domingo, 13 de março de 2011

Buried

Buried:



Qual será a pior forma de morrer? Uns dizem que queimado, outros que afogado, outros ainda dirão que será num acidente de avião. Já Ryan Reynolds (actor que normalmente detesto mas que aqui faz um grande papel com, literalmente, muito pouco espaço para evoluir) dirá, de certeza, que a pior forma de morrer é enterrado dentro de um caixão. Isto porque em Buried, o filme mais claustrofóbico que provavelmente já vi, é isso mesmo que lhe acontece.

Lembram-se daquela cena na segunda parte do Kill Bill em que a Noiva é enterrada viva e à custa de uma técnica ninja consegue libertar-se? Pois é, aqui a coisa é mais realista e por muito que Paul esmurre e pontapeie a madeira daquela que é a sua prisão o caixão não cede e o rapaz vai ter de se safar por outras formas. Disse outras formas mas deveria ter utilizado o singular, por acaso..a única salvação para Paul chama-se BlackBerry, o telemóvel que os seus raptores lhe deixaram.

Sim, porque Paul está naquela situação não por azar ou porque foi uma vítima falhada de tapocrifação (aposto que não conheciam esta palavra, mas significa "ser executado por enterro prematuro"). Paul é um civil americano que estava no sítio errado à hora errada, mais propriamente no Iraque, e logo no início do filme ficamos a saber que vai ficar lá enquanto não arranjar forma de pagar um dinheirão aqueles que o enterraram.

A partir do momento em que sabemos isso iniciam-se duas corridas contra o relógio, uma relativa ao oxigénio que falta no caixão e outra relativa à bateria restante no telemóvel.

A todos nós já nos aconteceu que logo naquele momento em que precisavamos MESMO de fazer uma chamada é que a bateria vai ao ar. Agora imaginem o que é isso acontecer-vos quando essa bateria é a vossa única ligação ao mundo exterior e a vossa única esperança de salvação. Ou imaginem o desespero que não deve ser ligarem para o 112 (ou 911, no caso) e não acreditarem numa história que por muito rocambolesca que pareça, é verdadeira. Paul só tem mesmo aquela hipótese, não consegue sair dali, não consegue ver ninguém nem ninguém o verá a ele (Ryan Reynolds é o único actor no filme, dos restantes personagens só se ouve a voz) e - se não conseguir pedir ajuda, e essa ajuda chegar a tempo, vai mesmo ficar ali, enterrado mas agora já morto.

Pegando nesta premissa e nunca saindo de dentro do caixão, o realizador (Rodrigo Cortés) consegue provocar em nós os níveis de desespero que passam pela mente de Paul, tornando Buried um dos melhores thrillers que vi nos últimos anos e, a par do Black Swan, o melhor filme que vi até agora em 2011.




P.S.: Para aqueles que estão a pensar: "Que estupidez, onde é que o gajo tinha rede debaixo de terra!!" fica a informação, também cedo no filme somos informados que Paul está enterrado a cerca de 90cm de profundidade, por isso até parece verosímil que ainda se consigam fazer umas quantas chamadas.

Sideways

Sideways:



Numa análise rápida depois de vermos este este filme, distante já de 2004, ficamos a pensar em qual terá sido a razão pela qual lhe deram este título. Muito pouco depois percebemos que por "sideways" não se quer necessariamente dizer que os seus personagens estão a andar de lado ou algo que se pareça...o sideways deste filme tem a ver, parece-me, com os desvios que todos fazemos àquilo que se consideraria o certo, o que deve ser feito.

A história base do filme acompanha de perto Miles e Jack (Paul Giamatti e Thomas Haden Church, respectivamente) numa viagem que ambos fazem pela California acima. A razão da viagem? Jack vai casar-se e Miles, seu amigo e enólogo amador, decide levá-lo a passear pelo Wine Country. Durante a viagem os dois amigos apercebem-se que não existe uma discordância entre ambos quanto ao que dela deve resultar: se para um descanso, para outro aventura.

E é aqui que começam os tais desvios..Como é que nos devemos comportar quando estamos prestes a casar-nos? Como aproveitar uma viagem como estas? Devemos lutar por um último momento de loucura? Devemos contemplar o que aí vem, aproveitando a viagem e a companhia que temos, ou pura e simplesmente apanhar tudo o que vem à rede? Não querendo avançar muitos pormenores, digo-vos apenas que me identifico muito mais com a perspectiva de Miles, sendo - no entanto - muito mais atraente, claro.

