domingo, 15 de maio de 2011

Indie Lisboa dia 10: Postmortem + A Film Unfinished + Bummer Summer

Post Mortem:


Post Mortem é a história do crítico gastronómico do Ratatouille enquanto funcionário do departamento de Medicina Legal de um hospital chileno, se nesse hospital chileno fosse feita aquela famosa autópsia a um alien, sendo que neste caso o alien seria o Salvador Allende, assassinado pelas tropas do Pinochet a 11 de Setembro de 1973. (Ou suicidado nesse dia, dependendo do que acreditarem).

Resumo estranho, não é? Pois o filme não é assim tão estranho mas o protagonista é mesmo parecido com o crítico gastronómico do Ratatouille, what can I do? Chama-se Mário, é mesmo funcionário desse departamento de Medicina Legal, onde transcreve as observações do médico para depois as colocar nos relatórios de autópsia, e é convidado à força para participar na autópsia do Salvador Allende.

É por aí que fica a ligação deste filme a essa revolução. Pensava que teria maior ligação mas Mário é um actor terciário que só passa pela revolução tangencialmente. O interesse dele está noutro lado: em Nancy Puelma, a sua vizinha/bailarina de cabaret que se aproxima dele quando o seu pai e irmão desaparecem nesse malfadado dia.

Mário parece ser um homem muito solitário e aquela dupla Nancy + sentir que tem um papel importante na revolução ("eu agora tenho um cargo") fazem-lhe mal à cabeça. Enquanto Nancy lhe dá bola ele está dominado, mas a partir do momento em que não qual animal ferido, Mário vai mostrar a sua maneira de ser. Cruel e fria.

O filme começa devagar, devagarinho, e vai crescendo em nós aos bocadinhos. Acaba por ser uma boa experiência (sobretudo pelo terço final, que vale mesmo a pena) mas sofre por demorar a pegar.

A Film Unfinished:


Um filme israelita filmado maioritariamente por cameramen nazis? Sim, A Film Unfinished é um documentário sobre o mais longo filme de propaganda nazi, descoberto há uns anos numa espécie de bunker algures na floresta alemã.

Este filme, gravado no gueto de Varsóvia em Maio de 1942, cerca de 3 meses antes da sua destruição e extermínio dos seus habitantes, tinha um título muito simples: "O Gueto". A Film Unfinished analisa esse filme e tenta perceber o seu propósito. Não vou falar muito sobre o documentário, que está bem feito e não abusa da emoção fácil, uma das coisas que menos gosto em documentários. Vou antes debruçar-me sobre o filme original.

Como alguns daqui sabem a minha namorada é alemã e por isso conheço aquele país um pouco melhor que o normal. Sei, por exemplo, que não são os monstros que muitas vezes o preconceito deixa transparecer. Por saber isso custa-me muito perceber o que é que se terá passado durante aqueles anos, a um povo que de repente deixou de ser humano e passou a considerar todos os outros povos sub-humanos. Ontem, durante este filme, reflecti sobre isso e fiquei a pensar se não terá a ver com a capacidade alemã para cumprir ordens...Em Portugal dizem-nos para fazer algo e tentamos logo arranjar forma de o fazer com pouco esforço/não o fazer ganhando o mesmo mérito, na Alemanha fazem e não questionam sequer. Pode ter sido isso que levou à barbárie do Holocausto.

O filme de propaganda (que compõe uns 90% do documentário) mostra-nos essa barbárie ao extremo. Se é verdade que os cineastas obrigavam os judeus a encenar algumas partes, para mostrar ao mundo que até não viviam mal (uma das cenas mais impressionantes é uma suposta refeição num restaurante..em que obrigaram a comunidade judaica a pagar as iguarias daqueles figurantes quando milhares morriam à fome lá fora) por outro lado não se coibiram de filmar a desgraça que por lá havia.

A intenção da propaganda nazi era mostrar que os judeus que viviam no luxo não se preocupavam com os desgraçados que morriam nas ruas, mas o que eles não estavam à espera era que o filme (encontrado sem qualquer bandas sonora) só seria visto agora...com comentário de alguns sobreviventes e a leitura do diário do director do Judenrat de Varsóvia. Estes depoimentos, longe da lógica da propaganda e muito mais próximos do que realmente aconteceu fazem-nos sofrer com aqueles que lá viveram e sofreram. Os nazis tentaram desumanizá-los, conseguiram-no com muitos, mas felizmente para nós as suas vozes, os seus testemunhos e - através desta propaganda - o seu quotidiano miserável passou para as gerações futuras, para que nunca esqueçamos a história.

Gosto muito da Alemanha actual, mas continuo a achar que a Alemanha nazi (que não é a mesma, apesar de ser o mesmo povo e o mesmo país) foi o ponto mais baixo da história da humanidade.


Bummer Summer:

Bummer Summer foi filmado com actores jovens, não conhecidos, e isso nota-se. É uma road trip dividida entre Ben, Lila (a sua ex-namorada) e Isaac, o seu irmão que acaba por ser um bocadinho empata-f*das!

As situações pelas quais passam interessantes, os diálogos são credíveis, as imagens a preto e branco são muito bonitas e têm lá uma praia absolutamente fantástica (se alguém descobrir onde foi filmado diga-me, a sério, quero visitar aquela praia!) e por isso é um filme muito agradável de se ver. Não é o cinema na maior nobreza da arte, mas por vezes - como os próprios personagens se apercebem no final - mais importante que o destino é a viagem.

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