sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

The Kids Are All Right

The Kids Are All Right:



No dia em que este filme estreou nos EUA, a 9 de Julho do ano passado, ninguém – desconfio que nem mesmo os produtores do filme – imaginaria que uns meses depois, em Janeiro de 2011 iriam ouvir o seu título na lista de nomeados para o Óscar de Melhor Filme. Não é realmente um tipo de filme que costume estar nestas cerimónias – é uma comédia/drama familiar – mas se calhar porque agora os nomeados a esta categoria são 10 e não 5 lá teve direito a esse bónus que de certeza aumentará o número de espectadores.

The Kids Are All Right é uma história familiar, sim, mas tal como é diferente por ter tido tão importante nomeação (o último do género foi o Little Miss Sunshine, em 2006) também é diferente na sua história.

Não, não me estou a referir apenas ao facto de a família ter duas mães e o elemento que vem desequilibrar tudo ser o dador do esperma que foi usado na concepção dos dois filhos, Joni e Laser (só o melhor nome de sempre). Isso é importante porque traduz novos sentimentos que não costumam ser abordados em filmes semelhantes (não sei o que me passaria pela cabeça se fosse dador de esperma e 18 anos depois o jovem que gerei me telefonasse a pedir para nos encontrarmos) mas no final de contas continuam sempre a ser relações humanas e por isso não muda assim tanto.

O que para mim fez deste filme uma história vencedora é a grande qualidade dos seus intervenientes. A minha admiração pela Julianne Moore já não é de agora por isso com ela não fiquei surpreendido e se a Annette Bening é-me normalmente indiferente aqui gostei dela (se bem que a Julianne é que devia ter sido nomeada para o Óscar de Melhor Actriz, mas está bem), mas são os miúdos (Mia Wasikowska, que anda em todas agora, e Josh Hutcherson) e o Mark Rufallo que fazem este filme sobressair.

Os mais jovens são protagonistas da primeira metade do filme e se é verdade que na segunda passam quase a meros espectadores da quase ruína daquela família, fazem-no sempre a um nível superior ao que normalmente se espera dos filhos neste tipo de filmes. O Mark Rufallo, de quem nunca gostei especialmente faz aqui provavelmente o papel da vida dele...continua com o estilo molengão que sempre teve (e provavelmente o que mais me irrita nele) mas desta vez consegue conjugá-lo com muita pinta e com o mais importante de tudo – uma química enorme entre ele, os filhos e as mães (uma mais que outra, é verdade).

Finalmente, a interveniente mais importante e a razão pela qual o filme vai estar nos Óscares em vez de passar numa matiné de uma televisão qualquer: Lisa Cholodenko. Quem é ela, perguntam-se vocês? É a realizadora, respondo eu, e também a argumentista. Foi ela que desenvolveu esta história, escolheu perfeitamente os actores para os seus personagens, proporcionou esta química toda entre eles e no final editou o filme de uma forma que, não sendo especialmente complexa (de todo), nos deixa com vontade de conhecermos pessoas como aquelas na vida real.

É por isto que o filme mais se distingue...trata de um momento complicado na vida daquelas 5 pessoas mas nunca deixa de ser algo raro no cinema de qualidade, feliz e inteligente.

Tron:Legacy

Tron: Legacy:



“O meu pai ou está morto ou está a curtir na Costa Rica, provavelmente ambos”. Esta frase, proferida no terço inicial do filme e sem qualquer ponta de ironia pelo protagonista de Tron: Legacy, de seu nome Sam (Garrett Hedlund), resume a meu ver muito bem o tipo de filme que estamos a ver...uma série de disparates que servem apenas dois propósitos: efeitos especiais do caraças e light cycles, os meios de locomoção mais cool da história do cinema, a par do hoverboard do Regresso ao Futuro 2.

Tendo estabelecido que os efeitos visuais são o que realmente interessa, passemos desde já ao chamado busílis da questão, sendo que a questão é “Será que vale a pena aturar disparates durante tanto tempo só por causa do eye candy?

A resposta é irrefutavelmente sim. Os efeitos especiais de Tron: Legacy estão ao nível dos do Avatar, sendo que os acho bem mais giros (gosto muito daquele look, confesso), e esta sequela em nada envergonha o original de 1982. Não é um salto tecnológico tão grande, é verdade, mas não deixa de ser do melhor que já vi e de qualquer forma seria impossível suplantar aquele que foi o primeiro filme com efeitos digitais de sempre (!) a nível de avanços tecnológicos.

