quando nos tornamos adultos.

Em Memory Lane, a primeira longa de Mikhael Hers, todos os personagens principais têm essa incerteza no coração. Dos sete, Raphael é quem sofre mais com essa mudança. Aparentando não ter emprego nem família/namorada (as maiores ocupações dos restantes amigos) e vivendo ainda na Paris que os uniu, Raphael é o que o Eça de Queirós chamaria de dandy. No entanto, ao contrário de Carlos da Maia ou João da Ega, Raphael começa a bater mal com o facto do seu grupo se ter desmantelado.

Quando vocês passaram por esse momento como é que reagiram? Eu devo admitir que um pouco como Raphael, mas entretanto avancei e julgo estar mais próximo da reacção de Vincent (Thibault Vinçon, que às vezes é igual ao Jesse Eisenberg). Em vez de desesperar, Vincent apercebe-se que a mudança é natural e que o não estar constantemente com os amigos de outrora não quer dizer que não se possa estar bem, com eles, sem eles ou com alguns deles num registo que não existia antes.

O entrecruzar das memórias colectivas do grupo com o seu momento presente é uma excelente forma de nos pôr a reflectir sobre os nossos próprios grupos de amigos e aquelas longas tardes de Verão em que não ter nada para fazer era uma actividade em si mesma. O trabalho do realizador é notável, ao manter ao longo do filme um aspecto orgânico muito agradável (sobretudo a nível das cores) e, algo que já não referia há algum tempo, a banda sonora é bastante adequada ao tom que se quer para o filme.

Volta a passar no dia 13 às 16h30 e é um excelente programa para levarem os vossos amigos, aqueles com quem viveram as tais tardes de Verão.


All Good Children:



O resumo oficial deste filme na programação do Indie diz o seguinte: "Quanto menos soubermos sobre esta surpreendente primeira longa-metragem da cineasta britânica Alicia Duffy, melhor". Concordo com esta regra (no geral, não só em relação a este filme) por isso vou ser um menino obediente, falando de um outro filme.

Antichrist é um filme que estreiou em Portugal no Estoril Film Festival de 2009. Nele acompanhamos a história de um casal que resolve ir viver para o meio de uma floresta (não interessa agora porquê) e dessa mudança nasce a loucura.

Nos filmes as florestas costumam ser mais assustadoras que locais de agradável passseio. Aqui não estamos perante uma excepção: esta floresta cinemática é escura, ventosa, povoada de animais mais ou menos pequenos, mais ou menos assustadores. Falo de aranhas e de raposas, especificamente.

Talvez seja o isolamento provocado, talvez seja uma predisposição mental, mas em Antichrist (tal como em All Good Children) a floresta é um óbvio catalisador para o caos. O que antes era razão e auto-controlo passa a emoção e desespero, o que era paz passa a violência e o que era bonito torna-se muito, muito feio.

Antichrist é uma obra madura, com actores de gabarito com uma cinematografia de um nível muito elevado.

All Good Children é, com as devidas (poucas) diferenças, o Antichrist com crianças. É uma obra de qualidade (a fotografia e as interpretações infantis são especialmente merecedores de mérito), mas sofre pela excessiva colagem que, julgo eu, não conseguirá sair da cabeça daqueles que já viram a obra de Lars von Trier. São demasiadas as parecenças para que possam ser ignoradas.

A realizadora não esteve presente na sessão. Gostava de lhe ter perguntado se gostou de Antichrist e não tenho muitas dúvidas quanto à resposta.

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