Ben Rivers é um cineasta contemporâneo inglês cuja filmografia de curtas metragens é bastante extensa. Pela sua atitude DIY (a que sou muito ligado, pelo meu passado socio-cultural) e pelas suas técnicas de produção verdadeiramente indie ganhou direito a ser o realizador-foco da secção Cinema Emergente desta edição do festival.
Mas chega de falar da pessoa, passemos aos filmes.
Old Dark House:
Uma pelicula puramente experimental, sem história nem personagens, mas que me agradou bastante pelo conceito: ecrã quase integralmente preto em que as únicas fontes de iluminação são uma ou mais lanternas que, como que dançando, nos mostram uma casa em ruínas.
House:
Tal como a anterior, esta curta ficaria melhor num museu que numa sala de cinema. O próprio realizador, aliás, confessou durante a conversa com o público que esta era uma instalação.
O conceito é o mesmo e ouso dizer que será quase uma sequela, em que apenas muda o cenário (uma casa assombrada) e a qualidade dos efeitos especiais.
This Is My Land:
O primeiro personagem deste ciclo de curtas é Jake Williams, uma pessoa real (isso mesmo, o da foto) que vive sozinho numa floresta escocesa, onde o realizadou o descobriu e onde o ouvimos a explicar como se pode viver aquele tipo de vida.
Já não é tão experimental, mas mantém o estilo propositadamente antiquado de Ben Rivers (que filma apenas com câmaras dos anos 50/60) e é, talvez, o mais esteticamente apelativo deste conjunto.
Origin of the Species:
Das 6 curtas que vi hoje, esta foi a que gostei mais. Intercala close-ups da natureza (a fazer lembrar o Un chien andalou, da dupla Buñuel/Dalí) com testemunhos filosóficos de um outro solitário, obcecado pela evolução das espécies e o sentido da vida.
A World Rattled Of Habit:
Menos interessante mas mais divertida que a a anterior, aqui conhecemos Oleg, pai de um amigo do realizador, dotado de um sentido de organização muito peculiar. Valeu pelas gargalhadas.
May Tomorrow Shine The Brightest Of All Your Many Days As It Will Be Your Last:
Tem o melhor título, mas foi a que menos gostei.
Talvez por overdose de curtas, talvez por incapacidade própria, não consegui perceber o significado por detrás destas (belíssimas) imagens de mulheres-soldado e idosos-soldado.
e, agora sim, toca a seguir para as restantes sessões do dia.
Putty Hill:
A coisa descarrilou desde o início. Por motivos alheios à organização do festival, a sessão começou com 45m de atraso, o que me lixou os planos de jantar. Mas, mais uma vez, a satisfação dos meus leitores vem antes da alimentação! (Noutro dia falava em candidaturas ao prémio Nobel, hoje sugiro que aproveitem a vinda do Papa para me canonizarem!)
Anyway. O atraso não seria significativo de nada não fosse o filme em si também ser estranhamente longo. Digo estranhamente longo porque, objectivamente, não o é...dura 82m, nada que não seja comum. O problema é que há uma cena em que aposto que muita gente pensa que o filme deveria acabar mas não acaba e, infelizmente, extende-se por mais 20 desnecessários minutos.
A temática até é interessante: o evento central é o funeral de um jovem que morreu de overdose e ao longo do filme vamos observando as reacções dos seus amigos e familiares. A estética também é agradável: acompanhamos maioritariamente um grupo de jovens pelos suburbios de Baltimore e o look fez-me lembrar o Larry Clark (do Kids, por exemplo) sem o sexo a rodos. Finalmente, a metodologia é bastante original, já que mistura técnicas de documentário com uma história de ficção. Não me lembro de ouvir o realizador a fazer perguntas directas aos personagens em qualquer outro filme de ficção.
Se não fosse aquela cena final desnecessária a avaliação seria positiva, assim tenho de dizer que preferiria ter comido sem ser à pressa.
(Curiosidade: já sabia que os funerais nos EUA são bem menos formais que na Europa, mas neste filme assisti ao primeiro karaoke de funeral da minha vida. Será que acontece mesmo?)
Lebanon:
Este filme de Samuel Maoz foi o primeiro dos que apelidei como "filmes que vou ver nem que me caia o braço" que tive o prazer de ver neste Indie Lisboa. E bem que valeu a pena!