Sim, pessoas que não têm um geek por perto para vos explicar a razão pela qual este filme é tão importante, estamos perante a sequela de Tron, um filme que usando a premissa de que um programador informático cria um mundo virtual que entretanto ganha vida própria, aproveitou para pela primeira vez na história da humanidade fazer animação digital...qual Toy Story qual quê! Na sequela é o filho desse programador que entra no mundo virtual, que entretanto foi crescendo autonomamente, e tenta fazer uma data de coisas típicas deste género de filmes: salvar o mundo, ir a uma discoteca onde os Daft Punk estão a passar música (a banda sonora do filme é deles e é boa, mesmo para quem normalmente não gosta de música electrónica), lutar até à morte, enrolar-se com miúdas giras (se bem que estas são programas informáticos, inaugurando assim uma nova era de sexualidade) e – claro! – andar na sua light cycle.

É – como já disse – tudo muito típico deste tipo de filmes e tudo muito disparatado. As melhores ideias são as que se aproveitam do filme original, nomeadamente o mundo virtual desenvolver-se independentemente dos chamados utilizadores (nome dado aos humanos no mundo de Tron). É essa a ideia que mais me ficou na cabeça...será que estamos assim tão longe dessa realidade? Actualmente já temos esses mundos virtuais em programas como o Second Life (odeio e não percebo a obsessão dos media portugueses) ou o jogo World of Warcraft; por agora tanto um quanto outro ainda dependem da actividade humana mas será que é assim tão inconcebível que um dia estes mundos comecem a auto-desenvolver-se? Deixo a pergunta para que algum engenheiro informático me responda.

O que é que posso dizer mais para além destas considerações? Posso dizer que o 3D é muito bom (também ele ao nível do Avatar, que continua a ser o standard da indústria mas só até à estreia do Tintim, cheira-me), posso dizer que a técnica para fazer o Jeff Bridges mais novo funciona muito bem e em momento nenhum me pareceu que fosse CGI (como tenho lido alguns críticos a dizer) e – finalmente – posso perguntar uma outra coisa que também não me sai da cabeça sempre que penso neste filme e que agora não vão poder evitar pensar quando o virem: de onde é que apareceu o raio do leitão que ele come com o pai? Será um leitão digital?

E sim...acabei de falar de leitões numa crítica ao Tron. A partir deste momento podem dizer aos vossos amigos quando me descreverem: “aquele gajo é capaz de tudo, mesmo!”.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Cosa voglio di piú

Cosa voglio di piú:



Que mais quero eu? Que mais gostariam vocês de ter? A vossa vida é perfeita? A minha, posso dizer, corre bem, mas não é perfeita: a insatisfação é parte essencial da natureza humana e por muito que tenhamos queremos sempre mais.

Anna (Alba Rohrwacher), a protagonista da história, tem esse problema. Aparentemente a vida dela está bem lançada: não é rica, mas não passa fome, tem um marido que é um bacano (a sério, é das interpretações mais simpáticas de que há memória, os meus parabéns ao actor: Giuseppe Battiston), uma casa que não é má e – muito importante – gosta do trabalho que faz e a sua competência é reconhecida pelo patrão. Até que – e há sempre um "até que" – Anna conhece Domenico (Pierfrancesco Favino) e, como diria a minha mãe, parece que lhe dá uma atacadinha.

De repente, aquela vida que até então era satisfatória torna-se insuportável e a tentação de enviar mensagens a Domenico passa de tentação a realidade e das mensagens passa-se a primeiro encontro, e por aí em diante. Domenico é o típico gajo do cinema (seremos todos assim na vida real? Gosto de pensar que não), dá corda, dá corda, dá corda, diz que a ama quando ela se zanga (como dizia o Robin Williams no seu stand up, a melhor forma de uma mulher garantir que um homem lhe diz que a ama é zangar-se com ele) mas; há sempre um "mas".

Claro que esta crise emocional de Anna tem efeitos em tudo o que a rodeia e é para isso que cá estamos, para acompanhar essa demolição.

