Parece que é impossível uma crítica a este filme não falar do Jacques Tati, por isso vou já tratar dessa parte para depois seguir em frente: tenho uma relação estranha com o Tati, só vi dois filmes dele e se um deles considero uma das comédias que mais me divertiu (Mon Oncle, que chega a aparecer neste filme!) o outro tenho em DVD por me ter sido recomendado vivamente, já tentei ver umas 5 vezes e em todas elas acabei por adormecer, por o achar tão aborrecido. É o Playtime, tido por muitos como a obra-prima do senhor, mas que para mim tem sido impossível de ver.
Fala-se do Tati em relação a este filme porque foi ele que escreveu o guião e era para o protagonizar. Entretanto morreu (já em 1982) e só agora é que a história do mágico Tatischeff e da sua amiga/filha adoptiva Alice foi levada ao grande ecrã.
Raros são os filmes, tirando um sub-género de terror, em que o personagem antagónico é uma criança mas neste filme a tal Alice conseguiu enervar-me. Percebo que a ideia fosse precisamente a contrária: não é difícil perceber que o filme tenta mostrar a afeição que Tatischeff nutre por Alice, mas não conseguia deixar de pensar no quanto as “exigências” dela contribuiram para a ruina dele. Ela não é má, é apenas criança, mas mesmo assim não sei...ou foi ela que me irritou ou a incapacidade dele lhe dizer não.
Ora, se não se gosta de um personagem que é suposto gostar-se para que o filme cumpra o seu intento a coisa fica difícil. Isto, sem dúvida, limitou a minha apreciação do filme, já que interpretei a história de uma maneira completamente diferente. Tive portanto de aproveitar para apreciar outros aspectos do filme.
O primeiro deles é a excelente colecção de personagens secundários. Num filme em que muito do tempo é passado em salas de espectáculo decadentes é fácil encontrar uma boa dose de acrobatas espanhóis, dançarinas de can-can, palhaços suicidas e ventríloquos deprimidos. Todos eles surgem neste filme e todos eles são a meu ver mais interessantes que Tatischeff e Alice. Mas, para além deles, existe ainda uma outra coisa que faz com que este filme valha a pena.
Falo, claro, da fantástica animação de Sylvain Chomet (o mesmo que já tinha feito o Les Triplettes de Belleville). Grande parte do filme é feito com animação tradicional, apenas com algumas cenas em que algum digital é usado mas em que não se impõe, e a qualidade é permanente. Todas as cenas têm um pormenor tal e ao mesmo tempo uma subtileza tão grande que imagino ser interessante ver o filme em DVD para se poder parar de tempos a tempos e apreciar a paisagem. Só por isso e pelo som, essencial num filme quase sem diálogos, vale a pena.
Pelo que pude perceber, esta história foi escrita por Tati como uma tentativa de aproximação a (uma das) suas filhas...Tatischeff era o seu apelido real e Alice seria, não sendo, a filha. Como disse há uns parágrafos acima, para mim esse aspecto falhou, pelo que mais do que qualquer outra coisa vejo L’Illusioniste como uma declaração de amor a Edimburgo e a um tipo de entretenimento que já não existe, ao mesmo tempo que é uma prova da vitalidade da animação tradicional.
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