Em Lebanon seguimos um grupo de soldados israelitas que participam na Guerra do Líbano de 1982. Não são soldados especialmente bons, já que cometem demasiados erros, mas como compõem um grupo que comanda um tanque os erros lá vão sendo apaziguados pelo ferro que os envolve e protege.
E quando digo envolver é mesmo envolver. Uma das características mais marcantes do filme é a claustrofobia permanente, isto porque a grandíssima maioria do filme é filmado no interior do tanque em que estes soldados se deslocam. "E quanto é a grandíssima maioria, ó escriba?" perguntam vocês. E eu respondo-vos "Olhem para cima"...porque a imagem do poster é a única que não é filmada dentro do tanque.
Convivemos por isso com o mesmo óleo e fumo que os soldados e nunca vemos mais que eles, já que mesmo quando nos é dada oportunidade de espreitar cá para fora apenas o fazemos na perspectiva do soldado que controla as armas - através de um monóculo - com as imensas limitações de perspectiva que daí advêm. Há uma cena, então, que é especialmente sufocante: o tanque é atacado e, tal como os soldados, nunca sabemos de onde nem por quem...seguimos lá dentro, com eles, a conduzir à velocidade máxima e verdadeiramente a chocalhar por todos os lados até atingir um local seguro.
Mas este aspecto sendo importante não passa de forma. O conteúdo deste filme é a experiência pela qual os soldados passam. Como disse acima, são soldados que cometem demasiados erros, mas nunca nos devemos esquecer que são soldados à força. Tal como já tinha acontecido em Vals Im Bashir, o filme é baseado nas experiências do realizador enquanto jovem que se viu naquela guerra como parte do serviço militar obrigatório. Cometem os erros que eu cometeria, erros que derivam da incapacidade de matar e acima de tudo do terror que os seus olhos espelham tão bem neste que é, até agora, o melhor filme que vi neste Indie.
Não é um tão obscuro como outros filmes de que já falei aqui; desde que ganhou o Leão de Ouro do Festival de Veneza do ano passado que tem vindo a ser falado, tanto aliás que vai passar nas salas portuguesas fora do festival. Quem não o tenha visto ainda que o apanhe no cinema, porque é daqueles filmes que deve ser visto no grande ecrã, para que nos sintamos verdadeiramente dentro daquele sufoco. Num ecrã mais pequeno deve perder grande parte do impacto.
Vão é preparados. Houve quem o chamasse um pesadelo, mas ninguém disse que a guerra fácil.
Mas chega de falar da pessoa, passemos aos filmes.
Old Dark House:
Uma pelicula puramente experimental, sem história nem personagens, mas que me agradou bastante pelo conceito: ecrã quase integralmente preto em que as únicas fontes de iluminação são uma ou mais lanternas que, como que dançando, nos mostram uma casa em ruínas.
House:
Tal como a anterior, esta curta ficaria melhor num museu que numa sala de cinema. O próprio realizador, aliás, confessou durante a conversa com o público que esta era uma instalação.
O conceito é o mesmo e ouso dizer que será quase uma sequela, em que apenas muda o cenário (uma casa assombrada) e a qualidade dos efeitos especiais.
This Is My Land:
O primeiro personagem deste ciclo de curtas é Jake Williams, uma pessoa real (isso mesmo, o da foto) que vive sozinho numa floresta escocesa, onde o realizadou o descobriu e onde o ouvimos a explicar como se pode viver aquele tipo de vida.
Já não é tão experimental, mas mantém o estilo propositadamente antiquado de Ben Rivers (que filma apenas com câmaras dos anos 50/60) e é, talvez, o mais esteticamente apelativo deste conjunto.
Origin of the Species:
Das 6 curtas que vi hoje, esta foi a que gostei mais. Intercala close-ups da natureza (a fazer lembrar o Un chien andalou, da dupla Buñuel/Dalí) com testemunhos filosóficos de um outro solitário, obcecado pela evolução das espécies e o sentido da vida.
A World Rattled Of Habit:
Menos interessante mas mais divertida que a a anterior, aqui conhecemos Oleg, pai de um amigo do realizador, dotado de um sentido de organização muito peculiar. Valeu pelas gargalhadas.
May Tomorrow Shine The Brightest Of All Your Many Days As It Will Be Your Last:
(não encontrei fotos do filme, vejam lá o quão obscuro é!)
Tem o melhor título, mas foi a que menos gostei.
Talvez por overdose de curtas, talvez por incapacidade própria, não consegui perceber o significado por detrás destas (belíssimas) imagens de mulheres-soldado e idosos-soldado.
e, agora sim, toca a seguir para as restantes sessões do dia.