O realizador do filme, Silvio Soldini, consegue mantê-lo sempre num grande equilíbrio entre a distância quase voyeuristica e a proximidade àquele casal digamos que informal. Penso que é uma boa estratégia, na medida em que tal como os desejos de Anna (e de Domenico, é preciso dizer-se que Anna não é a má da fita) vão e vêm, também a distância é maior ou menor. Aliás, o problema deste filme não é a execução – os italianos sabem fazer filmes bons e este é mais um – mas sim a duração, que peca por excesso.

No entanto, apesar de ser realmente uma falha, percebe-se que se tenha de comparar a vida anterior e posterior de Anna para que o espectador perceba o que é que está em causa, o que é que Anna está disposta a perder...sem ponto de comparação seria mais uma história de boy meets girl, assim é mais interessante e realista.

Por ser realista é um filme que nos faz pensar em nós próprios, pensamos no que outrora já pensámos e porventura já deixámos de pensar. Não me refiro expressamente à necessidade de aventuras românticas ou sexuais, mas sim ao facto de todos nós – num momento ou noutro – nos termos considerado infelizes quando na verdade somos uns sortudos.

Eu, pela minha parte, não me canso de dizer que tenho uma vida boa e muito honestamente acho que essa é a razão pela qual estou satisfeito com ela. Não lhe chamem ser pouco ambicioso, chamem-lhe efeito bola de neve.

domingo, 23 de janeiro de 2011

Tulpan

Tulpan:



O realizador de Tulpan, Sergei Dvortsevoy, é um documentarista que aqui tentou o seu primeiro filme de ficção. Se a ideia era apenas contar uma história ficcionada com tudo o resto a parecer bastante real então o objectivo está conseguido e o senhor está de parabéns...não sei se os personagens são interpretados por actores ou por alguém sem experiência, mas se a primeira opção for verdadeira a segunda parece bastante mais razoável.

Tulpan é a história de uma família que vive num yurt nas estepes do Cazaquistão, onde se dedicam à pastagem de ovelhas. Ondas e Asa são os protagonistas antagónicos do filme, mesmo sendo família e vivendo juntos naquele deserto. Ondas é o patriarca, um homem que sabe que a vida é dura e que vive para trabalhar: não aparenta ter sonhos (se bem que tem um interesse peculiar pelas notícias do mundo) e quando não está junto ao seu rebanho parece desligar mentalmente. Asa, por outro lado, é o seu filho mais velho, acabado de chegar da Marinha e com o sonho de assentar arraiais naquela zona e ter a sua família.

A sua primeira (e única) tentativa é Tulpan, a rapariga que dá nome ao filme e a qual nunca vemos propriamente. É a única tentativa porque não existem mais raparigas naquela zona para além das irmãs de Asa. Quando Tulpan rejeita asa por causa do comprimento das suas orelhas (yup, leram bem) a vida do rapaz torna-se um mar de ânsias: o patrão do pai não lhe dá o seu próprio rebanho enquanto for solteiro, a relação familiar não corre nada bem, sobretudo porque Asa não tem mesmo jeitinho nenhum para ser pastor e o seu melhor amigo insiste que deveriam ir para a capital, em busca de dinheiro e mulheres.

Mas Asa está tão ligado à estepe como este filme. É ali que se sente em casa e por muito que a vida seja dura, com tornados frequentes (e muito bem filmados) e uma poeira que me deixaria louco, é ali que a vida para ele é vida. Ele que já viu o mundo, incluindo polvos e tubarões que para os restantes habitantes daquele yurt são criaturas míticas.

Nós ao vermos este filme testemunhamos cenas que poderiam ser um filme realizado pelo meu amigo Diogo ou uma nova versão do Gato Preto Gato Branco: um burro penetrador enquanto uma criança de 3 anos passa à frente, respiração boca a boca a ovelhas, um melhor amigo que está tão perto de ser (medicamente) louco como de ser atrasado mental, etc., etc., etc. Tudo isto é interessante para que se conheça uma realidade que - vista do mundo dito ocidental - parece medieval, mas não estranharei se me disserem que depois de terem visto o filme rapidamente o esqueceram. Acho que é isso que me vai acontecer.

Douro, Faina Fluvial + Aniki Bóbó

Olarelas! Aqui está uma dose dupla justificada pelo facto de também ter visto os dois filmes de seguida, tal como se fosse ao cinema e visse a curta metragem antes do feature film.

