terça-feira, 26 de outubro de 2010

Wall Street 2: Money Never Sleeps



Que o dinheiro nunca dorme já nós sabíamos, agora que o realizador de um filme adormece enquanto o realiza isso sim seria novidade. Pois foi com essa impressão com que fiquei em dois momentos do filme: as "sessões de formação" sobre o funcionamento da Bolsa e aquele grande disparate que é a cena final.

Mas já lá vamos, que o filme também tem coisas boas. É, aliás, merecedor de uma nota final positiva mas não se safaria de ir à oral.

A razão que levou Oliver Stone a realizar uma sequela ao seu Wall Street, de 1987, mesmo depois de ter dito que nunca realizaria sequelas faz algum sentido: a actual situação económica pede mesmo para que se continue a explorar o funcionamento do sistema financeiro mundial. Pegando nisso, Oliver Stone e a sua equipa de guionistas (que teve bastante rotatividade, ao que sei, o que poderia explicar aqueles tiros no pé a que já me referi) fizeram Gordon Gekko, o famoso protagonista do primeiro filme, sair da cadeia e cair de "pára-quedas" num mundo que avançou a um ritmo avassalador.

Gordon Gekko (Michael Douglas, que é sem dúvida um dos dois pontos fortes do filme mas que apesar de tudo não está à altura da prestação de 1987) pode ter estado na cadeia enquanto as novas regras especulativas foram definidas mas não perdeu o jeito para aquilo e é assim que, abandonado pelos seus pares mas admirado por muitos, resolve aproximar-se de Jacob (Shia LaBeouf, que já parece um adulto) e, aproveitando-se da admiração que este lhe nutre, voltar a encher-se de dinheiro.

Se a história fosse esta a coisa até tinha potencial, era aqui que o desenvolvimento da história devia ter acabado mas não, não se fica por aqui. Acontece que Jacob é não só um personagem muito mal definido (um corretor da bolsa com muito boas intenções?) mas, sobretudo, é namorado da filha de Gekko...uma Carey Mulligan que não me consegue agradar minimamente e que, adivinhe-se, não fala com o pai pela desgraça que este causou.

A partir daqui é tudo downhill, como se costuma dizer. Não faz sentido nenhum dar tanta atenção às crises de um casal num filme que tem como grande foco de atracção o mundo financeiro. E aquele final, minha nossa, aquele final é tão mau que até ao longe se consegue topar o que é que a produtora disse ao realizador: "Pois é, meu amigo, isto é tudo muito bonito mas agora queremos abracinhos!". E assim se fez...um filme que poderia ser o An Inconvenient Truth da alta finança acaba, nos minutos finais, por se transformar num qualquer filme romântico da Sandra Bullock. Não vos vou dizer o que é que se passa para não estragar o filme a quem o quer ver, mas digo-vos que ainda não conheci ninguém que já o tenha visto e tenha gostado do fim.

Falei aí do An Inconvenient Truth de propósito, já que este filme consegue - no meio dos dramas familiares de Jacob e a menina Gekko - espetar-nos com uma data de informações sobre como funciona a Bolsa e como se produziu esta crise financeira. Seria à partida uma boa ideia já que, presumo eu, a maioria das pessoas que vão ver o filme não serão génios do mercado de capitais e, tal como eu, não perceberiam metade dos diálogos se não fossem explicados.

O que acontece, porém, é que ficamos então com três filmes: a sequela do Wall Street original (a parte mais forte do filme, e que faz com que apesar de tudo a minha apreciação seja positiva), o drama familiar que não veria nem que passasse ao Domingo à tarde na TVI, e o documentário sobre o funcionamento da Bolsa que seria muito mais bem vindo se tivesse passado, por exemplo, como uma curta metragem antes do filme.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Doc Lisboa dia 7: nadinha de nada

Hoje tinha planeado ir ver o Skinhead Attitude. Fui hoje à hora do almoço comprar os bilhetes e informaram-me que já estava esgotado.
Como já não vou a mais nenhum filme do Doc este ano aproveito para me despedir (do festival, não das SMR) e sugerir a alguém que tenha visto o filme para me mandar a sua crítica, para eu a publicar aqui.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Doc Lisboa dia 5: Crossing the Bridge: The Sound of Istambul

Crossing the Bridge: The Sound of Istambul:


Há muito que não passava tanto tempo de olhos fechados durante uma sessão de cinema!

Não tenho por hábito dormir em salas de cinema. Por muito cansado que esteja consigo (quase) sempre manter-me de olhos abertos e ver o filme com atenção, sendo a única excepção que me recordo o Topsy Turvy, e mesmo esse só adormeci em condições muito especiais.

Em Crossing the Bridge, um filme de Fatih Akim realizado antes do aqui analisado Soul Kitchen mas só agora exibido (pelo menos perante os meus olhos) também não adormecei. Apanhei-vos não foi, marotos? Passei muito tempo de olhos fechados porque num filme em que a música assume todo o protagonismo valeu a pena apreciar assim mesmo o som que vem do magnífico sistema de som do São Jorge.