Putty Hill:
A coisa descarrilou desde o início. Por motivos alheios à organização do festival, a sessão começou com 45m de atraso, o que me lixou os planos de jantar. Mas, mais uma vez, a satisfação dos meus leitores vem antes da alimentação! (Noutro dia falava em candidaturas ao prémio Nobel, hoje sugiro que aproveitem a vinda do Papa para me canonizarem!)
Anyway. O atraso não seria significativo de nada não fosse o filme em si também ser estranhamente longo. Digo estranhamente longo porque, objectivamente, não o é...dura 82m, nada que não seja comum. O problema é que há uma cena em que aposto que muita gente pensa que o filme deveria acabar mas não acaba e, infelizmente, extende-se por mais 20 desnecessários minutos.
A temática até é interessante: o evento central é o funeral de um jovem que morreu de overdose e ao longo do filme vamos observando as reacções dos seus amigos e familiares. A estética também é agradável: acompanhamos maioritariamente um grupo de jovens pelos suburbios de Baltimore e o look fez-me lembrar o Larry Clark (do Kids, por exemplo) sem o sexo a rodos. Finalmente, a metodologia é bastante original, já que mistura técnicas de documentário com uma história de ficção. Não me lembro de ouvir o realizador a fazer perguntas directas aos personagens em qualquer outro filme de ficção.
Se não fosse aquela cena final desnecessária a avaliação seria positiva, assim tenho de dizer que preferiria ter comido sem ser à pressa.
(Curiosidade: já sabia que os funerais nos EUA são bem menos formais que na Europa, mas neste filme assisti ao primeiro karaoke de funeral da minha vida. Será que acontece mesmo?)
Lebanon:
Este filme de Samuel Maoz foi o primeiro dos que apelidei como "filmes que vou ver nem que me caia o braço" que tive o prazer de ver neste Indie Lisboa. E bem que valeu a pena!
Em Lebanon seguimos um grupo de soldados israelitas que participam na Guerra do Líbano de 1982. Não são soldados especialmente bons, já que cometem demasiados erros, mas como compõem um grupo que comanda um tanque os erros lá vão sendo apaziguados pelo ferro que os envolve e protege.
E quando digo envolver é mesmo envolver. Uma das características mais marcantes do filme é a claustrofobia permanente, isto porque a grandíssima maioria do filme é filmado no interior do tanque em que estes soldados se deslocam. "E quanto é a grandíssima maioria, ó escriba?" perguntam vocês. E eu respondo-vos "Olhem para cima"...porque a imagem do poster é a única que não é filmada dentro do tanque.
Convivemos por isso com o mesmo óleo e fumo que os soldados e nunca vemos mais que eles, já que mesmo quando nos é dada oportunidade de espreitar cá para fora apenas o fazemos na perspectiva do soldado que controla as armas - através de um monóculo - com as imensas limitações de perspectiva que daí advêm. Há uma cena, então, que é especialmente sufocante: o tanque é atacado e, tal como os soldados, nunca sabemos de onde nem por quem...seguimos lá dentro, com eles, a conduzir à velocidade máxima e verdadeiramente a chocalhar por todos os lados até atingir um local seguro.
Mas este aspecto sendo importante não passa de forma. O conteúdo deste filme é a experiência pela qual os soldados passam. Como disse acima, são soldados que cometem demasiados erros, mas nunca nos devemos esquecer que são soldados à força. Tal como já tinha acontecido em Vals Im Bashir, o filme é baseado nas experiências do realizador enquanto jovem que se viu naquela guerra como parte do serviço militar obrigatório. Cometem os erros que eu cometeria, erros que derivam da incapacidade de matar e acima de tudo do terror que os seus olhos espelham tão bem neste que é, até agora, o melhor filme que vi neste Indie.
Não é um tão obscuro como outros filmes de que já falei aqui; desde que ganhou o Leão de Ouro do Festival de Veneza do ano passado que tem vindo a ser falado, tanto aliás que vai passar nas salas portuguesas fora do festival. Quem não o tenha visto ainda que o apanhe no cinema, porque é daqueles filmes que deve ser visto no grande ecrã, para que nos sintamos verdadeiramente dentro daquele sufoco. Num ecrã mais pequeno deve perder grande parte do impacto.
Vão é preparados. Houve quem o chamasse um pesadelo, mas ninguém disse que a guerra fácil.
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