sexta-feira, 29 de julho de 2011

José e Pilar



José Saramago, o famoso escritor português, não escrevia histórias de amor. José Saramago, o homem, teve a partir dos 63 anos uma grande história de amor, e este filme mostra o seu epílogo.

O grande amor de José Saramago é Pilar del Río, jornalista espanhola que muitos criticam por ter "roubado" o nosso escritor para Lanzarote mas que, segundo o autor, o fez rejuvenescer. Diz Saramago a Pilar, no início do filme, que se tivesse morrido antes de a ter conhecido, aos 63 anos, morreria mais velho do que será quando chegar a sua hora. Melhor que uma frase-feita tirada de um cartão, não?

Pilar del Rio é mais do que a mulher de Saramago, é a sua melhor amiga, a sua secretária, sua tradutora e presidenta da sua fundação. São, aliás, essas funções que a vemos assumir primordialmente durante o filme, mas o amor está lá sempre, em pequenos gestos como aquele em que vemos um Saramago já idoso, meio perdido, à procura da mão de Pilar enquanto uma multidão anónima lhe canta os parabéns. Pilar é, também, a luz no meio daquela multidão.

Sabem quando alguns filmes usam um artifício em que tudo aparece em fast forward excepto o que se quer destacar, que permanece imóvel ou move-se com muito mais elegância? Foi essa imagem que mais me surgiu mentalmente neste filme de Miguel Gonçalves Mendes, mesmo que não tenha surgido uma única vez no ecrã. Ao longo das mais de duas horas do documentário acompanhamos Saramago no rebuliço que era a sua vida antes de adoecer seriamente, em 2008. Vemo-lo em Espanha, Brasil, Portugal, Estados Unidos, com pessoas como Gabriel García Márquez, Gael García Bernal ou Tarja Halonen, Presidenta da Finlândia. A vida de Saramago era como a sua escrita, imparável.

Segundo me parece, Saramago usava os seus livros para explorar pormenores extraordinários (ainda que fictícios) de histórias ditas normais, este filme - por ter tido a ousadia de se focar no que à partida poderia ser menos relevante - faz o mesmo, pega num dos escritores mais famosos do seu tempo e quase não fala da sua obra, falando antes da sua vida. José e Pilar não trata de Saramago o escritor, trata dos últimos dias de José, um homem apaixonado por uma mulher apaixonada por si. E por assim ser é um grande filme.

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