Melancholia:
Cá estou eu de novo, amiguinhos, e trago-vos mais uma provável estreia a nível de críticas em português.
Falo de Melancholia, o último filme do Lars von Trier, aquele que ele apresentou em Cannes este ano e depois deu origem à famosa conferência de imprensa. Não, não o saquei; a vantagem de estar de férias é ir a outros países onde posso ver ante-estreias de filmes que por cá devem chegar mais para o fim do ano. E sim, é muito bom; arrisco-me a dizer que a seguir ao Dogville é o meu favorito dele...e notem os que não me conhecem assim tão bem que o Dogville é um dos meus dois filmes favoritos de sempre.
Nos últimos filmes o Lars von Trier tem seguido um esquema semelhante: uma mulher, um tema. Às duplas Bjork/Justiça, Nicole Kidman/Vingança, Bryce Dallas Howard/Liberdade, Charlotte Gainsbourg/Perda podemos agora juntar a Kirsten Dunst/Perda da Inocência. E perda da inocência porquê? Porque neste filme, como na vida, é essa a razão da melancolia: só quem é inocente e desconhecedor da realidade das coisas pode ser feliz, livre desse sentimento que o dicionário define como tristeza profunda e duradoura.
Nos primeiros momentos do filme Justine é uma mulher aparentemente feliz. É o dia do seu casamento e as coisas parecem correr bem com o noivo até ao momento em que a sua mãe - recentemente divorciada - faz um brinde devastador e que leva à tal perda de inocência...depois daquelas palavras Justine não pode voltar à ingenuidade do desconhecimento e por isso perde-se. Uma horinha mais à frente no filme (não sei quanto tempo depois no seu espaço temporal) e vemo-la de volta ao castelo onde festejou o casamento, ainda profundamente deprimida mas ali chamada pela sua irmã Claire (Charlotte Gainsbourg), que por lá vive com o seu marido John (Kiefer Sunderland, num papel fora daquilo a que nos habituou). A razão da chamada é Melancholia.
Este/Esta Melancholia não é um estado de espírito, por muito que sejam homónimos no inglês. Trata-se de um planeta (fictício, leitores mais distraídos) que por força do destino e das trajectórias espaciais passará perto da Terra dias depois do regresso de Justine àquele local. Consoante sigamos a opinião de John ou de Claire trata-se de um momento único de beleza astronómica ou o fim do mundo. A aproximação de Melancholia vai ser, acima de tudo, um catalisador para o desaparecer da tristeza que afecta Justine, ela que por causa daquele evento vai melhorar, numa metáfora e uma lição tão triste como importante mas que não vou revelar aqui.
Infelizmente a tal conferência de imprensa de Cannes fez com que as atenções se debruçassem na polémica e não no filme, o que é uma grande pena. O trabalho de realização é impecável, mantendo algumas escolhas estilísticas de Antichrist (sobretudo no prólogo), as imagens astronómicas impressionantes (será que é moda este ano?), a banda sonora perfeita para o ambiente que se quer criar (oiçam um exemplo no trailer) e o trabalho dos actores de grande qualidade.
Minto, o trabalho da Charlotte Gainsbourg e do Kiefer Sunderland (bem como dos restantes secundários) é de grande qualidade, o da Kirsten Dunst é pura e simplesmente melhor interpretação feminina deste ano (pelo menos até agora)...não tivesse havido a polémica que houve e era certinho que pelo menos conseguiria nomeações para os principais prémios. Assim não sei, o que sei é que se gostam de filmes de autor, profundos sem ser aborrecidamente intelectuais têm de ir ver este filme, que ao que sei estreia em Portugal a 1 de Dezembro. Usando uma expressão que já aqui usei algumas vezes, Melancholia é um exemplo de como o cinema deveria ser sempre.
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