segunda-feira, 26 de abril de 2010

Indie Lisboa dia 5: The Cat, the Reverend and the Slave + La mujer sin piano + Cinema emergente curtas 1

The Cat, the Reverend and the Slave:

Razão #1 pela qual quis ir ver este documentário: o Second Life.

Desde há coisa de dois anos que, nunca percebi bem porquê, a televisão portuguesa dá imensa atenção a este mundo virtual onde supostamente podemos viver a vida com que sempre sonhámos. A primeira vez que vi uma reportagem sobre o assunto resolvi ir espreitar aquilo e tão depressa me inscrevi naquilo como me desliguei de vez. Bastaram poucos minutos para ver que aquilo era um hype criado pelos media em que muita gente caiu.

Passados cerca de dois anos, e depois de ver este documentário, continuo a achar a mesma coisa.

Os entrevistados são pessoas reais que dedicam muitas horas do seu tempo a viver naquele mundo, que para eles é real. Tal como o título indica, os utilizadores do Second Life que conhecemos mais a fundo são um que tem um avatar de gato, que se sente um gato (é, por isso, um furry) e que anda com orelhas e cauda de gato na rua; um pastor evangelista que tem uma igreja enorme no Second Life, onde diz que Deus também está (pergunto-me qual será o avatar de Deus) e um homem que gosta de se vestir de mulher e que no Second Life é escravo de um dominador e ao mesmo tempo dominadora de três escravas (uma confusão, portanto).

Todos os três se revelam pessoas solitárias e que usam o SL (como lhe chamam) para contactar com mais gente. Mas o que mais me espantou foi mesmo um grupo de mães suburbanas, com ar saudável e até atraente (o que é estranho, dado o estereótipo de utilizadores de tais programas) que caem na mesma esparrela (ninguém me convence do contrário!) e decidem fazer uma das coisas mais parvas de que há memória...plantar árvores no Second Life, para alertar os utilizadores para as questões ambientais. Plantem árvores reais, senhoras!

Razão #2 pela qual quis ir ver este documentário: Goreanos

Aqui há uns meses, um dos artigos da primeira página da Wikipedia era sobre este estilo de vida inspirado nuns livros de que nunca tinha ouvido falar antes. Ao que percebi, o pessoal que segue isto à letra vive uma relação de sado-maso permanente, em que em vez de ter um marido ou mulher tem um dono ou escravo.

Gajo curioso que sou, e porque o tema me interessa (demasiado Marilyn Manson quando era jovem?) fiquei atento quando reencontrei este termo na descrição do filme.

Infelizmente quase não se fala do assunto, por isso também não me vou alongar mais. Fiquei na mesma, ou aliás, fiquei com a ideia que aquilo era mais uma brincadeira que um compromisso real como pensava antes que era.

Razões pelas quais não gostei lá muito do documentário:

Mais uma vez é um daqueles documentários cuja destreza na realização é praticamente nula. Não digo que fizesse melhor, e de certeza que os realizadores fizeram o melhor que conseguiram com os meios que conseguiram, mas este filme sofre do mesmo problema que o Um lugar ao Sol.

Para além disso, nos últimos 15 minutos debruçam-se sobre um outro mundo alternativo, desta vez real, que é criado todos os anos nos Estados Unidos, o festival Burning Man. Mais uma vez, é um tema que me interessa bastante (tive colegas de San Francisco que foram e me disseram que aquilo é mesmo outra onda) mas neste contexto ficou estranhíssimo. Deu a ideia que os realizadores acharam que o documentário estava curto e meteram por lá mais umas imagens sobre aquilo, por ser apenas moderadamente próximo do tema que abordaram no resto do filme.


La mujer sin piano:

Estou em risco de me tornar mais um crítico "normal"...pela 2ª vez em 2 dias vejo-me obrigado a fazer referências a filmes do Luis Buñuel. Foi ontem com o Origin of the Species e hoje por causa deste La mujer sin piano.