Douro, Faina Fluvial:



O ano é 1931 (há 70 anos atrás, portanto), o realizador um senhor chamado Manoel de Oliveira, o senhor é - ainda hoje - realizador de cinema. É português, tem 102 anos de idade (cento e dois!) e, para quem não sabe, é o mais velho realizador ainda no activo, com uma média de quase um filme por ano. Ainda falam do Woody Allen.

Os meus leitores portugueses sabem que hoje em dia os filmes deste senhor são associados a uma sensação de aborrecimento. Curiosamente, este que é o seu primeiro filme é cheio de movimento. Trata-se de um documentário que retrata a vida dos trabalhadores e residentes nas áreas ribeirinhas do Porto e de Vila Nova de Gaia. É uma vida de trabalho, muito dependente da pesca (algo que já acabou, a pesca de 1931 é o turismo de 2011) e que não é propriamente agitada: o que aqui é agitado é a forma como foi editado, com efeitos especiais que à altura seriam state of the art e que fazem lembrar Robert Wiene, Eisenstein ou Buñuel.

Já disse aqui que gosto de documentários porque me permitem ver o mundo através de outras perspectivas, mas neste caso gostei porque serviu de máquina de tempo. Nasci e vivo em Lisboa, mas sinto-me portuense de coração e foi com grande curiosidade que vi este filme. É, 70 anos passados, uma excelente forma de ver como era a vida na cidade onde - 13 anos depois do filme ser filmado - nasceria o meu pai.

Não fosse isso seria um filme que talvez visse numa qualquer sessão da sala de curtas da Cinemateca, assim o seu valor aumentou exponencialmente e se algum de vocês tem uma ligação semelhante a esta invicta cidade só o posso recomendar, para que vejam que a arquitectura é a mesma mas tudo o resto parece ter mudado.



Aniki Bóbó:




Aniki Bebé
Aniki Bóbó
Passarinho, tótó
Birimbau, cavaquinho
Salomão, sacristão
Tu és polícia, tu és ladrão

Esta música é o equivalente de 1942 ao actual um-dó-li-tá, usava-se para seleccionar as equipas para um jogo de polícias e ladrões e deu o nome à primeira longa-metragem de Manoel de Oliveira, 11 anos depois do filme aqui de cima.

O nome do filme deriva de uma canção infantil porque o filme é infantil. Não no sentido actual, claro...não há cá mensagens simplificadas, animais falantes, muitas cores e alegria. Aniki Bóbó é um filme com "hipocrisia e egoísmo" (para citar a descrição do DVD), um filme em que o mundo adulto e alguns dos dramas dos adultos são vistos pelo olhar de um grupo de crianças do Cais de Gaia.

A história é igual a tantas outras (se bem que na altura ainda não era tão pouco original e actualmente os protagonistas não teriam uns 10 anos): dois rapazes, Carlitos e Eduardinho, estão apaixonados por Teresinha, uma rapariga do bairro. Enquanto que Carlitos é simpático Eduardinho é o que hoje se chamaria de bully. O conflito entre os dois vai-se estendendo até ao momento em que algo de muito grave acontece e a situação só se resolve com a intervenção de um adulto.

A história é simples mas tudo o resto é notável: em 1942 Manoel de Oliveira fez um filme mais animado que os seus mais recentes trabalhos (também é normal, era 60 anos mais novo), com um excelente grupo de crianças-actores cuja interpretação está ao nível dos melhores e com uma técnica cinematográfica que - como é normal - é menos refinada que a de hoje mas que, por outro lado, permite um contacto mais próximo com os personagens.

É engraçado ver como ao contrário do cinema infantil de hoje, aqui as crianças esforçam-se por representar como adultos (não é mau nem bom, é só diferente), como os hábitos de então desapareceram totalmente para dar lugar a um mundo actual que pareceria ficção científica para estes miúdos e, acima de tudo, o que já disse acima: a arquitectura daquelas margens do Douro está praticamente na mesma, mas tudo o resto mudou.

Este filme é um marco do cinema português. Ouso até dizer que é o mais importante filme da nossa história, deveria ser visto por todos mas já que não é apenas vos posso sugerir, meus leitores, que se esforcem por vê-lo. Estamos perante história do cinema, história do cinema que ainda por cima é gira de se ver.


