Aqui há uns tempos vi e analisei um filme norueguês que partilhava a actriz principal com este filme, dinamarquês, que chega até nós já com o Óscar de melhor filme estrangeiro no currículo.
Esse filme chama-se De Usynlige e lida com as consequências de um erro cometido no passado. Este filme, Hævnen, partilha por isso algo mais que a actriz Trine Dyrholm, partilham também a sua temática. A grande diferença entre estes dois filmes é a perspectiva temporal: enquanto que a Noruega nos trouxe os dramas de um jovem que já fez a asneira, a Dinamarca mostra-nos a escalada da violência que leva à tal asneira e, só mais mitigadamente, as suas consequências.
Hævnen mostra-nos a violência em dois contextos diversos: inicia-se matreiramente num campo de refugiados, onde Anton (Mikael Persbrant) trabalha, algures em África, mas rapidamente se muda para a Dinamarca, onde o seu filho faz amizade com Christian (William Jøhnk Nielsen), um jovem bem mais problemático do que parece e o verdadeiro personagem principal desta história.
A violência em África tenta ser chocante mas em abono da verdade não é assim tanto, tão conhecidas que são as histórias reais iguais ou piores que todos os dias acontecem em lugares como aquele. Mais chocante é a reacção de Anton (ou a falta dela) a essa violência, que indirectamente nos faz a todos pensar "isto vai correr mal" quando, mais tarde, essa reacção (ou falta dela) tem consequências no Norte da Europa.
Isto porque Christian tem andado a desencaminhar Elias (Markus Rygaard), o filho do nosso médico sem fronteiras.
Com uma atitude nietzschiana, Christian proclama odiar "todos os que desistem"; para ele a melhor resposta não é dar a outra face mas antes espetar um selo na face do outro e se no contexto escolar a coisa dá asneira, fora dele - quando se tenta vingar de uma injustiça cometida contra o pai do seu amigo - a asneira terá consequências bem mais graves.
Elias não tem a mesma atitude desafiadora do seu amigo Christian (o nome será uma coincidência?)...é muito mais medroso/racional e se calhar é por isso que que se torna a maior vítima de toda esta história: é ele a vítima de bullying antes da chegada de Christian à sua escola e é ele a maior vítima da sua má, se bem que não mal intencionada, influência a partir do momento em que travam amizade.
Christian não deixa de ser, porém, uma outra vítima: vítima das circunstâncias que trouxeram drama à sua vida e da incapacidade que o seu pai (um típico homem de negócios ausente) tem em o educar emocionalmente.
O título português deste filme é "Num mundo melhor" e nesse mundo melhor vai ser a amizade com Elias que acabará por salvar Christian e será Christian a reestruturar o mundo de Elias. Resta no entanto saber se num mundo melhor existirá lugar à verdadeira redenção.
Hævnen é um filme passado, em grande parte, no mundo das crianças, mas os seus problemas são de adultos. O filme em si também é muito adulto, contido e de grande qualidade. Só o posso, por isso, recomendar.
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