domingo, 18 de março de 2012

Año Bisiesto

Año Bisiesto:


Para entenderem o espírito de Año Bisiesto, filme mexicano que em 2010 ganhou o prémio Caméra d'Or em Cannes o ideal é que oiçam a única música que contém. Chama-se Flores para Ti, surge apenas nos créditos finais mas diz-nos insistentemente que "lamento, desilusión y dolor son también compañeros del amor". Fica a ideia de que essa triste lenga-lenga esteve na cabeça da sua protagonista durante o mês de Fevereiro do ano bisexto em que a história tem lugar.

Laura é uma mulher solitária, perturbada e com alguns comportamentos que mais depressa caberiam numa descrição masculina: alimenta-se à base de sopas aquecidas no micro-ondas, masturba-se doentiamente e (quase) todas as noites traz alguém novo para casa, com quem tem relações sexuais sem sequer conhecer o seu nome. Toda essa rotina altera-se quando conhece Arturo, um homem que a usa para pôr em prática as suas fantasias sado-masoquistas.

A relação entre os dois rapidamente se torna doentia. Laura não apresenta objecções às investidas de Arturo mas não aparenta gostar do que se passa...apenas aceita aquela relação por ser o mais próximo que tem do amor. Laura mente-lhe, como mente a todos os outros com quem se relaciona, fazendo passar a ideia que tem uma vida bem mais interessante e preenchida do que na realidade tem. Na verdade Arturo não o imagina, mas acaba por ser o melhor que aconteceu a Laura.

Quando o final desse Fevereiro se aproxima o calendário em que diariamente Laura marca o passar dos dias vai ficando mais cheio, cada vez mais perto do dia 29. Nesse mais raro dos dias morreu o pai de Laura e, com o aproximar-se do quarto aniversário, Laura deseja juntar-se-lhe. Quer morrer e vê em Arturo e nas suas aventuras a forma perfeita de o fazer.

Como dá para ver pelo que escrevi acima, Año Bisiesto está longe de ser um filme fácil de se ver. Lamento, desilusão e dor são partes integrais desta história, às quais se junta um trabalho de câmara ultra-minimalista e um ritmo avassaladoramente lento. Seca, portanto, pensariam vocês, mas por acaso não. Não considero que esteja ao mesmo nível de Hunger ou de Me You and Everyone We Know (outros dois filmes que venceram este importante prémio para melhor longa metragem) mas, sobretudo pela grande contenção na realização e pelo trabalho da actriz principal (Monica del Carmen, que se expõe física e psicologicamente ao longo da história), Año Bisiesto é um filme muito relevante sobre o desespero a que a solidão das grandes cidades nos pode levar.

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