P.S.: Uma nota para a excelente edição do DVD. Nunca tinha visto nenhuma película restaurada pela Cinemateca Portuguesa mas posso dizer que estas estão que nem novas.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

The Ex

The Ex:



Quem é que se lembra do último filme protagonizado pelo Zach Braff? Nope, não é o Garden State. Não, também não é o The Last Kiss. O último filme da estrela do Scrubs chama-se The Ex (ou Fast Track, consoante a zona do globo em que estão) e, tanto quanto sei, nunca estreou em sala em Portugal devido ao seu rotundo falhanço na crítica e nas bilheteiras americanas.

Verdade seja dita que realmente não se perdeu nada, já que ao contrário dos outros dois filmes que referi e – claro – da excelente série cómica que o mostrou ao mundo, The Ex é um filme baseado numa má ideia que teve uma ainda pior execução.

A má ideia é a seguinte: o nosso amigo Zach faz de Tom, um personagen tipicamente dele (quirky é a palavra que me surge mentalmente) que é casado com Sofia (Amanda Peet a fazer de advogada grávida numa onda mais Anne Geddes que Ally McBeal). As coisas não correm bem na grande cidade e o casalinho maravilha muda-se para a cidadezinha natal da menina, no Ohio. E quem é que lá vive? E quem é que trabalha na mesma empresa (ridícula) em Tom vai trabalhar? Nada mais nada menos que o ex-namorado paraplégico em que “nem tudo abaixo da cintura está inutilizado”, claro!

O que se segue é uma série de piadas envolvendo paraplégicos que nem são de mau gosto, mas que pura e simplesmente não têm piada.

Ora, uma comédia com o Zach Braff, o Jason Bateman (Arrested Development) e a Amy Poehler (Parks and Recreation), entre outros, tem a obrigação de ter mais do que duas ou três piadas boas em 92 minutos de duração. No fim do filme estava mais enervado que divertido e se há filmes em que isso é bom, neste só pode significar que algo correu muito mal.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

The Tourist

The Tourist:


The Tourist foi um fracasso da crítica, que o viu como fraco a nível de caracterização de personagens e desnecessário por ser o remake de um filme francês do longínquo ano de 2005. Eu partilho de ambas as opiniões, mas – pára tudo! – achei o filme engraçado e merecedor do vosso tempo.

Analisemos as críticas mais frequentes ponto por ponto:

1. Aqueles personagens são tão básicos que tenho de concordar com o Ricky Gervais quando disse que o ano de 2010 foi tão bom para o 3D que o único filme sem profundidade foi o The Tourist: é verdade, são tão básicas que nem precisariam de nomes, bastaria serem, ao estilo de um The Road meets romances de cordel, “O Turista”, “A Gaja Boa”, “O Mafioso Mauzão” e/ou “O Polícia Que Não Desiste”. Quase nenhum deles tem qualquer história para além disso, o que tem (“O Turista”) não faz sentido nenhum e mesmo os secundários são pouco mais que cut-out cards.

2. Mas que raio de ideia foi essa de fazer um remake de um filme de 2005, hein?: pois é, mas em relação ao Låt den rätte komma in o período entre o original e o remake foi ainda mais curto e ninguém se queixou (disso!). Não sei se o original é melhor ou pior que este porque não o vi mas mesmo eu que sou contra a onda americana de remakes só porque não lhes apetece ler legendas acho que não é razão para criticarem este filme.

A estas críticas eu, que – repito – achei o filme razoável – acrescento mais umas quantas que já li por aí e com as quais concordo: o Johnny Depp vai muito mal enquanto “O Turista”, nada ao nível daquele que é um dos melhores da sua geração (parece permanentemente sedado!); por causa dessa má interpretação não há nenhuma química entre ele e a “A Gaja Boa” (Angelina Jolie), sendo que o filme precisa dessa química para ser minimamente interessante; o realizador Florian Henckel von Donnersmarck desceu de cavalo para burro ao seguir o Das Leben den Anderen com este cócó fluante num qualquer canal de Veneza; não faz sentido nenhum a história depender de um encontro meramente casual; o Paul Bettanny é um banana; etc. etc. etc.