Sideways é um filme especialmente adulto numa indústria que se está a tornar especialmente infantil. Aqui os personagens são solitários, vêm as suas ilusões de grandeza e sucesso profissional irem pelo cano abaixo e não é o facto do Paul Giamatti fazer um papel que poderia ser bem entregue ao Woody Allen ou o facto de esperar nunca me tornar no que qualquer um deles é que me vai impedir de o recomendar àqueles que queiram ver um filme interessante e uma comédia mais profunda do que o que costuma vir de Hollywood.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Somewhere

Somewhere:



O pessoal português que seja da minha idade e veja a primeira cena de Somewhere, o último filme da Sofia Copolla vai lembrar-se do famoso anúncio ao Renault Clio em que se via um carro a passar e o som “Get’upaaaaaaaaaa” e vai necessariamente ter de se rir. Essa cena é o prelúdio para um filme que seria bom não fosse um problema de que vou falar daqui a pouco. Antes, o resumo que fica bem em qualquer crítica.

Somewhere segue a história de Johnny Marco, actor de Hollywood com imensas semelhanças com o Vincent Chase, do Entourage. Vive uma vida superficial em que o luxo é muito (e traduz-se em hotéis de luxo, um Ferrari 360 Modena e duas strippers gémeas) mas com pouca ligação afectiva ao que quer que seja: no terço inicial do filme Johnny anda solitário entre a gente, como diria o Camões, mas não está propriamente apaixonado. O Johnny que nos aparece nessa altura está nada mais nada menos que aborrecido.

Só que, claro, a vida dele vai ter de mudar. Depois de uma noite bem passada com uma amiga do sexo feminino Johnny acorda com alguém a assinar-lhe o gesso que tem no braço direito. Não é a sua amiga do sexo feminino, essa já saiu há muito (mais um reflexo da vida superficial que ambos levam?) mas sim Cleo, a sua filha de 11 anos, acabadinha de despachar pela mãe que – ficamos a pensar – terá alguns problemas a resolver.

De início a relação entre pai e filha é distante (ela mesmo lhe diz, a dada altura, que ele sempre foi um pai ausente) mas com o passar dos dias a intimidade entre os dois cresce e através dela Johnny acorda do marasmo e decide fazer algo da sua vida, transformar-se numa pessoa ...algo que até à altura achava não ser.

Stephen Dorff é o actor que competentemente faz de Johnny mas é a excelente interpretação de Elle Fanning que nos mostra que a Sofia Copolla tem um talento especial para transformar jovens actrizes em jovens estrelas (Kirsten Dunst em The Virgin Suicides! Scarlett Johansson em Lost in Translation!) e sem dúvida que a relação que se estabeleceu entre ambos os protagonistas é o principal segredo para um filme que se fosse visto e analisado independentemente de tudo o que está para trás seria bastante bom.

O PROBLEMA É QUE

Somewhere é tão mas tão parecido com o Lost in Translation que caso não fossem ambos da mesma realizadora a coisa poderia dar algum dinheiro a umas quantas equipas de advogados.

Não é só o ambos serem maioritariamente passados em hotéis, ambos terem personagens sem saber o que fazer até que alguém lhes troca as voltas ou ambos terem cenas em que se goza com programas de televisão estrangeiros. Tudo isto é quase de certeza, e como já referiu o Roger Ebert, fruto das experiências de Sofia quando era mais nova (não se esqueçam que é filha do Francis Ford Coppola e costumava seguir o pai pelo mundo fora) e tudo isto seria relativamente secundário não fosse o facto de – tirando o epílogo um pouco mais longo – todas as cenas de Somewhere me fazerem lembrar uma cena correspondente em Lost in Translation.

É pouco original e sobretudo distrai-nos demasiado num filme que fora deste contexto, repito, é bom.