A proximidade vai muito para além da origem geográfica do filme. Não sei se terei sido só eu, mas enquanto olhava para a Rosa de Carmen Machi recordava-me da Sevérine, interpretada pela Catherine Deneuve em Belle de Jour. Ambas as mulheres têm vidas marcadas pela monotonia, e ambas procuram escapar a esse tédio através de uma mudança radical.

Mas enquanto que Sevérine faz escapadelas diurnas, Rosa tem uma só escapadela durante a noite que vivemos neste filme. E é uma escapadela bem menos marota, digamos.

Rosa é uma dona de casa quarentona e desesperada que também é depiladora. Mas quando a conhecemos melhor percebemos que os seus sonhos são mais altos que a sua realidade. Rosa pode não ter piano mas é uma excelente pianista, está cansada da vida monótona que tem com o marido e decide fugir. Nunca sabemos como vai ficar a sua vida no futuro, mas vê-se que aquela noite foi importantíssima para ela...descobriu novas gentes, novos mundos e descobriu uma nova vertente da sua personalidade.

Já eu descobri um novo realizador espanhol a seguir atentamente. Este La mujer sin piano é uma excelente lição sobre como contar uma história aparentemente simples de uma forma profunda e surpreendentemente tocante.



Passemos agora às curtas do dia, vistas na sessão Cinema emergente curtas 1:

The Armoire:


Um filme que nos é "vendido" como sendo um thriller (uma criança desaparece! é encontrada morta!) mas que é comédia e musical em (quase) igual medida. Uma boa surpresa com uma fantástica palete de cores.


Licht:


Seguimos uma senhora idosa que aparenta ter alzheimer ou assim. A história não é nada de especial, mas gostei imenso da fotografia, que poderia descrever dizendo que provavelmente seria assim que uma câmara da Polaroid captaria imagens em movimento.


Os olhos do farol:

(não encontrei imagem, mas vejam o trailer aqui)

Foi a curta que mais me puxou para esta sessão. É uma produção portuguesa sem qualquer diálogo (boa estratégia de internacionalização!) e que conjuga perfeitamente uma animação fabulosa com uma banda sonora muito bem conseguida.

É essa música, aliada à muita expressividade dos bonecos animados que nos faz viver as aventuras daquela filha de um faroleiro taciturno. Sem ser preciso uma única palavra. Muito, muito boa.


Muzica in sange:


O título não está mal escrito. É a expressão romena para a frase que estavam a pensar: música no sangue.

Infelizmente confirmei o que já temia...tenho algum problema com cinema romeno. Tirando o 4 luni, 3 saptamâni si 2 zile - que é excelente - acho que nunca gostei de nenhum. Este é outro exemplo...não é que seja mau, mas não me conta nada de especial nem me faz sentir nada.


Watts and Volts:


Outra boa surpresa desta sessão. Em Watts and Volts temos a história de um casal do bairro de Watts, em Los Angeles. Ele tem pose de gangster, mas está mais interessado em poesia e em brahmacharya. Ela é quem realmente controla a relação...ele grita com ela, eles discutem, mas é ela quem acaba sempre por levar a sua avante.

É uma história divertida e até romântica. Tem uma fotografia muito boa, mas o que se destaca acima de tudo é a banda sonora, tão boa que nem parece de uma curta.


Carne:

(mais uma vez não encontro imagem adequada. Fica o trailer, que não faz justiça ao filme)

Todas as edições do Indie têm uma curta completamente alucinada. O ano passado foi o Visionary Iraq, este ano já está encontrada, é novamente portuguesa e chama-se Carne.

A melhor forma que encontro para o descrever é Carmelitas Descalças meets Reservoir Dogs. Isso mesmo, tem uma freira, tem Jesus à chapada à freira por ser uma maluca, tem um diálogo entre os dois composto apenas por citações da Bíblia (que deixaria o Tarantino orgulhoso), tem uma cena de engate hilariante, tem referências ao Magnolia e tem, sobretudo, uma boa disposição que muita falta faz ao cinema português.

Para mim a melhor curta até agora! Só espero é que o humor tenha sido intencional.

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