Mas, por incrível que pareça, o vosso crítico favorito também consegue arranjar uns quantos elogios: a Angelina Jolie vai muito bem enquanto “A Gaja Boa”, num papel que se fosse de um filme mais antigo e com menos acção iria direitinho para uma qualquer Grace Kelly desta vida; Paris e sobretudo Veneza são filmados com um rigor incrível e que – também aqui – faz lembrar um filme dos anos 70 (não fossem as imensas geringonças high-tech); o filme dá-nos vontade de ser turistas; a banda sonora levaria um bom pequeno se estivesse na Secundária; e ... não estou a ver assim mais nada.

Olhando para o tamanho dos parágrafos a análise final deveria ser negativa, não era? Era! Pois, mas isso era se estivessem a ler o blog objectivemoviereviews.blogspot.com (e vale a pena irem lá dar um salto). Aqui nada tem necessariamente de fazer sentido e é por isso que apesar de tudo vos digo “Ide, ide gastar o vosso dinheirinho ou os limites de download da vossa internet”.

Pensem num Missão Impossível (versão série de TV) ou num Knight Rider...séries que se virmos agora pensamos “’nhanossassenhora, como é que eu vi isto? Tanto disparate!) mas a verdade é que enquanto a viam se divertiram. Foi o que se passou comigo, no cinema apreciei (bela palavra!) e não é o facto de o filme não sobreviver a uma análise mais rigorosa que me vai impedir de dizer que é, não mais que isto (atenção!), girito.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

The Last Station

The Last Station:



Toda a gente conhece Tolstoy, o autor dos clássicos Guerra e Paz e Anna Karenina, já para não falar de tantos outros contos e escritos menos conhecidos mas não de menos qualidade. Já menos gente conhecerá Tolstoy, o filósofo social cujas ideias de abolição da propriedade privada e resistência pacífica, já para não falar da abstinência sexual, inspiraram Gandhi.

Eu era uma dessas pessoas, só conhecia a mais famosa vertente da vida de Lyev Nikolayevich Tolstoy até ter visto o mais recente filme de Michael Hoffman, um realizador que já trabalhou com muitos actores de renome mas que não sai, perdoe-se a expressão, da cepa torta. The Last Station é o título desse filme e o seu objecto é o tolstoianismo, a tal corrente filosófica, mais do que a sua obra literária.

Antes de seguir com a SMR deixem-me fazer um aviso: as interpretações principais deste filme estão a um nível muito alto, Helen Mirren e Christopher Plummer foram nomeados para Óscares mas não ganharam e Paul Giamatti não foi mas devia ter sido. Os actores secundários também não estão mal, mas aquele trio realmente bate tudo.

Voltando ao que estava a dizer. O tolstoianismo é definido como sendo uma espécie de anarquismo cristão derivado das interpretações bíblicas feitas por Tolstoy que, sendo de origens nobiliárquicas, rejeitou a propriedade privada e ainda em vida viu o seu movimento crescer a ponto de ter assustado a Rússia czarista e mais tarde a Rússia soviética. Em consequência das suas ideias, Tolstoy preparava-se para abdicar dos direitos de autor das suas obras, tendo com isso criado conflitos com a sua mulher Sophia Tolstaya, também ela de boas famílias e que não acompanhava os ideais do marido.

Este aspecto é fulcral para o filme, na medida em que a tensão criada por esta divergência do casal é fulcral para o avanço do filme, tal como o foi para a fase final da vida do autor. Pelo que o filme dá a entender (e acredito que assim tenha sido na realidade, tantos são os dados históricos relativamente a Tolstoy) o próprio fundador do movimento considerava-se “menos tolstoista que os tolstoistas” pelo que Sophia e Chertkov (o mais acérrimo defensor do movimento) tentavam puxar o autor cada um para o seu lado, ele por achar que Tolstoy era um ícon cujas acções tinham significado a nível global, ela por achar que sem o principal income da família Tolstoy não poderia providenciar a ela e aos filhos um futuro apropriado.

No meio desta barafunda toda está Bulgakov, o personagem que seguimos mais proximamente, também ele tolstoiano (ou tolstoianista?), também admirador do escritor mas alguém que ao longo do filme (não sei como terá sido na realidade, já que este personagem parece ser mais ficcionalizado) vai tentando conciliar ambos os lados da barricada. E tem, claro, um caso amoroso com uma seguidora do movimento que é perfeitamente dispensável na história, mas pronto.