Finalmente, àqueles que ainda não viram nenhum destes filmes só vos posso dar um conselho: vejam este antes do outro...são ambos bons mas, como diz outro anúncio, o original é sempre o melhor.

segunda-feira, 7 de março de 2011

127 Hours

127 Hours:



Os limites da capacidade humana são algo que nunca deixa de me surpreender. Todos nós já passámos por situações em que de inicio dizemos “Nem pensar nisso, não consigo, nem vale a pena!” mas que no final de contas, quando temos de enfrentar as dificuldades, conseguimos superar-nos a nós próprios e o que parecia impossível afinal de contas nem foi assim tão difícil. “A man’s gotta do what a man’s gotta do”, certo?

Pois na vida de Aron Ralston, “explorador” americano em cuja vida este filme se baseia, o que o homem teve de fazer é um bocadinho mais extremo do que o que a maioria dos homens tem de fazer.

Não vale a pena fazer esta SMR sem falar do momento chave deste filme, quase todos saberão o que se passou e o que se vê durante o filme: num belo fim de semana de 2003 Aron (aqui representado pelo James Franco que mereceu uma nomeação para os Óscares, e não pelo James Franco que os apresentou) decidiu ir passear sozinho para o Blue John Canyon, no Canyonlands National Park, Utah. Por lá andou, por lá encontrou umas moçoilas (tem sempre de haver moçoilas, não tem?) e pouco depois de se separarem dá por si a descer uma fenda no canyon e, ao tentar apoiar-se numa rocha, esta rola e basicamente esmaga o seu braço direito, impossibilitando-o de se libertar.

Gritar não adianta de nada, aquelas paisagens são mais inóspitas que sei lá o quê. Esperar por ajuda também não vale a pena porque o menino Aron (esperto!) não avisou ninguém sobre para onde ia. As opções de Aron limitavam-se a duas: ou fazia com que a pedra se mexesse ou libertava-se de outra forma. Como a pedra tinha mais de 350kg, Aron teve de fazer pela vida e libertar-se da única maneira possível...amputar o seu próprio braço com uma faca multi-usos manhosa que tinha consigo.

Muito se tem falado da cena da amputação, e verdade seja dita que se não fosse por isso provavelmente a história nunca teria tido a dimensão que teve, mas na minha opinião esse é o elemento menor do filme. É verdade que é violento (bastante menos do que o marketing quer passar cá para fora, com notícias de desmaios e vómitos) mas parece-me bem menos violento que a evolução psicológica do personagem, e naturalmente da pessoa real – que já disse em entrevistas que quase tudo no filme é “o mais próximo possível a fazer-se um documentário sobre a história”.

Não é de ânimo leve que uma pessoa amputa o seu próprio braço, tal como não foi de ânimo leve que os jovens argentinos perdidos nos Andes comeram a carne dos seus colegas mortos (se não sabem do que estou a falar vejam o Alive - Estamos vivos, um excelente filme e que em muitos aspectos é semelhante a este). Quando se apercebe da sua situação Aron nem grita, nem chora nem nada...pelo que nos é dado a conhecer no filme trata-se de um rapaz altamente prático e que ao contrário de mim – que provavelmente entraria em choque menos de 1,27s depois daquela queda – começa desde logo a trabalhar para a sua libertação, tentando lascar o pedregulho que o aprisiona. Desde esse momento inicial em que há uma esperança diria que irrealista até ao momento em que Aron se apercebe que não há outra saída, ou o braço ou ele por inteiro, vamos acompanhando as suas mudanças de humor, as suas alucinações e o seu crescente desespero.

Dizer-vos que no final ele se liberta não é um spoiler, já que se lá tivesse ficado provavelmente ainda hoje ninguém sabia o que lhe tinha acontecido. O que este filme nos mostra é que é o processo que importa, muito mais do que o resultado.

O que achei do filme propriamente dito? Bem, posso dizer-vos que a cena final me tocou bastante (os Sigur Rós também ajudam) mas que tudo o resto poderia estar melhor. Muitos outros críticos dizem que o filme nunca deveria sair da fenda em que Aron está metido mas eu discordo, acho importante que o vejamos fora dali para que melhor se perceba aquilo porque ele está a passar. Para mim o problema é mesmo o excesso de montagens e cultura pop que o Danny Boyle tenta adicionar ao filme. Se ficava bem no Slumdog Millionaire aqui já é uma distracção demasiado grande num filme que teria necessariamente de ser intimista, quanto mais não fosse pela claustrofobia do lugar.