Já tinha dito na SMR ao Soul Kitchen que a banda sonora era de primeira qualidade e aqui pude confirmar que o realizador tem muito bom gosto musical. Neste filme resolveu explorar as várias cenas musicais de Istambul, capital do seu país de origem, desde a música tradicional ao hip-hop, e o resultado final é - a nível sonoro - muito bom.

Ao longo da hora e meia do filme é Alexander Hacke (baixista dos Einstürstende Neubaten) que nos guia pelas ruas de Istambul para nos apresentar algumas das suas descobertas musicais. É curioso que apesar do título e do foco geográfico do filme a cidade em si não tem muito protagonismo, sendo pouco explorada enquanto espaço urbano mas apenas como ponto de encontro de culturas musicais diversas.

É por isso que não somos apresentados a monumentos como a Hagia Sophia ou ruas como a Ataturk Boulevard e quando os vemos é mais por recurso a imagens de arquivo que propriamente com filmagens feitas pelo realizador. O (excelente) trabalho de Fatih Akim neste filme é sobretudo o de fazer uma excelente edição de imagem e som, em que a música, as entrevistas e as opiniões do narrador se fundem de uma forma tão boa que não queremos deixar de conhecer mais aprofundadamente aquela música. O único problema é, a meu ver, o ter optado pela música mais calma para o final do filme...em termos de energia do público a coisa provavelmente funcionaria melhor ao contrário.

Se são apaixonados por Istambul e não se interessam muito por música não vale a pena. Se são como eu (e muitos de vocês são, que eu bem sei) e têm na música uma outra grande paixão toca a ver este filme e a descobrir (consoante o gosto) os Baba Zula, os Duman, os Replikas, o Ceza ou Orhan Gencebay (vale a pena carregar no link nem que seja só para ver O bigode). Eu gostei de os descobrir e posso confirmar que já estou a fazer as minhas próprias explorações.


O filme passa de novo dia 23 às 23h.


P.S.: Um pormenor que quase ninguém reparou, aposto, é que foi o Andrew Bird a fazer a edição de filme. Não é o Andrew Bird que muitos de vocês podem conhecer do meio musical, mas isso não interessa nada!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Doc Lisboa dia 4: Claude Lévi-Strauss: Return to the Amazon

Claude Lévi-Strauss: Return to the Amazon:



Já conhecia o nome de Claude Lévi-Strauss há uns tempos. Não me lembro em que contexto ouvi falar dele mas devo confessar que quando vi o nome no programa no Doc não o associei a nada, tanto que nem estava nos meus planos ir ver este filme. (Ia ver o Hitler's Hit Parade, que estava esgotado hoje...deviam ter posto este filme numa sala maior, senhores organizadores)

Foi, portanto, por acaso que dei hoje por mim no cinema Londres a ver aquele que muito provavelmente será o meu filme preferido desta edição do festival. A descrição não o deixaria antever, as minhas expectativas não o previam mas aconteceu.

Ainda mais que na ficção, a principal razão pela qual adoro documentários é o poder testemunhar histórias que não a minha, ver realidades que não conheço e viver vidas que não vivi e neste filme tive a sorte de ser apresentado à realidade do povo Nambikwara, estabelecido algures na floresta amazónica e estudado pela primeira vez em 1939 pelo senhor que ainda hoje é considerado o pai da antropologia.

Os Nambikwara são um povo indígena que teve o azar (ou a sorte, para quem pense ao contrário de mim) de ver o seu território cruzado pela linha telegráfica logo em inícios do século XX. Claro que isso facilitou o seu encontro com o "homem branco" e a consequente miscigenação cultural (sim, usei a palavra miscigenação). Felizmente ao longo do filme vemos imagens fotográficas e até alguns vídeos filmados por Lévy-Strauss intercaladas com imagens actuais dos restantes Nambikwara e conseguimos aperceber-nos que algumas tradições ainda se mantêm.

Enquanto que noutras ocasiões aproveitaria para falar agora dessas tradições, aqui não o vou fazer - é realmente complicado aprofundar muito as minhas ideias sobre tradições que desconheço e que apenas vi neste filme - mas não quero deixar de referir que fiquei contente por ver que mesmo após anos de "colonização" destes povos indígenas as tradições ainda se mantêm, contra todas aquelas coisas que nós vemos como básicas mas que para gente de outros povos não o é.

Esperemos é que, com a crescente exploração da floresta amazónica para fins económicos, estes povos consigam mais uma vez sobreviver. Honestamente parece-me mais difícil, porque agora o inimigo é maior e mais destrutivo, mas espero estar enganado e daqui a uns anos poder ver uma espécie de sequela deste filme, em que nos mostrem as crianças que vi hoje a viver como adultos da sua cultura.




P.S.: Não, não me esqueci de fazer SMR ao filme de ontem, não vi foi filme nenhum. Fica aliás o aviso que não haverá posts todos os dias do Doc. É verem quando haverá