É ele que assiste mais de perto aos últimos tempos da vida de Tolstoy e são os seus diários (bem como fotos e vídeos (!) feitos por jornalistas para registar a vida do escritor) que permitiram que esta história fosse feita. Estes diários, em conjunto os dos restantes habitantes de Yasnaya Polyana (há até uma piada recorrente ao longo do filme sobre o quanto se escrevia naquela casa) serviram de base ao romance que este filme adapta.

The Last Station parece um filme de época, um dos géneros de filmes que mais abomino e razão pela qual o vi tão tarde, mas que isso não vos desmotive. Ao contrário do costume aqui não vão ver histórias de amores impossíveis, aprenderão sim um pouco mais sobre a vida de um dos maiores escritores de todos os tempos e, ao mesmo tempo, saem da sala com o prazer de ter visto trabalhos de interpretação bem acima da média. Só por isso já vale a pena.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

W.

W.:



Quem me lê desde o início deste blog (já lá vão dois anos!) e tem uma memória prodigiosa de certeza que se lembra de eu ter dito, em relação ao Michael Moore que gostava dos documentários do senhor, concordava com muita da sua ideologia mas que tinha pena que ele fosse tão pouco objectivo na forma como apresenta os factos e, sobretudo, como manipula as entrevistas.

O mesmo se passa, em menor escala, com o Oliver Stone neste filme. É de conhecimento geral que o realizador de Platoon, JFK ou South of the Border (um documentário que me recuso a ver, tal a minha discordância com o “tema”, falo de Hugo Chávez) é um esquerdista assumido e um crítico aceso do anterior Presidente dos EUA, George W. Bush. Também eu me considero de esquerda e também eu muitas vezes manifestei publicamente (entre o meu grupo de amigos, entenda-se) a minha insatisfação com um Presidente que não é meu mas afectou (e afecta) a forma como todos nós vivemos as nossas vidas. O problema aqui é que se tenta ridicularizar o homem e não tanto explorar a sua vida, pessoal e/ou política.

Alguns dirão (como se calhar eu diria se estivesse a ler e não a escrever) que é impossível não ridicularizar um anterior “homem mais poderoso do mundo” que dizia frases como “a maioria das nossas importações vêm do estrangeiro” e que acenou para cumprimentar o Stevie Wonder. É verdade que sim, ele presta-se a isso, mas um filme que se quer sério de um realizador com grande mérito deveria limitar o uso destes tais bushismos ou de momentos mais surreais da sua vida para a retratar.

É com isto que o filme se perde, porque caso contrário até poderia ser interessante. A história é apresentada em flashbacks e flashforwards entre a juventude do ex-Presidente (claro que tinha de ser um gajo das fraternidades!) e o seu papel na invasão do Iraque. Poderia, até, ser um interessante complemento ao Fair Game, sobre o qual escrevi há pouco tempo, por mostrar o outro lado do “campo de batalha” americano.

Seria interessante para mim, aprofundar sobretudo duas realidades, a primeira delas é uma frase dita pelo Bush pai (“Quem pensas que és? Um Kennedy?”), que me deixou a pensar sobre o peso que não deve ser ter uma família tão bem sucedida. No caso dos Kennedy isso aconteceu: uma irmã do JFK foi submetida a uma lobotomia em 1941 por ser considerada atrasada mental, mas actualmente muitos médicos consideram que estaria longe de o ser, tirando por comparação com os restantes membros de uma das famílias mais poderosas de sempre. O mesmo se passa com os Bush...não digo que George seja lobotomizado ou atrasado mental, mas não me parece irreal de todo que o grande sucesso político do pai e académico do irmão ajudassem a um sentimento de impotência do senhor W., contribuindo para o seu – também ele real – alcoolismo do passado.

O segundo aspecto que gostaria de saber mais tem a ver com a forma como, pelo menos no filme, Colin Powell se opôs à Invasão do Iraque. Não tinha, de todo, essa ideia (apesar de saber do seu apoio ao Obama) mas pelo que o filme retrata dá ideia que dentro daquele Situation Room só ele se opôs àquela decisão, sendo que – curiosamente- era ele “o” militar.

Não sei se foi realmente assim, mas numa coisa o filme é realista. Com o tempo a passar torna-se cada vez mais claro que quem mandava na cabeça do Bush júnior era o Dick Cheney. Ele pode não ter feito o discurso chave do filme (em que abertamente refere que os EUA vão para o Iraque por causa do petróleo e que “...there is no exit strategy! We stay!”), espero honestamente que não o tenha feito e muito menos no Situation Room, mas a cena em que entrega a Bush a documentação do Patriot Act é assustadoramente verosímil e demonstra quem era realmente o commander in chief.

E com estas coisas todas já me perdi um bocado na SMR propriamente dita por isso vou usar os meus super poderes de sumarização e dizer: o tema é interessante, as interpretações são OK (o Josh Brolin vai bem como W., as restantes parece-me que se esforçaram demasiado por ter actores parecidos com as pessoas reais e de menos em ter qualidade garantida) mas o tom é demasiado “revisteiro” para que se possa dizer que este é o biopic definitivo sobre um dos grandes responsáveis pelo estado actual do nosso mundo.

Este é o segundo filme do Oliver Stone que aqui analiso (este é anterior ao Wall Street 2: Money Never Sleeps) e nem um nem outro me deixaram muito satisfeito. A anterior filmografia dele ainda lhe dá algum crédito, mas parece-me que terá de se esforçar mais para voltar a ser a referência que já foi.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Celda 211:

Celda 211:


E aqui está ele, o último filme que vi em 2010 tornou-se na primeira SMR de 2011. Não consegui mesmo fazer a análise antes e por isso agora todo o vosso universo se vai desequilibrar e nada será como dantes. Ou então continua tudo na mesma.

Celda 211 foi o vencedor absoluto dos prémios Goya (vulgo Óscares espanhóis) em 2010, chegando mesmo a bater o El secreto de sus ojos, vencedor - esse sim - do Óscar de melhor filme estrangeiro no mesmo ano. Algum tempo depois da consagração o filme chegou a Portugal e depois de algum tempo em sala fui vê-lo. De notar, com agrado, que mesmo depois de tanto tempo de exibição a sala estava quase cheia.

Será que o filme merece assim tantos prémios? Não consigo comparar verdadeiramente já que não vi quase nenhum outro dos filmes nomeados, mas analisando o filme por si só posso dizer que ficou tudo bem entregue. A única crítica que poderia fazer relaciona-se com um prémio que não ganhou: Luis Zahera merecia sem sombra de dúvidas ganhar algum prémio pela sua interpretação de Releches.

A história do filme inicia-se de uma maneira bastante comum: Juan Oliver (Alberto Ammann) é um futuro guarda prisional que, ao visitar a cadeia onde vai trabalhar na véspera do seu primeiro dia, é apanhado no meio de um motim e tem de se safar como puder. O que é que ele faz? Aproveita que ainda ninguém o conhece e faz-se passar por preso...o Juan Oliver do exterior passa a ser Calzones no interior da prisão.

É Calzones que acompanhamos a maior parte do tempo. Vemos como a sua mentalidade muda quanto mais tempo lá passa. Desde o início alia-se com o líder do motim, Malamadre (Luis Tosar, a dar ideia que este é o papel da sua vida) numa lógica de “se não os podes vencer junta-te a eles”, mas com o tempo (e com o que se vai passando lá fora) o seu instinto de sobrevivência é sobreposto pela vingança.

Celda 211 é, como dá para ver, um filme em permanente tensão. Apesar da premissa “jovem em primeiro dia de trabalho” ser quase tão frequente como a do ”polícia que se vai reformar no dia seguinte” a verdade é que ficamos a sofrer com Juan (mesmo sem a história da namorada) por estar metido num verdadeiro inferno. As cenas de motim são fraquinhas (para se ver a falta de um orçamento hollywoodesco comparar com os motins do Natural Born Killers) mas tanto os avanços e recuos da negociação como a introdução de um elemento exclusivamente espanhol na equação mantêm os espectadores interessados no que virá a acontecer àquele grupo de reclusos.

Não é um final feliz, mas quem é que realmente acha que estas situações dão finais felizes? Nunca percebi quem faz reféns em bancos, etc., tal como não consigo perceber como é que matar guardas prisionais poderá melhorar a situação dos reclusos, mas fora isso Celda 211 é um filme interessante que posso recomendar e que fechou bem o ano cinemático mais prolífico da minha vida.